Na
ideologia, esse ‘algo de verdade’ que encerra o poder de sedução, é o
lugar mesmo da mentira e do que é mais falso. Esta regra se aplica à
toda ideologia e particularmente à ideologia comunista.
As FARC convenceram os negociadores de Santos de que a prioridade dos diálogos em Havana não é alcançar a paz na Colômbia, senão obter “o fim do conflito”. A diferença entre um e outro não é tão tênue nem tão desinteressante como nos querem fazer crer. São dois cenários muito diferentes.
As
FARC disseram que não estão dispostas e entregar as armas senão que
elas, se chega-se a um acordo com Santos, “desaparecerão” como
“apareceram” quando as FARC foram fundadas. Essa armas escondidas,
estimam as FARC, são a garantia de que o pactuado será cumprido. Quer
dizer, eles provavelmente desaparecerão suas armas mas não
definitivamente.
A
mensagem que as FARC enviam dessa maneira é que elas assinarão um papel
para Santos se ele lhes garante o que diz o “marco jurídico para a
paz”, quer dizer, a impunidade total de seus crimes e a liberdade
completa para invadir o terreno político e midiático do país, e mais
tudo o que estão pedindo em Havana: a exigência da “redução” das Forças
Militares e a desmilitarização permanente de imensos territórios do
país, mediante o pretexto das “zonas camponesas” (os 42.000 km² da
triste época do Caguán não serão senão uma pálida lembrança do que
querem obter agora), e a mudança da doutrina militar. Também irão querer
mudar - por que não? - o sistema de alianças internacionais do país.
Em troca disso, e a partir dessa assinatura, a cessação das ações
armadas das FARC será efetiva, porém essa cessação será unicamente
provisória.
Os
ataques contra a sociedade e contra o Estado recomeçarão,
evidentemente, quando as FARC considerarem oportuno. Para elas, tudo
depende da situação interna do país e da evolução do campo
internacional, especialmente da estabilidade das ditaduras que sustentam
o projeto das FARC e do auge ou declínio do tráfico de drogas em nível
mundial.
Todavia,
trabalhar dessa maneira tão hipócrita não será violar o acordo com
Santos, pois as FARC não teriam pactuado com ele desmantelar suas
estruturas de força e deixar definitivamente a Colômbia em paz, senão
unicamente chegar a um “fim do conflito”.
As
FARC não pactuarão sequer pôr um fim definitivo ao conflito. Elas
aceitariam chegar a um fim provisório do conflito. Essa perversão dos
objetivos anunciados por Santos desde há seis meses, quando começaram os
encontros “confidenciais”em Cuba, já foi aceita pelos negociadores de
Santos. Eles engoliram esse conto como se isto não significasse nada. A
prova é que um dos negociadores, sem ser desautorizado por Santos, disse
dia desses explicitamente em Bogotá: o objetivo é obter “o fim do conflito”.
Esse
fim do conflito poderia durar alguns meses, enquanto as FARC se
reorganizam e reforçam. Ao conservar as armas, conservariam também uma
parte substancial dos guerrilheiros (para esconder as armas é necessário
ter gente armada que as esconda). Quando tenham melhorado sua posição, e
quando as ditaduras que alimentam a ação das FARC decidirem (uma parte
dos chefes farianos continuará obviamente na clandestinidade ou fora do
país após o acordo), a agressão contra a Colômbia poderá ser retomada
com força mediante a reativação daquela parte das frentes mais
experimentadas e cocaineiros que não haviam se desmobilizado. E para
isso contarão com a participação diplomática e até militar - por que
não? - dos poderes vizinhos desesperados.
Não
haverá, pois, nem entrega de armas, nem desmobilização real das
estruturas armadas das FARC, nem paz. Quer dizer, não haverá nada para a
Colômbia e haverá sim muitas vantagens para os narcoterroristas. Uma
espada de Damocles penderá sobre o país graças a esses falsos acordos.
Isso é o que Santos e as FARC pretendem que os colombianos aceitemos, e
que a comunidade internacional saúde como um grande progresso e como um
grande ato de construção de paz na Colômbia. O que seguirá é o Prêmio
Nobel da Paz e a re-eleição do “presidente mais progressista de todos os
tempos”.
Semelhante
traição aos interesses imediatos e estratégicos da Colômbia e do
continente americano, é o que Santos quer impor à força ao país.
Quem
não vai engolir inteiro, sobretudo isso da anistia plena para os
experimentados criminosos das FARC, o da lei de perdão e esquecimento
que Santos decretou com o “marco jurídico para a paz”, será o Procurador
Geral da Nação e com ele as organizações e movimentos uribistas, e as
correntes majoritárias autenticamente amantes das liberdade e do país. E
no campo internacional haverá o rechaço da Corte Interamericana de
Direitos Humanos e da Corte Penal Internacional, e das ONG, como Human
Rights Watch que vêm dizendo há meses que nem os crimes de guerra nem os
crimes contra a humanidade podem ser anistiados nem indultados, embora
haja em curso um processo de transição da guerra à paz.
Como
se chegou a essa situação em que os negociadores de Santos, que
supõe-se estão em Havana para defender os interesses da Colômbia,
terminaram aceitando as propostas das FARC e traindo a Colômbia?
“Há uma regra geral”, adverte o historiador francês Alain Besançon. “Quando
se está frente a um regime ideológico, a primeira coisa que se deve
fazer, e a linha que deve-se manter até o fim, é rechaçar sem discussão a
descrição da realidade que o estabelece. Se metemos um dedo na
engrenagem e se aceitamos que nessa descrição há ‘algo de verdade’, se
aceitamos, por exemplo, que existem arianos e não arianos, e que, em
conseqüência, existe um ‘problema judeu’, estamos perdidos e a vontade
claudicará ante uma inteligência falseada. Não nos resta outra coisa que
suplicar aos ‘arianos’ que resolvam ‘humanamente’ o ‘problema’”. Besançon continua: “Na
ideologia, esse ‘algo de verdade’ que encerra o poder de sedução, é o
lugar mesmo da mentira e do que é mais falso. Esta regra se aplica à
toda ideologia e particularmente à ideologia comunista”.
Isso
é o que ocorreu nos diálogos de Havana. Quando os negociadores de
Santos aceitam que há “algo de verdade” na proposição das FARC de que “o
conflito” foi engendrado “pela pobreza no campo” e não pela decisão
política unilateral de um partido que queria tomar o poder para
sovietizar o país, devem acabar admitindo, como admitiram, que
precisa-se fazer a mudança “revolucionária de estruturas” com e segundo
os gostos dos terroristas.
Se os negociadores aceitam que “há algo de verdade” nisso de que “abandonamos o campo colombiano”, e que por isso “os filhos dos camponeses não podem chegar às universidades nem podem receber serviços de saúde”, tal descrição falsa da realidade (pois exagerada), leva-os direto à impostura de que deve-se fazer a “reforma agrária revolucionária”, que deve-se aceitar a expropriação das melhores terras “dos ricos” para dá-las “aos pobres” e
que, em última instância, o capitalismo deve ser abolido e substituído
por um sistema coletivista. E que a democracia é um fracasso, pois
causou tais calamidades.
Nisso
estamos nesses diálogos em Havana. Para lá vão as famosas “conversações
de paz” e sem que consiga nada para o jorro demagógico dos senhores
Catatumbo e Márquez. Como Santos, para posar com uma imagem de
“presidente progressista”, aceitou discutir as fantasias e mentiras de
uma força comunista derrotada, agora seus negociadores estão em um limbo
teórico e político: não sabem o que dizer nem o que propor, pois são
obrigados a seguir essa lógica e a se ajoelhar ante os discursos
inflamados desses derrotados. Por isso toda a Colômbia, segundo eles,
pode e deve ser negociada.
Isso
é o que tem desesperado e ofendido o país: a atitude inepta e insidiosa
de um Estado democrático que termina capitulando, pelos desatinos
egoístas de um mandatário, ante uma minoria terrorista.
Tradução: Graça Salgueiro





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