por Guilherme Fiuza
O prefeito de Belo Horizonte anunciou a abertura de 1,9 mil covas para vítimas de covid-19. No momento desse anúncio, o número de óbitos por covid-19 na capital mineira era 14. Se o prefeito de Belo Horizonte tem um estudo projetando uma mortandade iminente na cidade que administra, não mostrou esse documento à população.
E também ninguém pediu. Assim estão os acontecimentos neste tempo de epidemia. Autoridades falam o que lhes dá na telha, em pronunciamentos caudalosos e televisados em que tudo vira manchete.
O prefeito de São Paulo também anunciou meticulosamente os “investimentos” item por item para abertura de valas, compra de câmaras frigoríficas/sacos para cadáveres e número exato de novas urnas funerárias que estavam sendo adquiridas por seu governo. Um imprestável show fúnebre que ninguém contesta. Parece que o surto é de letargia.
A forma como as estatísticas estão voando por aí contribui para o estranho espetáculo. Em menos de uma semana, por duas vezes circulou amplamente a notícia de recordes diários de mortes por coronavírus no Brasil — ambos acima dos 400 casos — e nenhum dos dois estava correto. Ambos se referiam ao registro (feito num mesmo dia) de números correspondentes a vários dias. Quantos desmentidos você lembra de ter lido sobre esses falsos recordes?
É expressiva e inexplicável a quantidade de óbitos “presumidos” pelo novo vírus. Numa epidemia dessa amplitude é inconcebível a falta de rigor para a delimitação dos seus efeitos exatos. A sucessão de casos de famílias tendo que discutir atestados de óbito indevidamente lavrados como coronavírus — muitas vezes sem autópsia — é o requinte de crueldade dessa preocupante nuvem de imprecisões estatísticas e atropelos de direitos.
Agravando esse estado nebuloso surgem as investigações sobre compras indevidas e superfaturadas de equipamentos de saúde — sempre potencializadas pelos dados locais de progressão da epidemia que, inclusive quanto à taxa de ocupação hospitalar, viraram ficção científica. Na era digital e da informação instantânea em rede faltam dados oficiais exatos e diários sobre a situação dos leitos/capacidade de atendimento por unidade.
E essa bagunça é subdemocrática. O festival de desinformação na pandemia é um atestado de incivilidade. Sabe-se que há aproveitamento político (sórdido), mas já nem é possível distinguir a má-fé da negligência e da imperícia. E se você buscar informação que preste será acusado de negacionista e assassino. A instituição mais sólida do momento é a patrulha viral.
A OMS não ajuda, com suas diretrizes dançantes como um show de Lady Gaga. Primeiro não havia pandemia, depois o isolamento horizontal era para o mundo inteiro, depois a circulação restrita (até com funcionamento de escolas) passou a ser indicada para sociedades emergentes, depois veio o anúncio de que o pior ainda “pode” estar por vir, com a hipótese de que o confinamento estaria adiando o pico… Que que é pra fazer, companheiros?
É pra fazer qualquer coisa. Governadores e prefeitos continuam sentando o sarrafo no cidadão que põe o pé na calçada (dependendo da calçada e do cidadão, claro), porque eles interpretam a OMS e a ciência à luz dos seus desejos particulares. Vocês estão entregando sua liberdade de bandeja a tiranetes — e não foi por falta de aviso.
Agora vocês vão poder trabalhar quando eles quiserem; o Dia das Mães vai ser quando eles tiverem vontade; e o Natal pode até acontecer ainda este ano — mas vai depender das estatísticas que eles ainda vão inventar.
Homens, mulheres e até crianças que já foram barbarizados e presos por estarem “colocando vidas em risco” não entendem por que as forças de segurança dos imperadores de várzea não agem para garantir o distanciamento sanitário nas aglomerações das filas do auxílio emergencial. Mas a resposta é muito simples: os tiranetes não estão preocupados com vírus nenhum. Estão só industrializando o pânico.
Se o surto de letargia prosseguir, o coronavírus vai acabar virando coadjuvante da tragédia.
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