Jornalista Andrade Junior

segunda-feira, 29 de julho de 2013

A janela do amanhã

A janela do amanhã - GAUDÊNCIO TORQUATO

ESTADÃO -

Ao lembrar que a juventude é a “janela pela qual o futuro entra no mundo”, no discurso que abriu sua agenda no país, o papa Francisco quis ressaltar o motivo de sua peregrinação –presença na Jornada Mundial da Juventude – e também alertar os políticos que aos jovens devem ser dadas condições para exercer de maneira condigna seu papel na sociedade. Foi bastante claro: “a nossa geração se demonstrará à altura da promessa contida em cada jovem quando souber abrir-lhe espaço”. Um recado adequado no momento oportuno para a platéia certa. A população jovem brasileira soma 51 milhões de pessoas – 10 milhões entre 15 a 17 anos, 23,1 milhões entre 18 a 24 anos e 17,5 milhões entre 25 a 29 anos – sendo, nos últimos tempos, o motor da mobilização social nas grandes e médias cidades do país. Como agrupamento mais descontente com a classe política, desfralda o simbolismo citado pelo carismático pontífice para fustigar as fortalezas do poder e, à sua maneira, aplainar os caminhos de um amanhã que se lhe apresenta sombrio, uma existência que ameaça ser mais sofrida que a de seus pais.

"O segmento jovem, ademais, é o que possui visão mais pragmática da política e entende que esta se desvia de sua finalidade básica, atender ao bem comum.”

O fato é que aos jovens não tem sido oferecido espaço para participação mais efetiva no processo político-institucional. Não que lhes seja tolhido o direito de ingressar na vida pública. O que os afasta da esfera política são as formas tradicionais de representação, o modus operandi dos atores, as ações e atitudes escandalosas que sujam a imagem dos representantes nas instâncias federativas. Pesquisa feita por Época/Retrato mostra que apenas 1% dos jovens é filiado a partido político, o que não quer dizer desinteresse pela política, eis que dois em cada cinco adolescentes entre 16 e 18 anos gostariam de seguir carreira política em uma moldura partidária mais limpa. Outro mapeamento, feito pelo Centro de Pesquisas do Instituto Paulista de Adolescência, revela que menos de 20% dos jovens de 16 a 18 anos possuem título de eleitor. Corrobora-se a visão de que os poucos jovens que decidem enveredar pela trilha política são cooptados por uma cultura viciada em “ismos” (fisiologismo, grupismo, mandonismo, nepotismo), acabam se transformando em “novos coronéis”, passando a compartilhar os currais da velha política. Não por acaso, temos uma arcaica e gigantesca máquina política, povoada com 64 mil cargos eletivos, de presidente a vereador; candidatos a prefeito e vereador somam 380 mil. Não é de surpreender que as temáticas de interesse dos jovens, a partir da educação, ficam longe das pautas congressuais. Quando o assunto é pertinente– como a questão dos cursos de medicina e importação de médicos– a voz da estudantada avoluma-se em protestos.

Na verdade, as políticas públicas voltadas para as causas dos jovens são pontuais e segmentadas. É o caso do programa Bolsa-Família. Não se nega que milhões de brasileiros deixaram o território da miséria, o que proporcionou melhores condições de vida aos jovens pobres. Porém, os jovens da classe média tradicional não foram contemplados com programas orientados para o aperfeiçoamento de suas condições educacionais e profissionais, o que acaba contribuindo para adensar a contrariedade no meio da pirâmide social. Seus horizontes ficaram mais turvos, contribuindo para fortalecer a cadeia de mobilização e unindo elos da corrente de indignação que agrega muitos parceiros. Sem comandos de líderes tradicionais, os jovens acorrem às ruas e dão forma a um novo pólo de poder, na sustentação da hipótese de que “se o poder centrífugo não atende ao clamor das turbas, o poder centrípeto o empurrará”. A par de demandas reprimidas, registra-se o desfile de casos escabrosos, principalmente na apropriação vergonhosa de recursos públicos, fato que contribui para aumentar o produto nacional bruto da insatisfação social. O segmento jovem, ademais, é o que possui visão mais pragmática da política e entende que esta se desvia de sua finalidade básica, atender ao bem comum. Tem faltado, isso sim, compreensão sobre o papel da juventude na sociedade. A velha classe dirigente, por seu lado, luta a todo custo para preservar o status quo.

Entender o jovem exige, primeiro, inseri-lo no quadro de transformações ocorridas nas últimas décadas. Karl Popper e Konrad Lorenz constatam, em sua obra “O Futuro Está Aberto”, a existência de um abrangente processo de massificação na sociedade, caracterizado, sobretudo, pela perda de valores. O fim da Guerra Fria desfez as clássicas divisões ideológicas. Os países romperam fronteiras, integrando-se aos mercados globais e acompanhando a evolução tecnológica. O capital físico, variável-mor do crescimento econômico, cedeu lugar ao capital humano, caracterizado pelo conjunto de capacitações que as pessoas ganham por meio da educação, do treinamento e da experiência para desempenhar suas atividades com competência. Essa é a nova ordem que instiga os jovens. Quando falta a matéria prima deste novo ciclo – que caracteriza a Sociedade da Informação e do Conhecimento – a frustração se estabelece. Da frustração para a revolta, o passo é curto, a rebeldia se impõe. Não estão os jovens preocupados com ideologia, direita ou esquerda. Pode ser que, em um ou outro país, o fundamentalismo de cunho religioso seja o leit motiv das mobilizações. Por aqui, o pragmatismo abre alas. Nossos jovens não vivenciaram os anos de chumbo. Apenas uns poucos ouviram de seus pais os ecos dolorosos do passado. A preocupação que os move agrega coisas como educação, emprego, melhoria dos serviços públicos. Reivindicam condições para competir em um mercado cada vez mais exigente.

Se nossa geração não souber abrir espaço para a juventude, a janela do futuro ficará fechada. Abram os ouvidos, políticos e dirigentes, à profecia desse jesuíta, o papa Francisco.



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