Há cinco anos, o ‘NY Times’ não sugeriria aos turistas estrangeiros hospedarem-se em quartos compartilhados de lugares como a Rocinha durante a Copa do Mundo
Trata-se de um neologismo, uma importação inglesa que ainda não consta de nossos dicionários, mas que tem frequentado o debate de urbanistas e arquitetos sobre favelas. O termo significa algo como “enobrecimento” e ocorre quando os efeitos colaterais desse processo — valorização do espaço e das construções, aumento dos aluguéis e bens de serviço — empurram os moradores tradicionais para mais longe, substituindo-os por outros de maior poder aquisitivo. Mais ou menos o que está ocorrendo depois que as UPPs ocuparam uma centena de comunidades. Há cinco anos, o “NY Times” não sugeriria aos turistas estrangeiros hospedarem-se em quartos compartilhados de lugares como a Rocinha durante a Copa do Mundo. Se por um lado o fenômeno de revitalização estimula a economia local, oferecendo novas oportunidades na área do comércio — abertura de lojas, pensões e restaurantes —, por outro produz um aumento no custo de vida que atinge as camadas mais pobres.
Esse processo de duas faces ocorre ou ocorreu em várias metrópoles, como Paris, por exemplo, para só citar o plano do Barão de Haussman, que inspirou a grande reforma urbanística de Pereira Passos no Rio, o Bota-Abaixo, que expulsou a população do Centro para o Morro do Livramento. O Trio de Ouro recebeu com resignação a Presidente Vargas, cantando: “Lá vem a nova Avenida/Remodelando a cidade/Rompendo prédios e ruas/Nosso patrimônio de saudade./É o progresso e o progresso é natural.” A discussão continua. Será natural o progresso de consequências nocivas para os moradores? Como avançar sem destruir patrimônios de saudade? Pode-se alegar que, se não fosse assim, o Rio não teria removido sua degradada herança colonial. Mas pode-se argumentar também que foi por causa dessa visão excludente que surgiu um problema cuja solução ainda desafia as autoridades, o das nossas favelas.
Hoje, de certa maneira, a gentrificação está ocorrendo também em bairros “nobres”, variando apenas de grau. Em Ipanema e Leblon, por exemplo, a prefeitura teve que baixar decreto para impedir a descaracterização de suas identidades, limitando o licenciamento de agências bancárias e farmácias. Estas então são tantas (alguém contou 13 só na Visconde de Pirajá, próxima uma da outra) que o templo da boêmia de Tom e Vinicius parece ser agora dos hipocondríacos. Enquanto isso, as padarias estão desaparecendo. Esta semana a Martinica fechou as portas, o que já tinha acontecido há tempos com a Eldorado. Resta a da Visconde de Pirajá com Joana Angélica, que pode ter o mesmo fim. Especula-se que no terreno, junto com o da vizinha Chaika, que não existe mais, será construído um shopping.
Símbolos dessa mudança de usos e costumes é o fechamento das livrarias Letras & Expressões, em Ipanema e Leblon, para dar lugar a duas drogarias. Em vez de livros, drogas — lícitas, bem entendido, mas de qualquer maneira drogas.
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