Valentina de Botas:
Responde e/ou te devoro e outras notas
Antes de Edson Fachin estender o prazo de Temer até
sexta-feira, o presidente tinha 24 horas para responder quase 200
perguntas da Polícia Federal inspiradas pelo refundador-geral da
república. As 80 e tantas embutem outras, o que eleva a quantidade. A PF
tem pressa: dá 24 horas para Temer e levará 30 dias para periciar a
gravação de 40 minutos que Janot deveria ter mandado periciar antes de
não a usar para coisa nenhuma. Mas os dias são assim e, tomado por
repentina pressa, Janot dispensou a picuinha legal porque, desperto do
sono para “os interesses do país”, a lei passou a atrapalhar o
cumprimento da lei. Depois de Lula ter instalado o mensalão e progredir
para o petrolão sem que lhe fosse imposto prazo para perguntas jamais
feitas, vamos tirar o atraso. Só acho que devemos ficar de olho, o povo
não é bobo: Temer está enrolando, querendo ganhar tempo enquanto é
devorado; depois de ler as perguntas da PF, em dois minutos ele poderia
apressar as coisas e responder tudo com duas perguntas simples: 1 – OK,
Janot, mas e o Lula? 2 – OK, Fachin, mas e julgar alguém que o ajudou a
cabalar votos para a sabatina no Senado para o STF?
Por falar em bandidos de estimação
Depois de Lula no segundo turno das diretas-já que nem mesmo
ele quer agora e só as insufla ajudado por tanta gente (de artistas a
intelectuais, passando pelo ministro Roberto Barroso, aquele com
complexo de legislador) para manter a nação atribulada e, assim aturdida
e desencantada, ser convencida de que só ele faz a paz; depois de o
ex-goleiro Bruno dar autógrafos para crianças nos treinamentos do Boa
Esporte; Suzane Richtofen atrai tietes nas saídas temporárias da cadeia.
Desta vez, a jovem que tramou o assassinato dos pais e foi ao motel,
chorou no velório deles e quis a herança, é vista distribuindo
autógrafos e é convidada por cidadãos comuns para selfies nas ruas de
duas cidades do interior de São Paulo. Por favor, não me entendam mal,
não estou comparando o chefe da organização criminosa (segundo o
Ministério Público) a Bruno e Suzana: o mal indizível que estes dois
fizeram atingiu um número restrito de pessoas.
Ah, se esse país tivesse outro jeito torto de ser
Temer, quando vice decorativo de Dilma, viajou com Marcela e
o filho no avião da JBS/esleys em 2011. Anunciaram as roucas trombetas
do fim do mundo. Um dos esleys (parece que o Jo) ainda deixou flores
para Marcela e teve de armar um esquema com a própria mãe para diluir o
ciuminho do presidente. Um pândego esse Joesley, não é mesmo? Ô se é! A
casa onde o ministro Edson Fachin participou de um jantar numa longa
jornada noite adentro quando em campanha pelo STF também é de Joesley
Batista. E quem é Ricard Saud que cabalou, entre congressistas, votos
para Fachin ser aprovado para o STF? O homem da mala. Homem da mala de
quem? De Joesley Batista, cuja delação com vistas para o Central Park
foi chancelada pelo mesmo Fachin. Tão impróprio quanto Temer usar o
avião dos esleys é Fachin ser o relator do caso em que os irmãos
reluzem. O país só terá jeito quando as duas coisas forem repelidas.
Quem pretende lhe dar um jeito repelindo só uma delas – não importa qual
–, está lhe dando um novo jeito torto de ser.
Lava Jato de raiz e Lava Jato com alfafa
Grande parte da imprensa se entreteve com a viagem de Temer
no tal avião como prova da intimidade dele com a JBS. Nem precisava, mas
vale tudo. Ou quase: não vale falar de Fachin, Janot e da intolerável
porque ilegal e imoral delação dolarizada dos esleys; quem falar disso é
leigo, idiota, não entende nada; ou está defendendo bandido. Tem de
calar a boca. Bem, se no reino da intolerância e do desencanto em que os
moralistas se prestam à manipulação, for possível escolher, fico na
caixinha dos leigos, que é melhor do que defender bandido e porque sou
leiga mesmo. Felizmente, a ministra Cármen Lúcia já determinou que
cala-boca-já-morreu. Então falo o que vejo. Certo jornalismo fast-food
de notinhas insinuantes e parte do jornalismo televisivo, que querem o
país lavado a jato sem questionar a limpeza de quem lava nem se importar
com a ridicularia de determinadas narrativas, serviram de novo a cabeça
de Temer acompanhada de alfafa, guarnição frequente desde que Janot e
Fachin deram-se as mãos para perdoar o passivo penal dos esleys cujas
sentenças somariam 2.448 anos, segundo o essencial editorial do Estadão
de hoje que segue como uma das poucas ilhas de lucidez no país que se
voluntariou para o caos. Aquele jornalismo fast-food, o televisivo e
parte do, digamos, tradicional, cuja atuação foi decisiva para que a
Lava Jato continuasse operando, se continuarem tratando a armação
Janot-Fachin como a Força Tarefa de Sérgio Moro, vão misturar alfafa e
raiz. Se isso não traduz o fim do mais auspicioso acontecimento no país
redemocratizado – a operação Lava Jato –, traduz o veto ao país que ela
desenhou.
Uma mulher, um gay, um cristão, um ateu, um judeu
Achei bacana e tal quando o muçulmano Sadiq Taran foi eleito
prefeito de Londres, mas não achei nada extraordinário. Os atentados
islamoterroristas em série na cidade me fizeram lembrar o que pensei à
época: o fato extraordinário, digno de grande celebração por cidadãos de
bem do mundo, é quando houver, em Riad, Cabul ou Teerã, um prefeito
judeu ou cristão ou budista ou ateu ou mulher. Ficaram confusos? Então
vocês entenderam.
EXTRAÍDADEBLOGDEAUGUSTONUNESOPINIAOVEJA
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