Jornalista Andrade Junior

sábado, 29 de março de 2025

Estamos diante de um julgamento político, não jurídico

  Gabriel Wilhelms 


Já escrevi de forma extensa sobre a suposta tentativa de golpe que, segundo a PGR, teria sido encabeçada pelo então presidente Jair Bolsonaro. Em resumo, defendi, como sigo defendendo, que a) a PF não logrou demonstrar um nexo de causalidade entre tratativas golpistas ocorridas em 2022 e as depredações do dia 08 de janeiro de 2023, b) Bolsonaro é e sempre foi um amante da ditadura militar, com claras pretensões autoritárias e é provável que tenha sim participado de conversas de natureza golpista, porém, c) meras conversas e tratativas não configuram, por si só, uma tentativa de golpe, que, para ocorrer, careceria de que a ação tivesse pelo menos sido iniciada, como vem explicando o jurista André Marsiglia, coisa que o próprio relatório da PF deixa claro que não ocorreu. Isso é o que tenho a dizer sobre o mérito da denúncia. Agora, mesmo quem divirja dessa interpretação não pode negar que estamos assistindo a um julgamento político, desprovido de imparcialidade. Dois pontos provam isso de forma insofismável.


O ponto mais grave dos julgamentos dos réus do 08 de janeiro é que eles estejam ocorrendo no STF, que claramente não tem competência constitucional para julgar centenas de cidadãos sem prerrogativa de foro. Cidadãos estão sendo condenados a toque de caixa sem possibilidade de recurso ou revisão das penas, reconhecidamente desproporcionais – e essas pessoas estão sendo julgadas pelo plenário do STF, isto é, com a participação de todos os ministros. Pois bem, não há razão lógica, jurídica, técnica ou o que seja para que elas sejam julgadas pelo plenário e, quando se trata daqueles que seriam os supostos arquitetos do dito golpe, incluindo um ex-presidente da República, o julgamento ocorra pela primeira turma do STF apenas. Como amplamente noticiado, a articulação de Moraes para que esses processos ficassem com a primeira turma se deu por razão não outra que garantir uma condenação unânime aos réus (especialmente Bolsonaro). Com o julgamento pelo plenário, as condenações também viriam, sem sombra de dúvidas, mas com a possibilidade de que alguém (Mendonça ou Nunes Marques, por exemplo), abrisse uma divergência. Moraes quer o peso histórico de uma condenação unânime, um cálculo político, desprovido de qualquer nexo jurídico.


Por fim, temos a própria prerrogativa da corte em julgar réus que, pela jurisprudência então vigente, já não gozavam de foro privilegiado. Se, no caso de cidadãos comuns, o STF não pareceu se preocupar muito com a repercussão de julgar quem não tem nem nunca teve prerrogativa de foro, não seria isso o que os impediria de julgar Bolsonaro e os demais. Ocorre que, em mais um cálculo político, buscaram conferir maior legitimidade ao julgamento e afastar questionamentos, de modo que, convenientemente (e não façam troça de nossa inteligência dizendo o oposto), alteraram a própria jurisprudência sobre o chamado foro privilegiado. Conforme estabelecido em 2018 pelos ministros, o político com prerrogativa de foro a perderia com o término de seu mandato, de modo que eventuais processos baixariam para as instâncias inferiores adequadas. De forma casuística, o STF estabeleceu neste mês, dias antes do julgamento sobre a aceitação da denúncia do suposto golpe, que a prerrogativa deveria ser mantida, mesmo após o fim do mandato. Resguardaram-se assim da crítica de que não teriam competência para julgar Bolsonaro, já que ele não é mais presidente. Como podemos ver, tal como antes feito com a prisão em segunda instância, mudam a jurisprudência conforme os escusos interesses políticos.


Com a mudança da jurisprudência às vésperas do julgamento da denúncia e o fato de que o poder de decisão ficou circunscrito aos ministros que compõem a primeira turma, só um néscio poderia afirmar que estamos diante de um julgamento técnico e isento. A banda podre da imprensa pode continuar repetindo que é necessário ser duro com os “golpistas”, que o STF deve punir de forma exemplar e quejandos, mas nenhuma grita alterará o fato, claro para todos dispostos a enxergar a coisa com serenidade, de que a corte, não apenas Moraes, tem feito cálculos políticos muito claros, o que se já impróprio e abusivo por qualquer magistrado e o é ainda mais quando feito por integrantes da suprema corte. Não tenho dúvidas, por exemplo, de que um desses jornalistas de aluguel poderia muito bem tratar as considerações que faço aqui como ruminações de um “bolsonarista”, exceto, é claro, pelo fato de que não sou, nunca fui e nunca serei bolsonarista. Há os que estão do lado do estado de Direito e os que estão do lado da conveniência. Eu optei pelo único lado que minha consciência comportaria que optasse.



































publicadaemhttps://www.institutoliberal.org.br/blog/politica/estamos-diante-de-um-julgamento-politico-nao-juridico/

0 comments:

Postar um comentário

Twitter Delicious Facebook Digg Stumbleupon Favorites More