Jornalista Andrade Junior

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

"Reforma coerente enfrenta o desafio da política",

 editorial de O Globo

A apresentação formal da proposta de reforma da Previdência confirmou a impressão tida a partir de algumas antecipações feitas e declarações de autoridades de que ela tem coerência e atende à necessidade, entre outras, da correção de injustiças entre os regimes de seguridade. Além, por óbvio, de sinalizar que o Estado brasileiro sairá da rota da insolvência em que se encontra agora, devido aos gastos previdenciários descontrolados.


Neste sentido, trata-se do mais completo projeto de reforma da seguridade já apresentado, desde que o assunto entrou na pauta do país com a posse de Fernando Henrique Cardoso, em 1995. Pois o problema dos desequilíbrios crescentes da Previdência é antigo, e todas as mudanças que FH, Lula e Dilma conseguiram fazer, ou quiseram executar, nunca foram a fundo no ataque a vários pontos nevrálgicos do sistema:entre outros, aposentadorias precoces; grande desnível entre os benefícios pagos aos assalariados do setor privado e ao funcionalismo público, em privilégio deste; e uma resposta firme à tendência inexorável de o sistema brasileiro, baseado no regime de repartição, ser inviabilizado pelo tempo, mesmo que a longo prazo, pelo inevitável envelhecimento acelerado da população, pela queda da taxa de natalidade e uma bem-vinda sobrevida crescente de quem chega a atinge 62 e 65 anos de idade, que poderá ser o limite idade para a aposentadoria de mulheres e homens, caso a proposta de reforma constitucional divulgada agora seja de fato aprovada.
A apresentação da "Nova Previdência" coincide com a exótica crise política criada dentro da família do presidente Bolsonaro de que resultou a exoneração do ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, que já demonstrava algum trânsito no Congresso e ajudaria Onyx Lorenzoni, ministro-chefe da Casa Civil, na tarefa crucial de negociar no Legislativo a aprovação da reforma. Será um desafio adicional para o governo.
Mas ele tem a seu favor um conjunto de medidas bem lapidadas. Até a clássica crítica à qualquer reforma previdenciária, feita principalmente por quem deseja manter privilégios, de que antes devem ser cobradas as bilionárias dívidas ao INSS, tem resposta: será apresentado projeto de lei para facilitar a cobrança deste passivo e coibir "devedores contumazes'.
Outro ponto positivo é a percepção de que, afinal, políticos e a sociedade começam a compreender o problema da Previdência, e que sem o seu equacionamento a economia não voltará a crescer como o Brasil precisa. É possível que o persistente e elevado desemprego causado pela grande recessão do biênio 2015/16, derivada dos erros da política econômica de Dilma/Lula, esteja exercendo um papel pedagógico na sociedade sobre a imperiosa necessidade deste ajuste fiscal.
A reforma de Temer, no seu desenho original, tinha como meta R$ 800 bilhões de economia em dez anos. A de Bolsonaro, R$ 1,072 trilhão, cifra essencial para inverter a tendência de crescimento do peso da dívida pública no PIB — 50% no primeiro governo Dilma e que, devido a seus erros, se aproxima dos 80%.
A busca pela equiparação das regras entre os diversos regimes — a reforma do sistema dos militares, mais fácil, por ser por projeto de lei, virá depois —, incluindo o princípio de que quem tem remuneração maior contribui mais, transposto do Imposto de Renda para contribuição previdenciária, é coerente com a busca por justiça social. Algo inatacável como princípio.
Um conjunto tão amplo de propostas consumirá algum tempo para ser digerido dentro e fora do Congresso. Não se pode é, no debate, perder o sentido do todo das propostas e o entendimento de que, embora seja uma reforma emergencial, ela abre horizonte de longo prazo, como demonstra a inclusão no pacote do novo regime de capitalização, para os mais jovens. Não se deve perder esta oportunidade de abrir um amplo espaço de crescimento para o país.












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