Jornalista Andrade Junior

sábado, 13 de outubro de 2012

O PREÇO DE UMA TRAIÇÃO

UM TEXTO LIGHT PARA UM FIM DE SEMANA AGRADÁVEL. ENCONTREI-O EM MINHAS ANOTAÇÕES, JÁ REDIGIDO HÁ ALGUM TEMPO MAS EXTREMAMENTE ATUAL. FOI PUBLICADO NO JORNAL ZERO HORA E É DE AUTORIA DE MOACYR SCLIAR INTITULADO "O PREÇO DE UMA TRAIÇÃO"

·         “Vem de Minas Gerais, terra de ficcionistas famosos, uma notícia tão curiosa quanto reveladora, uma notícia sobre a qual vale a pena pensar.
·         Um casal se separou. Nada de mais, acontece todos os dias. E também, como é frequente, o juiz determinou que o homem pagasse uma pensão para garantir o sustento da filha recém-nascida.
·         Aí começou o conflito. O ex-marido recusou-se a arcar com a pensão, alegando que a mulher o traía, fato público e notório. Um exame de DNA confirmou que, de fato, a filha não era dele. Mais: o homem entrou com pedido de indenização por danos morais e materiais (o dinheiro pago por mais de cinco anos como pensão alimentícia para a criança). A Justiça concedeu-lhe apenas a indenização por danos morais, no valor de R$ 40 mil. A ex-mulher recorreu; alegou que o ex-marido não havia sofrido danos morais porque sabia do relacionamento extraconjugal. O valor da indenização foi então diminuído para R$ 25 mil. Cabe recurso.
·         Detalhe significativo: a decisão ocorreu na mesma semana em que era evocado o centenário da morte de Euclides da Cunha. Como contamos aqui no domingo passado, o escritor morreu porque tentou matar o amante de sua mulher, sendo por este baleado. Euclides estava tentando lavar a honra com sangue, de acordo com um costume milenar.
·         Que parece estar mudando. O marido traído lá em Minas não queria mortes, queria dinheiro. Não só ele está de acordo com a mentalidade da economia de mercado em que vivemos, como também foi muito mais prático e direto: tratava-se de quantificar a ofensa em moeda corrente do país. E a pergunta então se impõe: como fazer essa quantificação? Duas cifras emergiram, uma de R$ 40 mil e outra, posterior, de R$ 25 mil, considerada, pelos desembargadores, “adequada e suficiente para compensar o transtorno moral sofrido pelo ex-marido, sem resultar em enriquecimento, e, ao mesmo tempo, penalizando a ofensora”. A pergunta é: de onde saíram esses números? Que tabela emocional os fornece? Por que R$ 25 mil e não R$ 24 mil ou R$ 26 mil?
·         Discussões à parte, a verdade é que o desfecho tem seus pontos positivos. Em primeiro lugar: não morreu ninguém, ninguém foi agredido, o que, num país que pode ser bem violento, é uma boa notícia. Em segundo lugar, o acontecido envolve uma lição: ensina que, de vez em quando, temos de transformar nossos conflitos em questões objetivas: o que fazer, como fazer. Ah, sim, e nos ensina também a quantificarmos nossos problemas. Vocês dirão que transformar emoções em quantias é coisa de mercenário. Talvez seja. Mas não é inusitado. Lembrem Memórias Póstumas de Bras Cubas, de Machado: “Marcela me amou durante 11 meses e 15 contos de réis”.
·         É melhor transformar emoções em grana do que transformá-las em crime. E é mais prático também. No caso, permitirá que duas pessoas se separem e que cada uma delas siga seu caminho, uma levando um cheque, outra não, mas sem outras mútuas dívidas.
·         Os numerologistas dizem que os números governam nossas vidas. Pode ser. Os números e os cifrões que com eles muitas vezes estão convenientemente associados.”

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