André de Souza, O Globo
"Luiz Inácio Lula da Silva, valendo-se do seu cargo assim como da sua
posição no cenário político nacional, não apenas orquestrou todo o
esquema de arrecadação de propinas oriundas da Petrobras por diversos
partidos, como também atuou para que seus efeitos se perpetuassem,
nomeando e mantendo em cargos de direção da mencionada empresa estatal
pessoas comprometidas com atos de corrupção e que efetivamente se
corromperam e se omitiram em seu dever de ofício de impedir o resultado
criminoso", argumentou Dodge.
Depois acrescentou: "Foi somente em razão da atuação de Luiz Inácio Lula
da Silva, comprometida com seus interesses particulares, que tal
esquema ilícito foi capaz de assumir essas proporções. Ele, conforme
exposto à exaustão ao longo da peça, foi responsável diretamente por
nomear, para altos cargos da Petrobrás, pessoas sabidamente
comprometidas com atividades de corrupção, atuando, ainda, para manter
tal situação.
Essas circunstancias tornam os crimes cometidos pelo ex-presidente de
rara gravidade", diz trecho do documento da Procuradoria-Geral da
República (PGR)."
Ela citou ainda os nomes de alguns diretores da Petrobras nomeados por
Lula. "Repise-se: Paulo Roberto Costa, Renato Duque, Nestor Cerveró,
todos já condenados por corrupção, foram nomeados Diretores durante o
Governo de Luiz Inácio Lula da Silva", escreveu Dodge.
Ela lembrou também que Lula foi eleito presidente "com um ferrenho
discurso anticorrupção, alardeando sua honestidade e prometendo combate
aos dilapidadores dos cofres públicos" e "em virtude de sua retórica de
probidade e retidão". Assim, argumentou, "tais fatos elevam sobremaneira
o grau de censurabilidade da conduta do recorrente e devem ser punidos à
altura".
Dodge também alegou questões processuais para dizer que o pedido de Lula
deve ser rejeitado. Ela desconsiderou, por exemplo, as alegações da
defesa de que teria faltado isenção ao juiz federal Sérgio Moro,
responsável pelos processos da Lava-Jato na primeira instância e autor
da primeira sentença condenando o ex-presidente. Segundo Dodge, essa
questão não deve ser examinada agora. Afirmou ainda que, ao dizer que
houve desrespeito ao "direito à ampla defesa", os advogados de Lula
confundem isso como "direito à defesa ilimitada".
Lula foi condenado a 12 anos e um mês de prisão pelo Tribunal Regional
Federal da 4ª Região (TRF-4), com sede em Porto Alegre, pelos crimes de
corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O processo diz respeito à
aquisição do triplex no Guarujá, no litoral paulista.
Dodge ressaltou que Lula recebeu propina da OAS no valor de R$ 3,74
milhões "mediante a disponibilização" do imóvel. Assim, concluiu, o fato
de o triplex "ter sido destinado indevidamente a Luiz Inácio Lula da
Silva, apesar de não ter passado formalmente à sua posse ou propriedade,
já é suficiente a configurar o 'recebimento de vantagem indevida'".
"O apartamento triplex concedido a Luiz Inácio Lula da Silva, assim como
outras vantagens destinadas ao ex presidente e apuradas em ações penais
próprias, consistiu em retribuição pela sua atuação em prol de garantir
o funcionamento do esquema que lesou a Petrobras", afirmou a
procuradora-geral
Ainda segundo ela, "há material probatório farto" no processo em que ele
foi condenado "no sentido de que o Grupo OAS concedeu a Luiz Inácio
Luiz Inácio Lula da Silva da Silva a posse e propriedade de fato
apartamento 164-A, triplex, no Condomínio Solaris, no Guarujá/RJ (sic),
bem como a respectiva reforma para adaptá-lo aos interesses do
beneficiário".
Dodge rebateu ainda o argumento da defesa segundo o qual o crime de
lavagem pelo qual Lula foi condenado seria um dos componentes do crime
de corrupção. Assim, nunca poderia ter sido julgado por lavagem, por
configurar dupla punição por uma mesma conduta. Mas, na avaliação da
procuradora-geral, a ocultação da real propriedade do apartamento,
constitui crime distinto.
Ao justificar a manutenção da pena, que segundo a defesa foi alta, a
procuradora-geral anotou: "As circunstâncias em que se desenvolveram os
fatos criminosos também são desfavoráveis a Luiz Inácio Lula da Silva.
Como dito, os crimes ora examinados foram altamente sofisticados,
ocorreram por anos, mediante engenhoso esquema para ocultar a
propriedade da vantagem indevida atribuída ao requerente."
A defesa contestou essa condenação no próprio TRF-4 e pediu para o
recurso ser julgado pelo STF, porque o caso conteria fatos
constitucionais a serem considerados. Como o TRF-4 estava demorando para
analisar se mandaria ou não o recurso para o STF, a defesa pediu ao
próprio STF conceder efeito suspensivo da condenação até o julgamento do
recurso. Nesse recurso, os advogados pediam para Lula ser libertado e
também para poder se candidatar.
Mas, depois disso, o TRF-4 acabou negando o pedido de Lula para ter o
recurso enviado para o STF. Como o caso não chegaria mais à Corte,
Fachin anulou o julgamento inicialmente marcado para 26 de junho na
Segunda Turma da Corte. A defesa recorreu contra a decisão de Fachin,
argumentando que também recorreu da decisão do TRF-4. Por isso, ainda
haveria esperança de o recurso chegar ao STF, se o TRF-4 aceitasse novos
argumentos dos advogados.
Fachin concordou com a argumentação, mas decidiu que o julgamento não
seria mais na Segunda Turma, composta por cinco ministros, mas no
plenário, do qual participam todos os 11 integrantes da Corte. A
expectativa é que a defesa de Lula tenha mais dificuldades no plenário
do que na Segunda Turma.
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