Jornalista Andrade Junior

sábado, 28 de dezembro de 2013

Tragédia repetida e anunciada - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR


GAZETA DO POVO - PR -

Recursos para prevenir catástrofes existem; faltam planejamento e capacidade gerencial. Sem isso, presidentes seguirão apenas fazendo sobrevoos inócuos e liberando verbas para consertar estragos, ano após ano


Já se conta em mais de 40 o número de mortes provocadas pelas grandes enchentes e deslizamentos de terra que afetam, neste início de verão, Espírito Santo e Minas Gerais; são milhares os desabrigados em dezenas de municípios dos dois estados. É a tragédia que se repete todos os anos, sempre nos meses de verão, assim como se repetem também as velhas cenas televisivas mostrando autoridades compungidas em visitas (que muitas vezes se resumem a um seguro sobrevoo de helicóptero, sem nem mesmo algum contato mais próximo com as pessoas atingidas) às áreas inundadas – a começar, sempre, pelo presidente da República. Dilma Rousseff, por exemplo, já apareceu nestas imagens três vezes em três anos de mandato.

Anúncios de ajudas emergenciais para atendimento às vítimas são os de rotina, como são igualmente rotineiras as promessas de que medidas de prevenção serão tomadas com rigor para que as calamidades não se repitam no futuro. Milhões de reais dos cofres públicos são liberados, e outros tantos incluídos nos próximos orçamentos.

E, no entanto, tudo continua igual, cansativamente ano após ano, seja nos dois estados do momento, seja em outros, quem sabe nas próximas semanas ou meses. Essa situação reflete quase todos os males de que sofre a administração pública brasileira. Não faltam recursos, como demonstram os levantamentos contábeis que mostram, por exemplo, que o governo federal reservou no ano passado nada menos de R$ 5,7 bilhões para prevenção de catástrofes, mas apenas R$ 1,8 bilhão foi efetivamente gasto. Falta é agilidade para elaborar projetos e capacidade gerencial. E sobram burocracia e, pior, muita corrupção.

O site Contas Abertas, que levantou o dado anterior, divulgou ontem que o Espírito Santo ficou com apenas 0,4% da verba nacional destinada a prevenção e recuperação de locais atingidos por desastres naturais até o dia 24 (R$ 13,6 milhões de um total de R$ 3,3 bilhões). Ainda segundo o Contas Abertas, considerando programas governamentais anteriores, R$ 60 milhões destinados ao Espírito Santo nem foram sacados. Uma obra no Canal do Congo, cujo convênio foi assinado em dezembro de 2009, só começou a ser executada no fim deste ano – o canal transbordou na semana passada.

É evidente que todo exercício de previsão apresenta falhas. Nem sempre as áreas mais sujeitas a desmoronamentos e soterramentos são as mais atingidas, como agora aconteceu no Espírito Santo. O governador capixaba, Renato Casagrande, lembrou que desta vez mesmo regiões que eram consideradas de baixíssimo risco de inundação ou desabamento (e, por isso, dificilmente constariam de quaisquer projetos de prevenção) também foram fortemente afetadas. Mas seria importante que o governador se lembrasse da regra e não da exceção, já que as áreas mais sofridas de seu estado são exatamente as mesmas há muito identificadas como propensas aos efeitos do excesso de chuvas.

Se no momento podemos sentir o drama de capixabas e mineiros apenas pelas imagens que a televisão nos mostra, é bom lembrar que o Paraná também não está imune a tragédias semelhantes. Não se pode esquecer do carnaval de 2011, quando chuvas intensas atingiram a Serra do Mar e levaram de roldão encostas, casas, pequenas lavouras, pontes e estradas. Cidades como Morretes foram inundadas e sofreram prejuízos enormes. Verbas foram oferecidas tão logo foi decretado o estado de calamidade – no entanto, acabaram perdidas porque nem projetos, nem obras de contenção e recuperação foram realizados a tempo.

Casos como esses são emblemáticos da ineficiência do Estado. Prevenir é melhor que remediar, diz a sabedoria popular – mas nem se previne a contento e a tempo, nem se remedeia depois o estrago e seus rastros. O mínimo que se pode dizer de atitudes lenientes das autoridades diante dos abalos naturais é de que nem sequer se preocupam com o principal – com a vida humana em permanente risco.

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