EDITORIAL O ESTADÃO
Os obstáculos são políticos, muito mais que financeiros. Um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, impediu o governo de adiar o aumento salarial do funcionalismo. A reoneração da folha de pagamento das empresas, com restabelecimento das contribuições previdenciárias normais, ficou emperrada no Congresso. O cancelamento de gastos deve compensar os dois empecilhos e evitar o rompimento do teto de gastos.
Mas outras incertezas permanecem e tornam justificável o contingenciamento de outras despesas. Não se trata, aí, de cancelamento definitivo. Se a execução orçamentária evoluir bem, o governo poderá restabelecer os gastos programados. A privatização da Eletrobrás, bloqueada inicialmente pela Justiça e agora dependente da aprovação de um projeto de lei, é uma das dúvidas mais importantes. Na incerteza, o bloqueio de cerca de R$ 12 bilhões pode ser inevitável.
Talvez o corte definitivo seja mantido na faixa prevista. Mas o contingenciamento adicional afetará o ritmo de realização das despesas. Também afetará a qualidade da execução orçamentária, prejudicando a oferta de serviços públicos. Quanto mais limitado o cumprimento do programa original, maior o custo imposto a muitos milhões em benefício de um número pequeno de favorecidos.
Mas o prejuízo será muito maior, nos próximos anos, se a administração fracassar nos ajustes e nas reformas. No ano passado, o déficit primário do governo central ficou em R$ 124,4 bilhões pelas contas do Tesouro ou em R$ 118,4 bilhões pelos cálculos do Banco Central (BC). Em qualquer caso, bem abaixo do limite de R$ 159 bilhões. Ainda assim, o déficit foi muito grande, porque o superávit de R$ 58 bilhões contabilizado pelo Tesouro foi pulverizado pelo déficit de R$ 182,4 bilhões da Previdência, que mais uma vez evidencia a urgência da reforma previdenciária. O conjunto do setor público – União, Estados, municípios e estatais – fechou o ano com déficit primário de R$ 110,6 bilhões, graças a resultados positivos de governos subnacionais.
Somando-se a esse resultado a conta de juros, chega-se ao déficit nominal de R$ 511,4 bilhões, 7,8% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2016, o buraco havia correspondido a 8,9% do PIB. A melhora decorreu de uma forte restrição de gastos, de maior arrecadação propiciada no segundo semestre pela recuperação econômica e por um importante conjunto de receitas extraordinárias. Receitas especiais, como a da privatização da Eletrobrás, ainda incerta, continuam muito importantes para os planos oficiais.
Juros básicos em queda, graças à inflação reduzida, atenuaram as despesas financeiras, mas, ainda assim, a dívida bruta do governo geral chegou a R$ 4,8 trilhões, ou 74% do PIB. Em um ano essa proporção subiu 4,1 pontos porcentuais. Conter o endividamento é um desafio crucial. Se o peso da dívida em relação à economia seguir aumentando e o crédito do País continuar sendo rebaixado, será difícil evitar um desastre financeiro. A maior parte da conta irá, de novo, para os pobres e mais vulneráveis.
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