Jornalista Andrade Junior

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

"Negligência, omissão e impunidade imperam no país do ‘ilegal, e daí?’",

editorial de O Globo

O roteiro é conhecido. Uma grande tragédia, famílias destruídas, comoção nacional e promessas oficiais de que ela não se repetirá. Em seguida, são anunciados projetos para endurecer a lei e normas para melhorar a fiscalização. Mas os capítulos seguintes costumam ser parecidos. O tempo passa, pouco ou nada acontece, até que surge nova catástrofe. 
Tem sido assim nos incontáveis desastres que abalaram o país nos últimos anos, como o rompimento das barragens do Fundão, em Mariana, que deixou 19 mortos em 2015, e da Mina do Feijão, em Brumadinho, no dia 25 de janeiro, em que já se contabilizam 166 mortos e 155 desaparecidos. Pergunta-se: quantas mais serão necessárias para que se interrompa essa sequência nefasta?
No Rio, a cidade ainda chorava os sete mortos da tempestade da noite de quarta-feira quando, na sexta, aconteceu o incêndio no Centro de Treinamento do Flamengo (Ninho do Urubu), em Vargem Grande, em que dez adolescentes da categoria de base do clube perderam a vida. No enterro de um dos garotos, um jovem inconformado resumiu: “Essa tragédia poderia ter sido evitada”. 
Tem razão. Já se sabe que os atletas dormiam num contêiner irregular, inexistente na planta do CT, que, por sua vez, não tem alvará de funcionamento. A prefeitura o interditou, mas ele continuou funcionando. E os bombeiros vistoriaram as instalações, mas nada fizeram porque o dormitório não existia oficialmente.
Fatos tão diferentes quanto o rompimento da barragem em Brumadinho, as chuvas do Rio e o incêndio no CT reúnem traços comuns. Negligência, omissão e irresponsabilidade permeiam essas tragédias. Como tantas outras. Não à toa, a procuradora-geral, Raquel Dodge, diz que o Brasil assiste a uma sucessão de desastres evitáveis.
Essa situação só mudará quando a inconsequência for efetivamente punida. Reportagem do GLOBO, publicada na segunda-feira, mostrou que grandes tragédias brasileiras ocorridas nos últimos 12 anos permanecem sem condenações. Como o incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria (RS), que matou 242 pessoas em 2013, ou o desabamento do Edifício Liberdade, no Centro do Rio, que deixou 17 mortos em 2012.
Negligência e impunidade são combustíveis letais para novos desastres. No entanto, é possível mudar esse quadro. O Brasil já foi um ícone da corrupção, mas a Lava-Jato vem desconstruindo essa imagem, pondo na cadeia pessoas que jamais imaginaram cruzar os portões de um presídio. 
Cabe ao poder público, aos órgãos de controle, à Justiça e à sociedade escreverem uma outra história. Não podemos ser eternamente o país dos puxadinhos, das gambiarras, do “ilegal, e daí?”, da irresponsabilidade que mata, e fica por isso mesmo. Esta é outra tragédia a ser enfrentada.










extraídaderota2014blogspot

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