por Zeina Latif
Não há como saber onde estaria o país se Dilma fosse presidente.
Precipício talvez seja uma boa imagem. Afastar o risco de uma crise mais
prolongada foi importante conquista. E apesar do quadro econômico ainda
frágil, a confiança, aos poucos, melhora.
É provável que eventos recentes, como a greve dos caminhoneiros, limitem
transitoriamente a recuperação da confiança da sociedade. Importante,
porém, registrar que as ruas estão calmas. E assim ficaram mesmo com a
paralisação. A inflação baixa e a geração de empregos com carteira,
mesmo modesta, provavelmente explicam esse quadro. O nervosismo é do
mercado financeiro, não da sociedade.
Houve geração líquida de quase 197 mil empregos com carteira nos últimos
12 meses terminados em abril, pelos dados do Caged (curiosamente não
capturada pela Pnad do IBGE). Como reflexo, a confiança dos consumidores
segue tendência de alta, bem como as vendas do varejo. As dívidas em
atraso dos consumidores e o comprometimento da renda com pagamento de
dívida bancária recuam.
O quadro geral continuará sendo de recuperação, ainda que o impacto da
greve seja bastante relevante e a pressão cambial tenha efeito
contracionista na atividade no curto e médio prazos. Há muito efeito de
corte de juros ainda a se materializar, cujo impacto máximo na economia
ocorre depois de um ano.
Certamente, a recuperação poderia estar sendo mais rápida. Se, por um
lado, a política propiciou a reorientação da política econômica e a
aprovação de importantes reformas, com autonomia do time econômico, por
outro, o enfraquecimento do governo, desde as denúncias contra Temer,
cobra seu preço.
Grupos de interesse aproveitam a situação para bloquear a agenda de
reformas e maximizar seus ganhos. Isso ajuda a explicar a não aprovação
da reforma da Previdência, que sofreu resistência da elite do
funcionalismo. O governo também sofreu derrotas, como, por exemplo, a
derrubada de vetos do presidente ao Funrural e ao Refis para empresas do
Simples pelo Congresso, dentre muitas outras. Essas derrotas dão uma
noção da pressão de todos os lados, do setor privado e de políticos,
sobre a Fazenda, que não mais conta com a mesma linha de defesa do
governo.
Curioso que alguns analistas, como Fernando Limongi, equivocadamente
afirmam que a agenda reformista não encontrou resistências no Congresso.
Felizmente, há restrições legais que limitam o poder discricionário para
aumentar gastos e renúncias tributárias. E o Tribunal de Contas da
União está atento. Exemplos recentes foram o alerta do ministro da
Fazenda sobre os limites para o subsídio ao diesel, em função da Lei de
Responsabilidade Fiscal, e a decisão do Tribunal de Contas da União
(TCU) de cobrar do governo que se manifeste sobre os riscos que a
derrubada dos vetos citados acima acarretam sobre as contas públicas.
As amarras legais que disciplinam o Orçamento público devem ser vistas
como aliadas do governo, dada a necessidade urgente de se ajustar as
contas públicas, e não como restrições a serem eliminadas.
Se o próximo presidente tentar flexibilizar a regra do teto, sem antes
aprovar uma boa reforma da Previdência e conquistar reputação
reformista, poderá estar cometendo um grande equívoco. Seria um mau uso
do capital político o próximo presidente inverter a ordem de prioridade
de reformas. Pode correr o risco de pouco entregar.
Nesse sentido, as manifestações de alguns candidatos preocupam. Ciro tem
dado ênfase na proposta de flexibilização da regra do teto e no aumento
de impostos, e, curiosamente, não no corte de despesas e na reforma
tributária. Bolsonaro não se manifesta. Marina não diz o que fará, mas
critica a regra do teto, sem entendê-la aparentemente, pois afirma
equivocadamente que a regra congela os gastos públicos por 20 anos.
Alckmin faz restrições à regra, mas não pretende alterá-la.
Vamos torcer para o próximo presidente ter um time econômico tão bom quanto o atual.
ECONOMISTA-CHEFE DA XP INVESTIMENTOS
O Estado de São Paulo
extraídaderota2014blogspot
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