Deonísio da Silva:
Não se sabia, mas agora se sabe: Judas perdeu as botas em Curitiba, no bairro de Santa Cândida, na sede da Polícia Federal.
Alguns dos novos judas calçam as
sandálias da humildade para ir lá, mas outros vão de botas, como fez o
padroeiro de todos eles ao perdê-las. Talvez pensem que o Inferno fica
bem pra lá do fim do mundo e, como a viagem pode demorar, é melhor ir de
botas.
O bairro homenageia uma santa italiana,
etnia de muitos habitantes, não apenas de Curitiba, mas de todo o
Paraná, como é comum no Sul do Brasil. O juiz Sérgio Moro, referência
solar da Operação Lava a Jato (batizada pela mídia Lava-Jato e Lava
Jato) também descende de italianos do Vêneto. Dada sua biografia
impoluta, será sempre marcante que ele tenha condenado tantos criminosos
encarcerados por algum tempo num bairro chamado Santa Cândida e tenha
punido candidatos, eleitos ou não.
O étimo de cândida é o mesmo de candidato, o Latim candidus,
branco, puro. Na Roma antiga, os candidatos a funções públicas
vestiam-se de branco para vincular suas figuras à ideia de pureza e
honradez que a cor branca sempre teve.
Já o nome da rua onde fica a Polícia
Federal expressa a gratidão dos curitibanos a uma professora chamada
Sandália Monzon. As sandálias da humildade serão sempre mais
confortáveis do que as botas da vaidade e da prepotência.
De todo modo, a expressão “onde Judas
perdeu as botas” surgiu da tradição oral, que, em vez de tirar, sempre
acrescentou alguma coisa às histórias narradas pela Bíblia, de tal modo
que curiosas informações adicionais dão conta de que Matusalém morreu
afogado aos 969 anos. Deduziram que, com a idade que tinha, estava vivo
quando sobreveio o Dilúvio. A parteira do nascimento de Jesus, que
ninguém sabe quem foi, recebeu o nome de Salomé. Os ladrões crucificados
com Jesus também receberam nomes: Dimas era o bom; Gestas era o mau. As
botas de Judas representam outro destes acréscimos.
Judas era tesoureiro da campanha de
Jesus e provavelmente calçava sandálias quando ceou pela última vez com o
Senhor, completando o número 13 à mesa, que já era o número do azar,
mas cuja má fama foi acentuada desde a Última Ceia.
O suicídio de Judas está na raiz do
lendário e inimaginável lugar onde ele perdeu as botas. Foram misturadas
duas narrativas. O Evangelho de Mateus diz que, arrependido de ter
traído Jesus, ele atirou as trinta moedas dentro do templo e saiu para
enforcar-se. Os sacerdotes, porém, deliberaram tirar o dinheiro dali
para não deixar no tesouro sagrado um preço de sangue. E com a quantia
compraram um cemitério para os estrangeiros, desde então chamado “campo
de sangue”.
Os Atos dos Apóstolos descrevem o fim do
traidor de outro modo: “Ele comprou um campo com o salário da
iniquidade, dependurou-se e seu corpo caiu arrebentado pelo meio, tendo
suas vísceras se espalhado sobre o chão”.
Narrativas posteriores disseram que
Judas enforcou-se em galho de árvore à beira de um precipício e dali
despencou. Quer dizer, não foram apenas as botas de Judas que jamais
foram encontradas. Também seu corpo perdeu-se ali.
As botas de Judas nunca foram
encontradas e o lugar onde ele as perdeu tornou-se sinônimo de região
inacessível. Só se sabe que a localidade, conhecida também por cafundó
de judas, fica perto de onde o vento faz a curva, no meio do nada.
extraídadeblogdeaugustonunesopiniaoveja





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