O
que é isso senão a imposição de uma mordaça absoluta? E o que é isso
senão o próprio fim da civilização como a conhecemos? E o que é isso
senão o fim da religião mesma? Ora, toda construção civilizacional e
religiosa fora erguida sobre a crítica, a dialética e a dissonância.
A diversidade é uma santa imaculada, louvada, venerada por todos os adeptos da "igreja do pensamento que não desagrada ninguém". Segunda a doutrina dessa comunidade amorfa, inócua e desinteressante, toda manifestação cultural deve ser valorizada, nenhuma cultura pode ser considerada superior e, principalmente, toda cultura deve ser respeitada, ainda que sua prática seja absurda ao observador.
Segundo
esse pensamento, assuntos como os de algumas comunidades indígenas, por
exemplo, que enterram crianças vivas, simplesmente porque não nascem
fisicamente perfeitas, ficam, segundo a ideologia da diversidade,
automaticamente isentos de crítica. Não importa que tais práticas sejam
uma afronta ao bom senso e a uma mínima noção de humanidade; não cabe
falar nada contra elas.
Além
do sufoco infantil, o sufoco da opinião. O respeito à diversidade é
alçado, então, ao estatuto de lei universal, inviolável. Como diante de
uma regra imutável, enxergar o diverso como algo tolerável deixa de ser
uma questão de opção e valores e passa a ser mandamento. Ter o diferente
como mal, inferior, prejudicial não apenas é visto como um ato de
intolerância, mas começa a tornar-se um crime contra a humanidade. Se
não gosta, cale-se e veja o diverso divertir-se às custas de seu
silêncio forçado.
A
diversidade assume então o status de valor em si. Falar algo
depreciativo do outro torna-se blasfêmia sujeita à reprovação e
excomunhão praticada pelos asseclas vociferantes dessa entidade, dessa
deusa, que tem recebido cada vez mais louvores e oferendas. Criticar o
diferente é pecado, e mortal.
Mas
quem são os diferentes protegidos? Na verdade, são aqueles escolhidos
segundo o interesse da ideologia. A matança infantil indígena é
diferente, a feitiçaria africana é diferente, a poligamia e pedofilia
islâmicas também são diferentes e, por isso, falar algo contra essas
chamadas "manifestações culturais" é crime.
Mas
veja que, quando a diversidade, por si mesma, passa a ser inviolável,
não apenas a cultura estrangeira é cercada com muros inexpugnáveis, mas
as próprias manifestações internas, em sua infinita diversidade, ainda
que se choquem com os padrões construídos dentro da própria cultura.
Assim, qualquer atitude humana, mesmo que seja uma afronta ao bom senso,
às tradições e à própria percepção de natureza de um povo, fica
colocada fora do campo da crítica, permanecendo guardada das palavras
contrárias.
O
que é isso senão a imposição de uma mordaça absoluta? E o que é isso
senão o próprio fim da civilização como a conhecemos? E o que é isso
senão o fim da religião mesma? Ora, toda construção civilizacional e
religiosa fora erguida sobre a crítica, a dialética e a dissonância. Sem
isso, nada se teria feito. Se desde sempre os homens não pudessem expor
suas visões discordantes, viveríamos ainda nas cavernas.
Nem
Marx sobreviveria, nem Napoleão permaneceria. Principalmente eles
fincaram seus pés sobre a rejeição do passado, sobre a crítica às
tradições. Podemos concluir, portanto, que se os pais revolucionários
vivessem hoje, não seriam o que foram, pois seriam sufocados pelo
politicamente correto e pela proibição à crítica.
Mas
as coisas não são tão simples assim. Em primeiro lugar, essa onda
politicamente correta tem raízes muito mais profundas, e que alcançam
exatamente aqueles revolucionários citados. Se hoje há uma ditadura
contra a opinião, isso nada mais é do que o fruto do totalitarismo
plantado também por eles.
Em
segundo lugar, mesmo Napoleão e Marx teriam voz nos dias de hoje. Sabe
por quê? Porque as coisas que eles criticaram são os únicos objetos de
crítica permitidos: o cristianismo, o capitalismo, a tradição e a moral.
Se tudo está protegido pela couraça do politicamente correto, estas
manifestações citadas e seus correlatos: o homem branco, a
heterossexualidade, a família e os valores espirituais se encontram fora
dessa rede de proteção. Nada pode ser mal, exceto estas formas de
cultura. Um índio pode matar uma criança, mas um cristão não pode dizer
que o homossexualismo é um erro. Um africano pode fazer feitiços contra
qualquer um, mas um crente não pode orar pedindo bênçãos para Deus. Um
homossexual pode invadir um culto de uma igreja evangélica, lugar
privado, e afrontar as crenças dela se agarrando diante de todos, mas um
pregador não pode, em praça pública, afirmar que um gay está em pecado.
Uma mulher pode reclamar pelo direito de matar fetos, mas ninguém pode
mandá-la calar sua boca. Os brancos precisam arcar com os custos de uma
escravatura secular, enquanto os negros não pagam nada pela escravatura
empreendida por eles mesmos. O capitalista pode ser demonizado como
avarento e explorador, enquanto líderes socialistas, ainda que
usufruindo de vidas nababescas, obtidas por meio da exploração de povos
inteiros, são tidos por heróis.
Há
dezenas de outros exemplos que poderiam ser citados, mas esses bastam
para mostrar que se o politicamente correto impõe o "cale-se" a quase
todos, ficam de fora exatamente aqueles que livremente podem criticar os
calados. E se um dia esses calados desaparecessem, a utopia seria
alcançada: um mundo onde ninguém critica ninguém, onde nada é discutido,
onde nada é melhorado. Como na música do John Lennon, um mundo sem
religião onde todos vivem como um só. Um lugar eternamente inerte. Na
verdade, uma exata descrição do Inferno.
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