Jornalista Andrade Junior

sábado, 27 de abril de 2019

"O raio do papel",

por J.R. Guzzo

         foto Andrade Junior
Deu um nó. Está sempre dando, na política brasileira, porque é mesmo da natureza da política produzir complicação, aqui e no resto do mundo. 
Mas desta vez parece que se formou entre governo, Congresso, partidos e o resto da nebulosa que compõe a vida pública brasileira um nó de escota duplo, ou um lais de guia holandês, ou algum outro dos muitos enigmas criados pela ciência dos marinheiros — desses que você olha, mexe, olha de novo, e não tem a menor ideia de como desfazer. 
É fácil para os marinheiros — mas só para eles. Como, no presente momento, não há ninguém com experiência prévia a respeito da desmontagem dos nós que apareceram desde que Jair Bolsonaro formou o seu governo, o mundo político está com um problema sério. 
Como se sabe, é a primeira vez na história recente do Brasil que o time inteiro de cima foi montado sem ninguém pedir licença aos políticos, ou sequer perguntar a sua opinião — e menos ainda comprar seu apoio com a entrega de cargos na administração.

Há muito técnico, muito general etc. 
Mas não há, como a ciência política considera indispensável, nada de “engenharia política”. Isso quer dizer, na prática, que ficou difícil fazer a turma da situação votar a favor do governo — pois a maior parte dela passa mal se tiver de votar alguma coisa por princípio, ou seja, de graça. 
É esse o nó que não desata. Por causa dele, dizem que o governo está “paralisado há 100 dias”.
Vejam, para citar o exemplo mais indecente do momento, a reforma da Previdência. 
Nada mais natural que o PT, seus auxiliares e o resto da esquerda fiquem contra. 
Têm mesmo de ficar: a única escolha que faz sentido para a oposição, hoje, é ser 100% contra qualquer ideia que tenha a mínima chance de melhorar o Brasil em alguma coisa. 
Isso seria, em seu raciocínio, ajudar o governo Bolsona­ro a ser bem-sucedido — e um governo Bolsonaro medianamente bem-­sucedido é um desastre mortal para o consórcio Lula-PT. 
Que futuro vai ter essa gente na vida, a não ser que o governo acabe em naufrágio? 
Nenhum. 
É compreensível, assim, que a oposição não aprove nada que possa dar certo. 
Mas PT, PSOL e PCdoB, somados, não chegam a 15% da Câmara dos Deputados. 
E o resto: por que eles demoram tanto para votar a reforma? 
Mesmo descontando outras facções antigoverno, daria para aprovar. 
Resposta: demoram porque querem cargos na máquina e não estão levando.
“Eles demoram para votar porque querem cargos na máquina e não estão levando”
É isso: o sujeito quer uma diretoria, uma superintendência, uma vice-­presidência — uma boquinha gorda qualquer, Santo Deus — e não tem a quem pedir. 
Falam em “agilização” das nomeações. Mas nomeação, que é bom, não sai. 
Chegou-se a falar num “Banco de Talentos”, para onde a politicalha mandaria os nomes que quer empregar — e onde as escolhas seriam feitas segundo “critérios técnicos”. 
Também não rolou. 
Um deputado especialmente desesperado com a demora, Felipe Francischini, chutou o balde e pediu um emprego na estatal Itaipu para a própria madrasta. 
Outro, um Elmar Nascimento, do liberalíssimo DEM, disse que não quer saber de “talentos”; quer emprego mesmo, e dos bons. 
“Não vamos nos contentar só com marmita”, ameaçou ele. 
Histórias como essa encheriam a revista inteira; não vale a pena ficar repetindo a mesma ladainha. 
O certo é que a manada quer os empregos, não está conseguindo e, pior que tudo, não sabe com quem falar para descolar a nomeação. 
Não adianta falar “no governo”, ou “no palácio”. 
Tem de ser com o sujeito de carne e osso que manda assinar o raio do papel que vai para o Diário Oficial
E quem é que chega até ele?
A Caixa Econômica Federal, para dar um exemplo só, trocou todos os vice-presidentes, 38 dos quarenta diretores e 75% dos 84 diretores regionais — tudo propriedade privada dos políticos. 
Mais: quer cortar em dois anos 3,5 bilhões de reais em despesas como aluguéis ou “prestação de serviços”. 
Só na Avenida Paulista, a CEF ocupa hoje sete prédios — nenhum outro banco do mundo chegou perto disso, mesmo na época em que bancos tinham milhares de agências. 
Em Brasília é pior: são quinze prédios, um deles só para tratar da admissão de funcionários, como se a Caixa tivesse de admitir funcionários todos os dias. 
Até uma criança de 10 anos sabe que mexer nisso é mexer diretamente no interesse material dos políticos. 
Eles perderam esses cargos; querem todos de volta, desesperadamente. 
Na CEF, no serviço contra as secas, nos portos, nos aeroportos, nos armazéns de atacado, no Oiapoque e no Chuí.
Uma coisa é pedir um negócio desses ao ministro Onyx Lorenzoni. Outra é pedir ao general Santos Cruz. Dá para entender o nó, não é mesmo?

Veja






























extraídaderota2014blogspot

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