RODRIGO R. MONTEIRO DE CASTRO O Globo
O Brasil é um dos únicos países relevantes na prática do futebol que não oferece aos seus times uma via de direito especialmente arquitetada para inserir-lhes no complexo e ultracompetitivo ambiente global.
Esse caminho é, em grande parte, responsável pelo descrédito do futebol brasileiro no exterior e pelo estado de penúria no plano interno: times com dívidas milionárias; falta de condições para formação, educação e manutenção de jogadores no país; inexistência de meios de financiamento de suas atividades; crianças preferindo campeonatos europeus aos brasileiros; e ausência de referências e ídolos locais.
A seleção, que antes jogava por poesia e encantava o mundo, transformou-se em paródia. Ou piada. Para complementar esse enredo, a CBF, que deveria pensar no resgate e na reinvenção do futebol, pensa só nela e nos seus interesses.
A boa notícia é que uma iniciativa legislativa pode oferecer os instrumentos para reversão dessa situação. Trata-se do PL 5.082/16 (PL), de autoria do deputado Otavio Leite (PSDB-RJ).
O PL cria a sociedade anônima do futebol (SAF), instrumento adequado para formação de um novo ambiente, que aproximará a cultura futebolística do poupador, do investidor e do mercado. E alterará a estrutura de governança e transparência, sem atentar contra a tradição e a história dos times. Nem a paixão do torcedor.
Importante frisar: o PL não obriga os clubes a criarem a SAF. A adoção será voluntária e mediante a aprovação da assembleia geral do clube que a desejar — condição que deveria, por si só, acabar com qualquer resistência ao PL.
De todo modo, como suas potencialidades são muitas, é oportuno relacionar algumas delas.
1 — A SAF permite a separação do futebol profissional das outras atividades do clube, inclusive as praticadas profissionalmente;
2 — o clube será controlador de 100% da SAF;
3 — a SAF poderá financiar-se no mercado, investindo os recursos captados na formação de jogadores, contratação de atletas, melhoria de estrutura, construção ou reforma de estádio etc.
4 — caso o clube queira, poderá atrair um investidor, minoritário ou majoritário. O Bayern, por exemplo, atraiu três: Audi, Adidas e Allianz, que, juntos, detêm apenas 25% do capital total;
5 — caso o clube queira, poderá abrir o capital da SAF, oferecendo aos torcedores a possibilidade de se tornarem acionistas e ganharem com o time.
6 — o modelo se passa num ambiente fiscal transitório, que dará à SAF o prazo e as condições de se adaptar à lógica empresarial;
7 — além disso, o PL cria um valor mobiliário específico do futebol, a debênture-fut, com condições próprias para incentivar a formação de um novo mercado;
8 — estabelece a possibilidade de a SAF celebrar convênios com escolas da rede pública de ensino, para educação e formação de crianças para o futebol.
Nada acontecerá se o clube não quiser. A decisão será sua, respeitando-se a autonomia privada. Então, pergunta-se: por que não a SAF como modelo opcional para organização do futebol brasileiro, se os clubes assim desejarem?
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