, editorial de O Globo
Era inexorável a contaminação político-ideológica do debate sobre as reformas necessárias para retirar o país da crise fiscal, sendo uma das principais a da Previdência. Mesmo em tempos menos tensos isto não deixaria de ocorrer. Como acontece na Europa ocidental — região de economias e sociedades desenvolvidas —, sempre que é necessário rever mecanismos de seguridade social.
É o caso do Brasil. Mas aqui há o agravante de a missão de fazer estas reformas ter ficado com o governo de Michel Temer, vice de Dilma Rousseff (PT), retirada do Planalto por um processo de impeachment, apoiado, entre outros, pelo partido de Temer (PMDB), e instaurado por crimes de responsabilidade cometidos pela presidente ao desrespeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Há, portanto, uma carga adicional nas críticas feitas à reforma da Previdência, forçada por simples lógica aritmética: as despesas com benefícios previdenciários e pensões ultrapassam a receita proveniente das contribuições dos trabalhadores no setor formal da economia (com carteira assinada), e são estruturalmente crescentes. No ano passado, o déficit quebrou a barreira dos R$ 100 bilhões, com projeções muito preocupantes. E o desemprego não explica tudo.
As razões que impõem esta reforma — que chega tarde, daí precisar ser dura —, de fundo demográfico, são idênticas às que volta e meia impelem países desenvolvidos a fazer o mesmo, e com iguais desdobramentos: incompreensão de muitos e temor dos políticos.
Este é um dos momentos em que se vê a diferença entre a estatura dos homens públicos.
No atual debate sobre a reforma da Previdência, uma corrente tenta desqualificar o déficit com argumentos fantasiosos. Dependendo da forma como se torturem as estatísticas, elas mostram qualquer cenário. Até que a Previdência brasileira é superavitária. Basta, por exemplo, retirar do INSS a aposentadoria rural, e tachá-la de benefício social, alocado em alguma rubrica fora do INSS. É simples, mas mentiroso.
Não se consegue esconder que as despesas do Estado, não importa onde estejam registradas, geram um déficit enorme, na faixa dos 9% do PIB. E se tirarmos dos gastos os juros, uma conta elevada, mesmo assim há um rombo acima de 2% do PIB. Mais: das despesas primárias (sem os juros), os gastos previdenciários já são mais de 40%. Logo, é preciso revê-los.
Sob o aspecto demográfico, a Previdência, como está, fica ainda mais insustentável. Pois, num país em que a expectativa de vida da população está felizmente em alta e já passa dos 75 anos, o fato de a idade média de se aposentar ser de 58 anos é um problema estrutural grave. E, como a faixa jovem da população tende proporcionalmente a ficar menor, é indiscutível que o INSS estará falido em algum tempo. Afinal, mais pessoas receberão benefícios por mais tempo e menos contribuirão para o INSS. Não há ideologia que refute esta verdade e desqualifique a proposta de uma idade mínima (65 anos) para a habilitação à aposentadoria, como na maioria dos países.
extraídaderota2014blogspot5
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