J.R. Guzzo: Publicado na edição impressa de VEJA
Em princípio, ninguém tem nada a ver com isso; cada um tem o direito de cuidar da própria vida, e ter filhos não faz um governante ser melhor ou pior que outro qualquer, nem altera em alguma coisa a situação de um país. Na vida pública do Brasil, por exemplo, há famílias inteiras de Calheiros, e Sarneys, e Maias, e Magalhães, e sabe lá Deus quanta gente mais, e nem por isso foi possível notar até hoje se a República obteve algum proveito com a sua presença praticamente eterna em volta dos governos. Tudo bem ─ só que não dá para ficar fingindo que é algo perfeitamente normal o fato de governantes de oito países de uma mesma comunidade, mais o presidente da própria Comissão Europeia, não terem filhos. Há alguma coisa inquietante em constatar que “criança”, para eles, é uma entidade basicamente abstrata, ou um “coletivo”. Na sua cabeça, “criança” é algo que aparece associado a alguma ideia ─ como em “políticas públicas para as crianças”, por exemplo, ou “crianças abandonadas do Brasil”, ou “crianças africanas subnutridas”, ou “crianças expostas” ao crime, à internet, à doença, aos abusos sexuais e a mais uma infinidade de misérias. Estão sempre prontos a fazer leis sobre crianças, a criar programas nacionais para sua proteção, a salvá-las do McDonald’s. Há pouco decidiram que toda criança europeia tem o direito legal de não ser pobre. Mas criança de verdade, que é bom, não sabem direito o que é ─ não criança com vida própria, individualidade, um nome, um rosto. Não dá, no caso, para aprender o que é uma criança, nem para desenvolver sensações reais a respeito, lendo livros ou indo a palestras na Casa do Saber.
O fato é que os primeiros-ministros e presidentes aqui citados não têm, enquanto pessoas de família, um compromisso emocional direto com o futuro. É desconfortável. Talvez seja, também, apenas mais um reflexo aritmético da realidade populacional da Europa de hoje: se não nasce gente na sociedade em geral, é razoável que a mesma coisa aconteça com os políticos. O problema é que nasce muita criança entre os imigrantes estrangeiros e seus descendentes, sobretudo árabes e africanos ─ e a própria imigração, em si, não para de crescer. Na Alemanha, numa população de 85 milhões de habitantes, os dados oficiais mais recentes mostram que 20% do total já são estrangeiros de origem. Na França, que caminha para os 70 milhões de habitantes, os números são equivalentes. Na Bélgica, 25% da população total é formada por imigrantes, mais seus filhos e netos. Na Inglaterra, em pouco mais de vinte anos, a população nascida no estrangeiro aumentou em 100%, para cerca de 9 milhões de pessoas. Quase 30% de todos os bebês nascidos hoje na Inglaterra são filhos de imigrantes. Nos bairros mais centrais e densamente habitados de Londres, a população de origem estrangeira já passa dos 40%; o prefeito de Londres, por sinal, é muçulmano. Em países católicos, é comum que padres com dez ou mais anos de ordenação ainda não tenham conseguido batizar uma única criança em sua paróquia.
Não há nenhuma solução à vista.
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