Jornalista Andrade Junior

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Mandar o embaixador de volta a Tel-Aviv



Carlos Chagas
Como em qualquer jogo, valendo para começar a citação do xadrez, é preciso pensar vários lances adiante. Por haver entendido como inaceitável a escalada da violência e desproporcional o massacre de civis na Faixa de Gaza, promovidos por Israel, o Brasil mandou chamar seu embaixador em Tel-Aviv, Henrique Sardinha, e votou no Conselho de Segurança das Nações Unidas por uma investigação internacional a respeito do conflito. O único voto contrario foi dos Estados Unidos.
Imediatamente, o governo israelense retaliou, ainda que em nível inferior. O porta-voz do ministério das Relações Exteriores, Yigal Palmor, por certo cumprindo ordens de cima, declarou “ser o Brasil um pais anão, politicamente irrelevante, apesar de um gigante econômico”. Demonstrando ignorância e grosseria, lembrou que “desproporcional foi a derrota do selecionado brasileiro por 7 a 1 para o selecionado alemão”.
Nosso ministro do Exterior, Luís Alberto Figueiredo, respondeu que recebemos com indignação aqueles comentários, porque país anão não somos. O assessor especial da presidência da República, Marco Aurélio Garcia, caracterizou como genocídio o que acontece na Faixa de Gaza, com mais de 800 palestinos mortos, inclusive mulheres e crianças, por bombardeios indiscriminados na região. Parece que a presidente Dilma mandou que ficasse quieto. Através da imprensa, o governo de Israel justifica sua ação pelo fato de nas duas últimas semanas perto de 2 mil mísseis terem sido lançados de Gaza para o seu território, mesmo neutralizados esses petardos, matando um cidadão israelense. Isso por conta de um sistema antimísseis desenvolvido por eles.
ALGUMAS DÚVIDAS
Assim está disposto o tabuleiro onde se aguardam, agora, os próximos lances. Por isso, é preciso pensar antes de mexer as peças. Para começar, algumas duvidas:
Como os responsáveis pela Faixa de Gaza, aprisionados e vigiados por Israel e geridos pelo Hamas, movimento que domina a região enclausurada, conseguiram dispor dos pelo menos 2 mil mísseis acionados nas últimas duas semanas contra o território judeu? Mesmo rudimentares, teriam sido fabricados fora do território palestino, presumindo-se que estejam sendo repostos.
Por quem foram doados e por onde entraram? Pode ter sido pela Síria, atualmente em guerra civil, ou pelo Irã, quem sabe pelo Egito, mas um sistema tão avançado de inteligência como o de Israel até agora não conseguiu identificar e interromper esse fluxo macabro? Muito mais difícil foi descobrir e seqüestrar Adolf Eichemann ou bombardear as usinas nucleares do falecido Saddam Hussein.
Mais ainda: a profusão de túneis construídos pelo Hamás, em Gaza, estendendo-se pelo chão de Israel, só agora foram detectados?
MAIS PROFUNDO
Algo de muito mais profundo do que os túneis deve estar acontecendo. Negando-se a reconhecer um estado palestino, Israel pretende eternizar a condição subalterna de um povo que tem todo o direito a ser independente na região onde seus ancestrais viveram há séculos? Claro que Israel tem os mesmos direitos, especialmente os de sobrevivência, durante tanto tempo ameaçada, mas será massacrando os vizinhos com tanques e aviões de última geração que preservarão essa prerrogativa? E os vizinhos, apelando para mísseis de origem desconhecida? Ou aguardando novas e letais doações?
Tem alguma ou muita coisa errada nesse entrevero. No mínimo quatro mil anos de conflitos e confrontos. Antes de replicar comentários impertinentes e desimportantes de subalternos arrogantes e apavorados como o tal porta-voz israelense, torna-se necessário mandar de volta a Tel-Aviv o nosso embaixador. Mais do que um gesto de boa vontade, seria uma iniciativa de bom-senso. Nunca irrelevante. Mais ou menos como o dever deste repórter, que desde 1958 jamais fugiu de analisar questões tão controversas e intrincadas como essa. Análises que certamente despertarão, como outras da mesma forma incompreendidas, montes de reprimendas e agressões.

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