FOLHA DE SP -
Nos anos de fastígio, o governo passou à sociedade brasileira a crença de que "o céu era o limite"
Em Zurique ou Seul ninguém precisa asseverar que a Suíça ou a Coreia do Sul deram certo. A frequência com que se vem fazendo essa afirmação entre nós indica que aumentaram ultimamente as dúvidas, já consideráveis no passado.
Em parte, isso tem a ver com os protestos. Demoliram a ilusão de que o Brasil se tornara um país "normal", no qual as massas não precisavam descer às ruas para suprir falhas das instituições. Outra razão: a economia não cresce, e, um a um, todos os estímulos fracassaram.
Cedo ou tarde se esgotarão os recursos para transferências sociais, inviabilizando continuar a reduzir a pobreza e a desigualdade, acarretando a seguir a inelutável erosão dos ganhos conquistados.
De 1999 a 2012, segundo Mansueto de Almeida, as transferências de renda a famílias representaram a assombrosa porcentagem de 84% da alta da despesa não financeira do governo. A partir de 2003, a proporção superaria 91%! É óbvio não ser possível ir muito além disso.
A contrapartida não é apenas a falta de recursos para investir. Já não haverá dinheiro para mais nada, nem para inevitáveis aumentos de salários de funcionários. Se a expansão de gastos se devesse ao custeio da máquina governamental, conforme alegado por alguns, seria talvez mais fácil obter consenso na sociedade para reagir.
O problema é que num país com consciência de culpa pelo passado de escravidão e injustiça, "transferência social" soa como algo ilimitadamente desejável, do qual jamais se poderá ter o bastante. Não existe no Brasil nem de longe o horror moral que os americanos sentem pelos "entitlements", isto é, as garantias de transferência de dinheiro sem contrapartida.
Depende da liderança política a iniciativa de educar o país a fazer a distinção entre o mais e o menos desejável nas transferências, que vão da Bolsa Família aos benefícios do INSS, da Loas para idosos e doentes, aos mais abusados seguro-desemprego e abono salarial.
Nos anos de fastígio, o governo passou à sociedade a crença de que "o céu era o limite". Tomou por prova de que o Brasil tinha dado certo para sempre o que não passava do efeito da maré que, ao subir, eleva todos os barcos. Elogiava-se o presidente porque, em seu governo, todos ganhavam e ninguém perdia.
Agora que a maré começou a baixar, não há espaço para que todos ganhem e os conflitos distributivos voltam a aparecer, constituindo um dos elementos dos recentes protestos. Evitar que eles polarizem e radicalizem a sociedade como nos anos 1960 e na Venezuela e Argentina de hoje vai ser o desafio existencial do próximo governo.
Como tudo prenuncia a reeleição de governo que não passou no teste da realidade, alguns concluíram que teremos quatro anos de declínio lento e gradual, na melhor das hipóteses. Esses tentam se proteger como podem. Não é porque o Brasil deu certo que uma em cada dez vendas de imóveis em Nova York tem brasileiro como comprador.
Aos outros resta a esperança de que uma equipe econômica renovada regenere a economia e que de alguma maneira a mesma liderança convença políticos e sociedade a moderar o apetite distributivo.
Nos anos de fastígio, o governo passou à sociedade brasileira a crença de que "o céu era o limite"
Em Zurique ou Seul ninguém precisa asseverar que a Suíça ou a Coreia do Sul deram certo. A frequência com que se vem fazendo essa afirmação entre nós indica que aumentaram ultimamente as dúvidas, já consideráveis no passado.
Em parte, isso tem a ver com os protestos. Demoliram a ilusão de que o Brasil se tornara um país "normal", no qual as massas não precisavam descer às ruas para suprir falhas das instituições. Outra razão: a economia não cresce, e, um a um, todos os estímulos fracassaram.
Cedo ou tarde se esgotarão os recursos para transferências sociais, inviabilizando continuar a reduzir a pobreza e a desigualdade, acarretando a seguir a inelutável erosão dos ganhos conquistados.
De 1999 a 2012, segundo Mansueto de Almeida, as transferências de renda a famílias representaram a assombrosa porcentagem de 84% da alta da despesa não financeira do governo. A partir de 2003, a proporção superaria 91%! É óbvio não ser possível ir muito além disso.
A contrapartida não é apenas a falta de recursos para investir. Já não haverá dinheiro para mais nada, nem para inevitáveis aumentos de salários de funcionários. Se a expansão de gastos se devesse ao custeio da máquina governamental, conforme alegado por alguns, seria talvez mais fácil obter consenso na sociedade para reagir.
O problema é que num país com consciência de culpa pelo passado de escravidão e injustiça, "transferência social" soa como algo ilimitadamente desejável, do qual jamais se poderá ter o bastante. Não existe no Brasil nem de longe o horror moral que os americanos sentem pelos "entitlements", isto é, as garantias de transferência de dinheiro sem contrapartida.
Depende da liderança política a iniciativa de educar o país a fazer a distinção entre o mais e o menos desejável nas transferências, que vão da Bolsa Família aos benefícios do INSS, da Loas para idosos e doentes, aos mais abusados seguro-desemprego e abono salarial.
Nos anos de fastígio, o governo passou à sociedade a crença de que "o céu era o limite". Tomou por prova de que o Brasil tinha dado certo para sempre o que não passava do efeito da maré que, ao subir, eleva todos os barcos. Elogiava-se o presidente porque, em seu governo, todos ganhavam e ninguém perdia.
Agora que a maré começou a baixar, não há espaço para que todos ganhem e os conflitos distributivos voltam a aparecer, constituindo um dos elementos dos recentes protestos. Evitar que eles polarizem e radicalizem a sociedade como nos anos 1960 e na Venezuela e Argentina de hoje vai ser o desafio existencial do próximo governo.
Como tudo prenuncia a reeleição de governo que não passou no teste da realidade, alguns concluíram que teremos quatro anos de declínio lento e gradual, na melhor das hipóteses. Esses tentam se proteger como podem. Não é porque o Brasil deu certo que uma em cada dez vendas de imóveis em Nova York tem brasileiro como comprador.
Aos outros resta a esperança de que uma equipe econômica renovada regenere a economia e que de alguma maneira a mesma liderança convença políticos e sociedade a moderar o apetite distributivo.
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