por Carlos Alberto Sardenberg
Iniciado o ano eleitoral de 2002, o dólar estava na casa de R$ 2,30.
Oscilou bastante desde então, mas sempre em tendência de alta. Em julho,
bateu e superou os R$ 3. No fim de setembro e início de outubro, foi
negociado em alguns momentos acima dos R$ 4.
Era o medo de Lula. Ao longo do ano, ficou claro que Lula seria eleito
presidente — e tudo que o PT falava de política econômica indicava um
desmonte do real, mais calotes na dívida externa e interna. Logo, o
negócio era comprar dólares e, quem podia, deixar o mercado local.
Foi quando Lula assinou a Carta ao Povo Brasileiro, comprometendo-se a
manter toda a política do real. Ou seja, prometeu ser ortodoxo em
economia, e Antonio Palocci circulava pelos mercados jurando que seria
assim.
A mensagem pegou, e a prática do primeiro governo Lula, com a equipe
econômica mais ortodoxa da história recente, manteve a estabilidade das
regras e dos contratos.
Nisso, Lula iniciou seu governo com a moeda americana a R$ 3,50. No fim
do primeiro ano, já estava na casa de R$ 2,80. Concluído o primeiro
mandato, dezembro de 2006, o dólar estava valendo R$ 2,13. Para encurtar
a história, no fim do segundo mandato, dezembro de 2010, a dólar valia
um ridículo R$ 1,66.
Era a farra das viagens internacionais (a bolsa Miami), o consumo acelerado, Lula pai dos pobres e eleitor do poste Dilma.
Não foi apenas a política econômica, claro. Os países emergentes tiveram
uma década de ouro. Preços das commodities (petróleo, minério de ferro,
alimentos, como a soja) dispararam com o crescimento mundial e,
especialmente, com a demanda chinesa. Com as taxas de juros muito baixas
nos países desenvolvidos, investidores buscaram negócios no mais
arriscado porém mais rentável mundo emergente. Choveram dólares neste
lado do mundo, as moedas locais se valorizaram, dando aquela sensação de
riqueza.
A indústria, o agronegócio e todos os produtores nacionais odiavam a taxa de câmbio, mas os consumidores estavam adorando.
Aí vieram a era Dilma e a nova matriz. Tendo iniciado com o dólar bem
abaixo de R$ 2, a ex-presidente deixou o poder com a moeda americana
acima de R$ 3,50, tendo batido nos R$ 4 em alguns momentos.
Agora, estamos de novo em ano eleitoral, Lula está de novo na parada, de
um modo ou de outro, e o dólar voltou aos R$ 4. Está passando disso.
Mas a história hoje é diferente. Primeiro, os R$ 4 de 2002 valiam mais.
Fazendo um cálculo simples, considerando a inflação brasileira e a
americana, a taxa de câmbio equivalente seria hoje de R$ 7,20 por dólar.
Comparando, pois, com o ambiente de 2002, o dólar hoje a R$ 4 está,
digamos, barato.
O estresse eleitoral é intenso, como antes. Mas há uma diferença enorme
nas contas externas. Em 2002, o Brasil era devedor em dólares. Hoje, é
credor — quer dizer que as reservas, US$ 380 bilhões, são superiores ao
total da dívida externa e muito mais que a dívida externa pública. Além
disso, o comércio externo tem saldo positivo, graças à recuperação dos
preços de commodities.
O problema do país está no desastre das contas públicas e isso explica
boa parte da falta de confiança. Mas não há falta de dólares.
A subida da moeda americana se explica, de um lado, pela alta dos juros nos EUA e, de outro, pela incerteza eleitoral.
Contra a alta de juros lá, não há o que fazer a não ser adaptar-se. E a
incerteza eleitoral, bem está aí — e só vai passar quando despontar um
candidato com uma política econômica clássica e voltada para o controle
das contas públicas.
Mas, acreditem, dólar a quatro, hoje, é menos complicado do que parece.
‘Competitivo’
Alguns candidatos, como Ciro e Haddad, pregam uma taxa de câmbio
competitiva. Eles não dizem, mas isso quer dizer dólar caro ou real
desvalorizado, para ajudar a produção local.
É curioso que o PT volte a isso, à heterodoxia, quando o sucesso de Lula
foi justamente o dólar baratinho, o real superforte, que deu aquela
inesquecível sensação de bem-estar. O que também explica os 39%.
O Globo
extraídaderota2014blogspot
0 comments:
Postar um comentário