Percival Puggina
Poucas semanas depois da posse de Bolsonaro já estavam os senhores ministros do STF no desempenho de um “papel contramajoritário” (a expressão é deles mesmos) em “defesa da democracia”. Paradoxo que se mantém até hoje!
O consequente divórcio entre o Supremo e a sociedade, os excessos, as manifestações políticas e politiqueiras, o linguajar militante pressupõem o encastelamento do poder e fazem despencar lomba abaixo prestígio da corte.
Fora do plano da política, soube-se, agora, da ida a Portugal de duas dúzias de ministros STJ, desembargadores e juízes para um evento jurídico a ser presidido pelo ministro Ricardo Lewandowski. Tudo certo, exceto pelo pagamento da conta. Não, leitor, a conta não é sua, ao menos diretamente. A conta, segundo o Estadão, será paga por um banco, empresas de investimento, administradores judiciais e escritórios de advocacia com litígios bilionários pendentes de julgamento pelos convidados. Leia a matéria do Estadão aqui.
Não surpreende que especialistas em Direito e Ética vejam nisso óbvio conflito de interesses, ainda que seja só uma viagem com padrão de conforto incomum ao turista brasileiro. Há três dias, os fatos são do conhecimento público e sobre eles cai o silêncio dos inocentes. Parece que o princípio ético superior persiste sendo o “ninguém solta a mão de ninguém”.
Chama a atenção o recente cancelamento do convite feito ao ministro Luiz Fux pela OAB de Bento Gonçalves para uma palestra-jantar na Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) do município. Ao saber do convite a comunidade protestou e os patrocinadores locais recuaram de seu apoio financeiro ao evento. Depois, a CIC recuou do desconvite e o ministro recuou da aceitação alegando questões de segurança.
Logo após, na bela Gramado, também gaúcha e também serrana, surge impasse semelhante, ainda não resolvido. Uma Jornada Internacional de Direito anunciou a participação do ministro Dias Toffoli entre os 225 convidados e o conhecido Hotel Serra Azul retirou seu apoio ao evento. O hotel não perguntou, mas pergunto eu: quem quer aprender Direito ouvindo o ministro Toffoli?
Entre resmungos e protestos, penso que tais cancelamentos são reações normais em uma sociedade que percebeu, ao longo de quase quatro anos, a assimetria de suas relações com as instituições da República. Enquanto estas fazem o que bem entendem, a sociedade vai fazendo o que pode.
publicadaemhttps://www.puggina.org/fique-sabendo-artigo/o-cancelamento-de-ministros__6974
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