MIRANDA SÁ
“A vida é um incêndio: nela dançamos, salamandras mágicas. Que importa restarem cinzas se a chama foi bela e alta! ” (Mário Quintana)
Quando estudávamos latim no ginásio éramos obrigados a ler e traduzir os discursos de Cícero – que sempre caiam no exame vestibular das faculdades de Direito -, e para os curiosos, como eu, haviam coletâneas de provérbios e os “Doze Césares” de Suetônio.
Lembro-me (não tenho condições de confirmar, por falta de referência) que o livro de Suetônio tem um capítulo dedicado a Nero, onde encontramos as mesmas louvaminhas dos historiadores chapas-branca que enxameiam em torno do poder – e aparecem muitos entre nós…
Para defender o Imperador, Suetônio transfere para os cristãos a culpa pelo incêndio de Roma, uma versão que foi negada posteriormente por Tácito, e que foi combatida insistentemente por escritores católicos, como no livro “Quo Vadis”, romance do escritor polonês Henryk Sienkiewicz ambientado na Roma Imperial à época de Nero.
O tema abordado por Sienkiewicz gira em torno da conversão de Paulo de Tarso ao cristianismo, sua presumível presença em Roma e a perseguição que se abateu sobre os cristãos, após o incêndio.
A força do livro “Quo Vadis” e a transmissão oral por gerações consecutivas atribuem a Nero um comportamento execrável, sentimentos abjetos, sexualidade pervertida e acusam-no pelo incêndio urdido apenas para lhe inspirar um poema…
Outros pontos de vista argumentam antagonicamente o perfil de Nero como um monstro e os seus atos tirânicos. Se firmam pela denúncia de ficção e a frágil confiabilidade das fontes que abundam na Biblioteca do Vaticano.
Fugindo da discussão e separando a ficção da realidade, podemos encontrar governantes que a História registra desde a Antiguidade apresentados como heróis pelos seus patrícios, mas que foram responsáveis por chacinas criminosas. Temos o exemplo de Napoleão Bonaparte, que com suas guerras foi responsável por um milhão e setecentos mil franceses mortos.
Nem precisamos falar de Hitler e Stálin, os neros do século passado, ainda fixos na memória dos traficantes de utopias fraudulentas, e cultuados por admiradores fanáticos.
Ambos foram piromaníacos: Stálin mandou queimar a safra de trigo dos kulaks na década de 1920; e Hitler arquitetou o incêndio do Reichstag após a vitória eleitoral em 1933, o que lhe proporcionou o poder absoluto na Alemanha. O Führer também se divertia com as fogueiras armadas com livros clássicos pela Juventude Nazista…
Guardo tristemente na memória recente do grande incêndio da catedral de Notre-Dame de Paris, cuja construção data do século 12, e se tornou o símbolo da capital francesa. Esta tragédia, segundo notificação inicial da polícia deveu-se à negligência pela conservação da igreja.
A indiferença por um patrimônio cultural da humanidade deu-se igualmente no Brasil com o incêndio do Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista, Rio de Janeiro. As causas foram esquecidas, mas ninguém me tira da cabeça que esse trágico incidente deveria ser creditado aos responsáveis pela sua preservação.
Temos no Brasil incendiários perversos com as continuadas queimadas das nossas florestas, em particular na Floresta Amazônica. Os criminosos são blindados por um mecanismo dissimulado e oculto aos olhos dos governos através dos tempos. Antes, durante, e possivelmente após o Governo Bolsonaro, se não pudermos evitar punindo severamente os seus autores.
Mesmo com a criação da operação Garantia da Lei e da Ordem (GLO), autorizando os militares para coibir as queimadas na Região Amazônica, ainda estamos longe de ver o fim da ação revoltante
A defesa da Amazônia não pode se resumir às piadas em torno da ativista juvenil Greta Thünberg. Trata-se de uma imposição da consciência patriótica para impedir que a “boiada passe” arruinando o futuro das próximas gerações.
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