J.R. Guzzo -
O Ministério Extraordinário do Arroz, última invenção dos serviços de propaganda do governo Lula, tem pelo menos uma vantagem em relação ao resto do “Brasil Que Voltou”: seu prazo de validade é limitado. Vai durar até os estrategistas de comunicação de Brasília acharem que essa “Arrozbras” já rendeu o que tinha de render – ou seja, simular atividade numa crise de abastecimento que o próprio governo criou e fazer de conta que Lula está vencendo a guerra para segurar o preço do arroz.
O presidente está pouco ligando para o preço do arroz. No seu primeiro ano no cargo os preços subiram 40% – e ele nunca disse uma palavra sobre o assunto. A única coisa em que está pensando, mesmo, é nos rótulos que eles querem imprimir nos pacotes a serem importados e vendidos nos supermercados a R$ 4 o quilo: “Arroz adquirido pelo Governo Federal”. Vem junto a marca da Conab, a repartição pública encarregada da operação.
É coisa de ditadura subdesenvolvida de terceira categoria, mas não é só isso. A decisão do governo, além de demagogia em estado bruto, também é flagrantemente lesiva ao interesse público. Querem jogar cerca de R$ 7 bilhões na importação de 1 milhão de toneladas de arroz, das quais as primeiras 300 mil são prometidas para daqui 50 dias, que devem ser vendidas no varejo a R$ 40 o pacote de 10 quilos. Daria, se tudo saísse certo, para dois meses de consumo, na melhor das hipóteses.
O problema, nessa história toda, é que o Brasil não precisa de um único quilo de arroz importado. Ao contrário. A safra deste ano é 600 mil toneladas superior ao necessário para abastecer o mercado interno. Na verdade, os produtores terão de exportar esse excedente, ao mesmo tempo em que o governo estará comprando arroz no mercado externo – é possível, até, que os graneleiros se cruzem no mar, uns levando e outros trazendo arroz.
O que houve, no mundo das realidades, foi um sobressalto passageiro causado pelas enchentes no Rio Grande do Sul, responsável por 70% de toda a produção de arroz do Brasil. A maior parte da safra gaúcha já foi colhida – mas Lula, também aí, aproveitou a desgraça para investir na sua imagem. Compras exageradas logo depois dos primeiros dias, caminhões retidos nas estradas e dificuldades de emitir notas fiscais em escritórios debaixo d’água fizeram os preços subirem nas gôndolas. Queriam o que? Que o preço do arroz baixasse?
O fato é que todos esses problemas foram ficando para trás, e hoje o mercado caminha para a normalidade. Anormal, mesmo, só o que o governo fez. Ressuscitou, quase 40 anos depois dos “fiscais do Sarney”, a ideia morta de tabelar preços – coisa que não dá certo desde que os faraós tentaram pela primeira vez. O abastecimento vai voltar ao normal. Os exportadores estrangeiros vão vender pelo preço que quiserem, e o Brasil vai comprar.
Os supermercados, naturalmente, vão manter a sua margem de lucro. O MST, sócio proprietário da Conab, vai se dar bem. O governo, em suma, vai comprar mais caro e vender mais barato – e a diferença, como acontece com cada tostão do dinheiro público, vai ser paga pela população em geral, incluindo os que comparem esse arroz de R$4. É mais um retrato do Brasil de 2024.
J.R. Guzzo. Gazeta do Povo
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