EDITORIAL O ESTADÃO
Voltando-se no tempo, dá-se conta dos grandes obstáculos que se interpunham à retomada da economia. Só neste ano houve a revelação do conteúdo da delação da Odebrecht, que originou a famosa lista de Fachin, depois veio a delação de Joesley Batista, com as investidas do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra o presidente Michel Temer, e, mais recentemente, revelou-se a colaboração de Lúcio Funaro. Pois bem, o País viveu tudo isso num curto período, que culminou, para a surpresa de muitos, com a proliferação de sinais de recuperação econômica, de melhora do mercado de trabalho e de fortalecimento do consumo. Também é possível vislumbrar um horizonte institucional menos conturbado, especialmente depois da troca de comando na Procuradoria-Geral da República.
Essas novas condições precisam ser preservadas. Há muito o País ansiava por um ambiente de normalidade, que parecia se tornar cada vez mais distante, para não dizer impossível. Periodicamente, surgia uma nova delação, ou uma nova interpretação de delação, desconstruindo a tão sonhada normalidade, que é muito mais do que um simples desejo de uma parcela da população. É condição necessária para o desenvolvimento econômico e social.
Ainda há, naturalmente, nuvens carregadas no horizonte do País, o que demanda especial prudência por parte das autoridades. Mais do que nunca, o País necessita de um Ministério Público centrado em sua missão constitucional de defender a ordem jurídica. É preciso resgatar a finalidade original da colaboração premiada. O material colhido nas delações deve deixar de ser usado como pólvora de novos escândalos, muitos deles artificiais, para ser aproveitado como ponto de partida de muitas investigações. Também não há lugar na vida pública para o messianismo de alguns procuradores.
O Supremo Tribunal Federal (STF) tem também papel fundamental nesse trabalho de normalizar o ambiente institucional do País. É hora de rejeitar a tentação do personalismo e das interpretações alternativas. Em vez de retardarem o desenvolvimento econômico e social, os ministros da Suprema Corte devem assegurar as condições para a vigorosa normalização da vida nacional, mantendo os pés firmes no bom Direito, abdicando de qualquer pretensão de criar a lei ideal para ser tão somente seu mais fiel intérprete. Além de contribuir para o bom ambiente econômico – afinal, insegurança jurídica afasta investimentos –, só um STF alinhado com suas funções constitucionais poderá dirimir com acerto as importantes questões penais de sua competência. Depois de tantas notícias de autoridades envolvidas em práticas criminosas, é hora de identificar as provas, punir os culpados e absolver os inocentes, numa demonstração de que é possível combater a impunidade respeitando as garantias processuais.
Logicamente, o ambiente mais desanuviado também traz à tona a responsabilidade do Executivo e do Legislativo na aprovação das necessárias reformas, especialmente a previdenciária, a tributária e, no que ainda for possível, a política. Se o Congresso não fizer sua parte, os sinais positivos da economia podem se converter em luzes efêmeras. Sem um ajuste estrutural das contas públicas, só possível com a reforma da Previdência, não há alicerce seguro para a retomada da economia e do emprego. O cumprimento pelo Congresso de sua parcela de responsabilidade na reconstrução do País será também a resposta mais contundente e mais efetiva aos que tentam equivocadamente inserir todos os políticos no balaio dos corruptos.
Os tempos atuais oferecem oportunidades que há muito estavam desaparecidas. Convém não desperdiçá-las.
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