Despindo um santo para vestir outro - ROBERTO FENDT
O ESTADÃO -
Há a um evidente
desconforto com o rumo que está tomando o comércio exterior neste ano.
Nos primeiros cinco meses de 2013, as exportações estão em queda,
relativamente ao mesmo período do ano passado. Pior: estão em queda
tanto os preços como as quantidades exportadas, E estão em queda tanto
as vendas de manufaturados como as exportações de produtos básicos e
semi-manufaturados. Do lado das importações, os valores são recordes
para a última década A expectativa corrente, e de um saldo da ordem de
US$ 6 bilhões este ano, comparado com valores da ordem de US$ 30 bilhões
em 2011 e US$ 20 bilhões em 2012.
Alguém poderá alegar que
esses resultados são transitórios e explicáveis por fatores
conjunturais que estão afetando nosso comércio exterior somente no curto
prazo. Entre esses fatores, a expansão da liquidez internacional teve
como principal efeito a valorização das moedas da maioria dos países
emergentes. Essa valorização penalizou as exportações e incentivou as
importações, deteriorando o saldo comercial. Também se poderá atribuir
parte da queda das nossas exportações à desaceleração do crescimento da
economia chinesa. Tudo isso é verdadeiro, exceto a conclusão de que os
efeitos negativos serão passageiros e que não afetarão a inserção
competitiva da produção nacional nas cadeias internacionais de valor.
Infelizmente, nos entraves estruturais à inserção competitiva do Brasil
residem as maiores ameaças que enfrentaremos no futuro.
Ao longo das últimas
décadas, as trocas internacionais, dominadas pelo comércio de bens
finais, foram se transmutando gradualmente para uma participação
crescente de partes, peças e componentes no total dos fluxos de
comércio. Essa mudança ocorreu pelo aumento do comércio intrafirmas,
entre partes relacionadas e dentro de cadeias produtivas. Contribuíram
para esses desenvolvimentos as expressivas reduções nos custos de
transporte e das comunicações. O resultado final foi uma crescente
desagregação e dispersão geográfica da produção.
Grandes mercados
internos, um dos principais ativos das economias espacialmente maiores,
vão perdendo importância à medida que cresce a interdependência dos
processos produtivos e o; acesso ao maior dos mercados, o mercado
internacional.
É o reconhecimento
desses fatos novos que levou a China a buscar integrar-se às cadeias de
valor internacional. O grande salto para a frente da economia chinesa
baseia-se na rejeição do modelo autárquico de desenvolvimento em favor
da alternativa de inserção competitiva no comércio internacional
contemporâneo. Seu desenvolvimento é orientado para e pelo mercado
externo e voltado para a exportação.
Infelizmente, estamos na
contramão dessas tendências. Está em vigor desde outubro do ano passado
a Resolução Camex n.° 70, que determina o aumento temporário da
alíquota do imposto de importação para 100 itens produzidos no País. Por
decisão da Comissão de Comércio do Mercosul (CCM39/11), o Brasil foi
formalmente autorizado a adotar a medida. Pleiteia-se agora, a ampliação
da medida para outros 100 itens da pauta de importação.
O objetivo apontado da
medida foi o permitir uma maior margem de manobra para lidar com a crise
econômica internacional. Ocorre que o grupo de 100 itens que sofreram
aumento de tarifas incluiu insumos, bens intermediários e também bens de
capital e suas partes. Segundo a Abiplast, o aumento da tarifa de
importação sobre insumos já pressiona o custo de produção e tirou a
competitividade da indústria doméstica. O mesmo está se passando em
outros segmentos de nossa indústria.
Reconhece-se que a
proteção deve ser temporária para não resultar em falta de eficiência e
dê competitividade. Mas o País tem uma longa tradição de medidas
transitórias que se eternizam, penalizando a inserção das empresas
brasileiras nas cadeias internacionais de valor. Medidas dessa natureza
abrem perigoso precedente. Elas têm claro caráter protecionista e, como
tal, despem um santo para vestir outro. No longo prazo, pela
ineficiência que geram, prejudicam a todos. Especialmente os
consumidores, os ignorados em todos os processos protecionistas.
0 comments:
Postar um comentário