Deterioração das relações entre o PT e movimentos sociais leva o governo a enfrentar uma onda de protestos e greves pelo País. Dilma teme que mobilizações, engrossadas por oportunistas, se intensifiquem durante a Copa e prejudiquem a reeleição.
O governo respirou aliviado na quinta-feira 15 quando fez um balanço
das greves e manifestações do dia. Ao contrário da ameaça de centrais
sindicais e movimentos populares de colocarem milhões de manifestantes
nas ruas e paralisarem centenas de categorias pelo País, os protestos
ficaram aquém da expectativa. A barganha às vésperas da Copa do Mundo,
que misturou de velhas demandas a mobilizações oportunistas, parece não
ter conquistado ainda o apoio necessário para inundar as ruas, como seus
líderes desejavam. Apesar do respiro momentâneo, o governo atravessou a
última semana com uma certeza e um caminho a seguir na tentativa de
debelar futuras ameaças de paralisações e protestos. A certeza é de que a
gestão de Dilma perdeu o controle e a influência exercida desde o
governo Lula sobre os movimentos sociais, como os por moradia e de
trabalhadores, historicamente ligados ao PT. Não à toa, em Belo
Horizonte, servidores públicos municipais cruzaram os braços e, em
Pernambuco, instalou-se um clima de pânico com a greve de integrantes da
Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros. Em meio à atmosfera
beligerante, tanques do Exército ocuparam as ruas no Recife. Em São
Paulo, movimentos por moradia e grevistas pararam avenidas importantes
da capital...
O CLIMA ESQUENTOU
Em São Paulo, integrantes do movimento dos sem-teto protestaram em frente ao Itaquerão, ateando fogo em pneus.
Diferentemente das manifestações de junho, porém, quando as depredações
e os protestos foram encabeçados por movimentos anarquistas, os
chamados Black Blocs, com os quais o Planalto não conseguia estabelecer
um diálogo, o governo desta vez terá caminhos e maneiras de retomar o
canal de comunicação com os manifestantes. Para a sorte da presidenta,
ao contrário do ano passado, os atuais manifestantes possuem líderes
dispostos a sentar à mesa de negociações.
O que eles esperam é uma mudança de postura do governo. Ao contrário de
Lula, que mantinha um canal direto com as lideranças sociais, Dilma
relegou os movimentos a segundo plano. Nos bastidores, dirigentes de
centrais sindicais reclamam que a presidenta mostra-se pouco disposta ao
diálogo e age de maneira intransigente diante de pautas de
reivindicações. Esse alegado descaso fez com que até a Central Única dos
Trabalhadores (CUT), braço sindical do PT, chegasse a reclamar do
governo durante a greve de servidores federais em 2012. Já a Força
Sindical, segunda maior central do País, passou de aliada de primeira
hora a ferrenha opositora de Dilma, sendo uma das articuladoras da onda
de greves, em que propaga críticas também à área econômica da gestão
federal. “Este governo não atende os trabalhadores”, reclama o
presidente da Força Sindical, Miguel Torres, cotado para vice na chapa
de Aécio Neves (PSDB) ao Planalto. “Por isso, continuaremos nas ruas
dispostos a influenciar, mais uma vez, os destinos do País”, diz ele.
Dirigentes petistas reclamam que Dilma, logo após assumir, desmontou um
poderoso aparato que servia como espécie de termômetro dos movimentos
sociais no governo Lula. Com larga experiência nas organizações de
trabalhadores, o ex-presidente havia nomeado para cargos na máquina
federal ex-dirigentes da CUT. Eles tinham, na prática, a função de atuar
junto a movimentos estratégicos contornando crises ou alertando o
Palácio do Planalto sobre eventuais focos de insatisfação. Sem esse
mecanismo, a presidenta acabou sendo pega de surpresa em greves de
servidores e nas manifestações de junho.
Para sindicalistas e até integrantes do governo, as paralisações
poderão se intensificar dias antes do início da Copa do Mundo. De acordo
com uma estimativa da Central Sindical e Popular (CSP-Conlutas), cerca
de um milhão de trabalhadores irão às ruas, nos próximos dois meses, em
todos os Estados. Já a Força Sindical calcula que quatro milhões de
trabalhadores se mobilizarão por melhorias salariais e condições de
trabalho. A coincidência entre o período da Copa do Mundo e a data-base
(negociações salariais) de importantes categorias, além do momento
eleitoral, deu um forte poder de barganha aos trabalhadores. “É uma
janela de oportunidade”, diz Ricardo Patah, presidente da União Geral
dos Trabalhadores (UGT), referindo-se às vantagens de se negociar quando
do outro lado há o temor de que ocorram greves que prejudiquem o evento
ou mobilizações que atraiam a atenção da imprensa internacional. Outras
nações que sediaram os grandes eventos esportivos também registraram
ameaças de greve. Às vésperas da Copa do Mundo de 2010, por exemplo, o
governo sul-africano enfrentou paralisações até de centrais sindicais
historicamente aliadas. No Reino Unido, os trabalhadores da área de
serviços públicos também ensaiaram uma greve antes dos jogos olímpicos
de 2012.
Pressionados pelos sindicalistas e pelos movimentos sociais, a
presidenta Dilma e seus auxiliares tentam sufocar essas ações de todas
as formas. Nas últimas semanas, o governo acionou a Justiça para isolar
uma possível paralisação na Polícia Federal durante a Copa do Mundo, num
movimento estranho à história do PT. Obteve uma liminar, que multa a
representação da categoria em R$ 200 mil por dia de greve e proíbe os
policiais de adotarem a chamada operação-padrão ou qualquer “outra ação
organizada que, direta ou indiretamente, venha a interferir nas rotinas,
condutas e nos protocolos estabelecidos e normalmente adotados, no
âmbito interno e no tratamento ao público”. Só que, em vez de intimidar a
categoria, a medida piorou a relação entre os policiais e o governo.
“Se não tivermos nenhuma resposta positiva do governo, paramos na Copa.
Isso vai afetar principalmente os aeroportos, por onde poderão conseguir
passar procurados pela Interpol, terroristas e outro tipo de gente que
não queremos aqui”, declarou André Mello, presidente do sindicado dos
servidores da Polícia Federal no Rio de Janeiro.
Em entrevista às páginas vermelhas de ISTOÉ nesta edição, o ministro da
Justiça, José Eduardo Cardozo, diz acreditar que, a despeito do clima
adverso, haverá “tranquilidade” para a realização dos Jogos. “Se houver
problemas, a Polícia Federal estará preparada”, afirmou. O principal
objetivo do governo, no curto prazo, é evitar a todo custo possíveis
protestos no dia 12 de junho, data do jogo de abertura da Copa, quando
movimentos sociais articulam uma série de manifestações simultâneas no
Brasil e no Exterior. A conferir se até lá os canais de comunicação com
setores historicamente ligados ao PT serão desobstruídos.
Fonte: Revista Istoé -
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