por Zeina Latif
Nesta campanha eleitoral vemos diferentes formas de populismo. O de
esquerda é velho conhecido e, portanto, mais previsível. Uma vez que se
desce do palanque, a retórica muda e converge para o centro. Poderá ser
um governo cheio de contradições e propenso a instabilidades.
O populismo de direita é desconhecido e, portanto, mais incerto. É mais
difícil separar a bravata de campanha da convicção. As falas do
candidato a vice-presidente de Jair Bolsonaro, general Hamilton Mourão,
por exemplo, trazem apreensão, como na defesa de uma nova Constituição
elaborada por personalidades notáveis. Esperamos não ser para valer a
ameaça ao Congresso Nacional. De qualquer forma, é equivocada a proposta
de uma nova Constituição.
Revogar a atual Carta é, não apenas desnecessário, como também
arriscado. Passados 30 anos da sua promulgação, continuamos uma
sociedade plural e segmentada, e com grupos de interesse organizados e
corporações que buscam preservar seus privilégios. O estado
patrimonialista está aí, talvez mais forte do que nunca. Para piorar,
vivemos tempos de muita fragmentação social. A falta de coesão cobra seu
preço. Uma nova Constituição, neste momento, poderá ser um equívoco
histórico.
Reformas na Constituição balzaquiana, no entanto, são necessárias. Temos
uma Carta que prevê muitos direitos do cidadão e poucos deveres. É
preciso ajustar as regras do jogo às necessidades mutantes da sociedade.
Sem isso, não será possível sedimentar a atual estabilidade
macroeconômica e voltar a crescer.
Há reformas fiscais urgentes. A grave crise que assola o País tem origem
fiscal. A irresponsabilidade do governo anterior soma-se às mudanças
demográficas que aumentam o déficit da Previdência.
A Constituição de 1988 produziu um regime previdenciário generoso e
desigual. Além disso, há excessiva rigidez orçamentária, por conta de
regras constitucionais que regem despesas e receitas públicas, como a
estabilidade do funcionalismo, algumas políticas sociais e renúncias
tributárias, como a Zona Franca de Manaus.
Não podemos inverter prioridades, pois corremos o risco de não haver
ajuste algum e, assim, caminharmos para o descontrole inflacionário. Se o
cenário internacional se mantiver ruidoso, o caminho para a
instabilidade macroeconômica poderá ser o rápido.
Nossa história mostra que reformas constitucionais são possíveis. Nem
sempre ocorreram na frequência necessária e na direção correta. Houve
retrocessos que geraram mais rigidez de gastos, mas também houve
avanços.
A gestão FHC foi a mais reformista e modernizante. Citando apenas as
constitucionais, houve afrouxamento de regras para investimento
estrangeiro, quebra do monopólio de telecomunicações e de petróleo e
gás, reforma administrativa e novas regras da Previdência.
Com Lula, mais avanços concentrados no primeiro mandato, com a reforma
da Previdência do setor público e a reforma do Judiciário. Dilma manteve
o apagão reformista do Lula 2. Temer retomou a agenda de reformas e
aprovou a regra do teto de gastos.
Este balanço mostra que o ímpeto reformista depende de capacidade de
enfrentamento e de diálogo do presidente, bem como habilidade política e
liderança. Nos três casos, diferentes combinações desses atributos,
sendo FHC o mais bem-sucedido.
No momento, está difícil enxergar ímpeto reformista nas candidaturas
mais competitivas do pleito presidencial. Não são lideranças que
inspiram e, certamente, enfrentarão elevado ceticismo da sociedade, a
julgar pela elevada rejeição. De quebra, políticos inexperientes e pouco
hábeis, ainda que em diferentes graus.
O lado bom desta história é a própria sociedade, que reage à inflação
alta. Não somos Argentina ou Turquia. Inflação alta aqui derruba
presidente.
Quem será o candidato que mais rapidamente descerá do palanque para
preparar a transição, dando continuidade à agenda de reformas? Quem
melhor conciliará liderança e humildade para navegar em tempos difíceis?
*ECONOMISTA-CHEFE DA XP INVESTIMENTOS
O Estado de S.Paulo
EXTRAÍDADEROTA2014BLOGSPOT
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