Jornalista Andrade Junior

terça-feira, 29 de março de 2016

Gravação da conversa de Lula e Dilma tinha de vir a público

Carlos Newton


Está ficando cada vez mais repetitivo e enfadonho. Em todas as oportunidades que aparecem (ou que são criadas, como a coletiva com jornalistas estrangeiros), a presidente Dilma Rousseff insiste em apontar a ilegalidade da gravação do telefonema em que avisou a Lula sobre o falso termo de posse. Reclama também dos vazamentos para a imprensa. E até mesmo no Facebook ela continua alegando que “a violação ilegal da privacidade atenta contra o Estado de Direito”.
Isso significa que a presidente até agora não entendeu como funciona esta questão da privacidade. Sabe-se que, embora se considere uma mulher sapiens, ela é meio autista e tem dificuldades de expressar raciocínios lógicos. Mas foi eleita, está à frente da administração pública, pode recorrer a ministros e a todo tipo de assessores. Portanto, deveria se informar melhor.
A privacidade de homem público tem rigorosos limites, não pode ser comparada aos direitos de um cidadão qualquer, que represente apenas um rosto na multidão, como no filme de Elia Kazan, que conta a história de um homem comum que vira astro de TV e se curva à corrupção.
PÚBLICO E PRIVADO
A presidente Dilma Rousseff, seus ministros e assessores, os administradores de estatais e a própria classe política brasileira têm demonstrado dificuldades insuperáveis para compreender a diferença entre público e privado, situação que provocou a grave crise política e moral que o país atravessa.
Mas a explicação é muito simples e está consagrada nas normas mais recentes do Direito Público e do próprio Direito Civil, em países que já atingiram um estágio mais avançado de justiça social.
Como se sabe, coisa pública em Latim significa justamente “res publica”. Portanto, nas repúblicas o que é público não pode ser privado. Justamente por isso, todo homem público tem limitações à sua privacidade. E nenhum ato administrativo praticado por agente público (governante, político, servidor de qualquer espécie e de qualquer um dos poderes, inclusive em estatais) pode ter direito a sigilo ou privacidade, salvo se a salvaguarda estiver explicitamente determinada em lei.
Como dizia o genial Aparicio Torelly, Barão de Itararé, quem desconhecer esta realidade pode acabar confundindo a coisa pública com a privada…
JURISPRUDÊNCIA
A esse propósito, convém recordar uma ação vencida pelo jurista Fernando Orotavo Neto em todas as instâncias, na qual conseguiu inocentar Helio Fernandes de uma grave denúncia de Ademar Ghisi, que era ministro do Tribunal de Contas da União e exigiu indenização, alegando que sua privacidade fora invadida e sua imagem manchada por artigos do famoso jornalista.
A argumentação de Orotavo Neto, um dos maiores advogados do país, foi irrefutável. “Todo homem público só tem direito a privacidade em sua vida particular, e desde que seus atos pessoais não afetem o interesse público. Qualquer iniciativa que tome à frente da administração pública não pode ser sigilosa e precisa se tornar do conhecimento de todos, até mesmo para ser analisada pelos veículos de comunicação”, assinalou o jurista.
GRAVAÇÃO DE LULA
Por óbvio, a gravação do telefonema da presidente da República, que mandou ligar para um político investigado por vários crimes, não poderia ser mantida sob sigilo, especialmente porque o assunto tratado (simulação de ato de posse não concretizado, para garantir foro privilegiado a que ainda não tinha direito a tal) significou cometimento de crime de responsabilidade passível de cassação de mandato – obstrução da justiça. E isso era do interesse de toda a Nação e teria de ser revelado pelo agente público que conduz as investigações – no caso, o juiz Sérgio Moro.
Se mantivesse a ligação Dilma/Lula sob sigilo depois de as transcrições serem anexadas aos autos públicos do inquérito, o juiz Sérgio Moro estaria cometendo crime de omissão imprópria, ao ocultar a ocorrência de fato delituoso que lhe chegou ao conhecimento. Mas esta sutileza jurídica certamente jamais será captada pela mulher sapiens ou pelos “juristas” que a assessoram.
SUPREMO SE CONTRADIZ
Por fim, deve-se destacar a contradição em que vive o Supremo. Embora tenha derrubado o voto secreto na Câmara, alegando que não pode haver sigilo para eleger uma simples comissão de deputados, porque a transparência precisa prevalecer nos atos públicos, os ministros do mais importante tribunal do país continuam mantendo sob sigilo grande número de inquéritos e processos, inclusive uma ação movida pelo Procuradoria-Geral da República contra o deputado Eduardo Cunha, que merecia estar sendo julgado em praça pública.
É por isso que Francelino Pereira e Renato Russo sempre perguntavam: “Que país é esse?”.









EXTRAÍDADETRIBUNADAINTERNET

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