por José Casado O Globo
Milhares de servidores públicos estão com suas aposentadorias e pensões
ameaçadas pela insolvência de quase duas centenas de institutos
municipais que mantêm Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS).
Eles trabalham para 186 prefeituras em 18 estados nas regiões Sudeste
(SP, MG, RJ e ES); Sul (SC e PR); Centro-Oeste (GO, MT e MS); Nordeste
(PE, RN, MA e PI) e Norte (AM, AP, RO, TO e RR).
Na origem da ruína estão má gerência e corrupção política. Numa
estimativa preliminar, as fraudes ultrapassam R$ 2,8 bilhões — segundo
dados da Polícia Federal, da Fazenda e do Banco Central.
Prefeitos e gestores usaram o dinheiro dos servidores em aplicações
financeiras de altíssimo risco: carteiras de investimento compostas por
títulos “podres”, ou seja, sem valor para resgate. Ingressaram numa
espécie de pirâmide financeira erguida sobre cotas de churrascarias, de
empresas de limpeza e de tecnologia inexistentes, entre outras.
Esses fundos de investimentos possuem regras que impedem resgate dos
recursos, mesmo que o resultado da aplicação seja negativo, antes de um
período de “carência” de quatro a dez anos, sempre contados a partir da
data do pedido formal de resgate e condicionada ao pagamento de uma
“taxa de saída” de até 50% do valor investido.
A maioria dos negócios é patrocinada por empresas financeiras que 13
anos atrás foram flagradas na lavagem de dinheiro para políticos
beneficiados no caso mensalão e, agora, são investigadas na operação
Lava-Jato, por negócios suspeitos nos fundos de pensão da Petrobras
(Petros), Caixa Econômica (Funcef), Banco do Brasil (Previ) e dos
Correios (Postalis). Ano passado, esses quatro fundos estatais somaram
perdas de R$ 68 bilhões.
No rastro das falcatruas no Postalis descobriu-se, por exemplo, que 32
institutos municipais compraram R$ 827 milhões em debêntures (“XNICE11”)
sem lastro, emitidos por empresas de papel.
Num dos casos, foram rastreadas 34 empresas vinculadas a um único
corretor carioca, Arthur Mário Pinheiro Machado, personagem de
inquéritos no caso mensalão e, agora, na Lava-Jato.
Ele atuava em parceria com Milton de Oliveira Lyra Filho, identificado
pela polícia como intermediário financeiro dos senadores Renan Calheiros
(AL), Romero Jucá (RR) e Eduardo Braga (AM) — eles negam. Semana
passada, Lyra e Pinheiro Machado foram presos por fraudes no Postalis.
Em outro caso, vários institutos municipais compraram cotas de uma
emissão de R$ 750 milhões em debêntures (“ITSY11”) da Bittenpar, criada
seis meses antes em São Paulo e registrada com capital de R$ 500. A
empresa é de José Barbosa Machado Neto, preso no fim de 2016 por desvios
de R$ 80 milhões em seis institutos de Rondônia. Angra dos Reis (RJ)
investiu R$ 32 milhões no novo negócio.
É vasta a coletânea de trapaças com fundos de aposentadorias de
servidores. Nela se destaca a compra de R$ 472 milhões em títulos
“podres” por entidades de Manaus, Goiânia, Teresina, Macapá, Porto
Velho, Campinas (SP) e Serra (ES). Os papéis foram vendidos pelo banco
BVA, liquidado 60 dias depois.
Não é conhecido o déficit do sistema de Regimes Próprios de Previdência
Social (RPPS). Em Brasília, teme-se uma quebradeira, com efeitos
similares à da crise das dívidas estaduais nos anos 90.
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