EDITORIAL O ESTADÃO
A resposta a essa pergunta deve ser pouco animadora, a julgar pela experiência brasileira. Usos e costumes considerados normais em Brasília estabelecem uma interessante divisão de responsabilidades quanto às finanças oficiais. Segundo essa divisão, buscar o equilíbrio entre receita e despesa e velar pela saúde fiscal são atribuições do Tesouro, isto é, do Executivo, ou, no limite, da equipe econômica. Não cabe aos membros do Legislativo e do Judiciário preocupar-se com esses detalhes mesquinhos.
É fácil observar no dia a dia como se manifesta, na prática, essa concepção. As tentativas permanentes de encontrar exceções ao teto dos vencimentos são um exemplo fácil. A defesa acirrada de mordomias e do uso sem controle de verbas complementares aos salários também é assunto frequente do noticiário. Além disso, tem sido parte da rotina, há muitos anos, a revisão, sempre para cima, da receita estimada no projeto da lei orçamentária. Nem seria preciso mencionar aberrações como o fundo eleitoral e o próprio fundo partidário, existente há muito tempo.
Quem converte essas barbaridades em rotina e até em parte de um suposto ordenamento democrático chegará a se preocupar com uma distorção tão abstrata na aparência – o endividamento para cobertura de gastos de custeio? Haverá uma enorme surpresa se os fatos indicarem uma resposta positiva.
O próprio Mansueto Almeida tratou de atenuar a hipótese de violação da regra de ouro. Membros da equipe econômica, segundo ele, farão certamente o possível para evitar o risco de uma punição. Mas, para isso, é preciso acrescentar, poderão ser forçados a medidas muito duras para o País, ou, em termos mais concretos, para milhões de pessoas dependentes de certos serviços públicos.
Desastres financeiros podem ser produzidos por erros do Executivo, mas também podem resultar da omissão ou das perversões dos demais Poderes, especialmente do Legislativo. A dívida pública brasileira cresce de forma insustentável, lembrou Mansueto Almeida, e esse fenômeno está associado ao evidente descompasso entre despesas e receitas. Gastos incomprimíveis continuam crescendo mais rapidamente que a arrecadação e isso continuará mesmo se a reativação da economia gerar mais impostos e contribuições. Essa reativação poderá acelerar-se nos próximos dois anos, mas o ritmo do crescimento econômico será severamente limitado por fatores estruturais.
Um desses fatores é o dinamismo das despesas incomprimíveis, a começar pelos gastos previdenciários. Muito mais que iniciativa de um governo, essa reforma é um projeto de Estado, segundo o secretário de Acompanhamento Econômico. Ou, numa linguagem menos entusiasmada, assim deveriam entendê-lo. Se esse projeto ainda estiver em tramitação em 2019, o próximo governo, também de acordo com Mansueto Almeida, será forçado a trabalhar por sua aprovação. Não terá escolha. Mas o presidente da República terá, mesmo, consciência disso? Melhor, por muito mais de uma razão, é tentar garantir essa aprovação neste mandato, no menor prazo possível. Para isso, bastará mobilizar um número suficiente de parlamentares capazes de pensar nos interesses básicos do País, a mais importante regra de ouro. Tarefa simples?
extraidadeavarandablogspot
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