Jornalista Andrade Junior

sábado, 3 de junho de 2017

Sem crianças

J.R. Guzzo: Publicado na edição impressa de VEJA

Uma chamada nominal dos principais líderes políticos da Europa, para responderem a uma das perguntas mais simples que se podem fazer a alguém nesta vida, talvez traga uma surpresa para você. Emmanuel Macron, presidente da França? Não tem filhos. Angela Merkel, primeira-ministra da Alemanha? Não tem filhos. Theresa May, primeira-ministra da Inglaterra? Não tem filhos. Paolo Gentiloni, primeiro-ministro da Itália? Não tem filhos. Stefan Löfven, primeiro-ministro da Suécia? Não tem filhos. Mark Rutte, primeiro-­ministro da Holanda? Não tem filhos. Xavier Bettel, primeiro-ministro de Luxemburgo? Não tem filhos. Nicola Sturgeon, primeira-ministra da Escócia? Não tem filhos. O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, não tem filhos. O primeiro impulso é perguntar: alguém ainda tem filho, afinal, nos palácios de governo da Europa de hoje? Qual a chance de encontrar uma criança por ali, ou um adolescente, ou mesmo, vá lá, um filho adulto? Muito baixa, segundo a lista acima, divulgada recentemente pelo serviço de notícias Catholic World News, baseado nos Estados Unidos. Não se trata daqueles pequenos países europeus quase de fantasia, que os brasileiros gostam tanto de citar como exemplos de riqueza, bem-estar e felicidade geral. Estamos falando de Alemanha, França, Itália e Inglaterra, nações reais e complicadas, com uma população somada de quase 300 milhões de habitantes e as quatro maiores economias da Europa. Coisa séria.
Em princípio, ninguém tem nada a ver com isso; cada um tem o direito de cuidar da própria vida, e ter filhos não faz um governante ser melhor ou pior que outro qualquer, nem altera em alguma coisa a situação de um país. Na vida pública do Brasil, por exemplo, há famílias inteiras de Calheiros, e Sarneys, e Maias, e Magalhães, e sabe lá Deus quanta gente mais, e nem por isso foi possível notar até hoje se a República obteve algum proveito com a sua presença praticamente eterna em volta dos governos. Tudo bem ─ só que não dá para ficar fingindo que é algo perfeitamente normal o fato de governantes de oito países de uma mesma comunidade, mais o presidente da própria Comissão Europeia, não terem filhos. Há alguma coisa inquietante em constatar que “criança”, para eles, é uma entidade basicamente abstrata, ou um “coletivo”. Na sua cabeça, “criança” é algo que aparece associado a alguma ideia ─ como em “políticas públicas para as crianças”, por exemplo, ou “crianças abandonadas do Brasil”, ou “crianças africanas subnutridas”, ou “crianças expostas” ao crime, à internet, à doença, aos abusos sexuais e a mais uma infinidade de misérias. Estão sempre prontos a fazer leis sobre crianças, a criar programas nacionais para sua proteção, a salvá-las do McDonald’s. Há pouco decidiram que toda criança europeia tem o direito legal de não ser pobre. Mas criança de verdade, que é bom, não sabem direito o que é ─ não criança com vida própria, individualidade, um nome, um rosto. Não dá, no caso, para aprender o que é uma criança, nem para desenvolver sensações reais a respeito, lendo livros ou indo a palestras na Casa do Saber.
O fato é que os primeiros-ministros e presidentes aqui citados não têm, enquanto pessoas de família, um compromisso emocional direto com o futuro. É desconfortável. Talvez seja, também, apenas mais um reflexo aritmético da realidade populacional da Europa de hoje: se não nasce gente na sociedade em geral, é razoável que a mesma coisa aconteça com os políticos. O problema é que nasce muita criança entre os imigrantes estrangeiros e seus descendentes, sobretudo árabes e africanos ─ e a própria imigração, em si, não para de crescer. Na Alemanha, numa população de 85 milhões de habitantes, os dados oficiais mais recentes mostram que 20% do total já são estrangeiros de origem. Na França, que caminha para os 70 milhões de habitantes, os números são equivalentes. Na Bélgica, 25% da população total é formada por imigrantes, mais seus filhos e netos. Na Inglaterra, em pouco mais de vinte anos, a população nascida no estrangeiro aumentou em 100%, para cerca de 9 milhões de pessoas. Quase 30% de todos os bebês nascidos hoje na Inglaterra são filhos de imigrantes. Nos bairros mais centrais e densamente habitados de Londres, a população de origem estrangeira já passa dos 40%; o prefeito de Londres, por sinal, é muçulmano. Em países católicos, é comum que padres com dez ou mais anos de ordenação ainda não tenham conseguido batizar uma única criança em sua paróquia.

Não há nenhuma solução à vista.



































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