Wilson Lima, Revista Oeste
Levantamento do TSE sobre as contas do partido indica irregularidades em gastos da
ordem de R$ 30,4 milhões no uso dos Fundos Partidário e Eleitoral
Tem de tudo. Aluguel de avião. Contratação de advogados. Ônibus para caravanas. Quando se trata de gastar o dinheiro público, o PT demonstra-se, mais uma vez, um especialista. Relatório preliminar do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a prestação de contas do partido referente ao ano de 2018 ao qual a Revista Oeste teve acesso com exclusividade apresenta vários indícios de irregularidades cometidas pelo PT, como a omissão de documentos que deveriam ter sido apresentados à Justiça Eleitoral ainda no ano passado ou desvio de finalidade na utilização de recursos.
O TSE cobra do partido esclarecimentos sobre gastos da ordem de R$ 14,6 milhões referentes a custeios. São despesas não esclarecidas que aparecem como locação de imóveis, aeronaves, serviços jurídicos e até dívidas de campanhas pregressas, inclusive a do ex-prefeito de São Paulo e candidato à Presidência em 2018, Fernando Haddad, e a do ex-poste Dilma Rousseff, de 2010. A corte eleitoral também quer que o PT explique os motivos pelos quais não repassou cerca de R$ 15,8 milhões para candidaturas femininas nas últimas eleições gerais. O dinheiro acabou indo parar nas contas de campanha dos candidatos do sexo masculino, indicando desvio de finalidade na aplicação do dinheiro do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).
Os indícios de irregularidade foram listados pelos técnicos do TSE e estão anexados à prestação de contas do partido.
Agora, a corte eleitoral aguarda a manifestação da legenda para emitir um parecer conclusivo que pode resultar na aprovação ou reprovação das contas. Na quinta-feira da semana passada, 14 de maio, o ministro Edson Fachin determinou ao partido que os responsáveis pelas contas, a presidente do PT, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), e o deputado estadual por São Paulo Emídio de Souza, secretário nacional de finanças, apresentem em 20 dias os documentos para que os técnicos do TSE possam avaliá-los.
Uma eventual reprovação da prestação de contas pode obrigar a legenda a devolver aos cofres públicos os gastos considerados irregulares. Ou ainda, em último caso, há a possibilidade de que o PT perca o direito aos Fundos Partidário e Eleitoral nos próximos anos. “Informa-se que o Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores apresentou a prestação de contas referente ao exercício financeiro de 2018 de forma incompleta, visto que estão ausentes documentos obrigatórios”, citam os técnicos do TSE no relatório a que a reportagem teve acesso.
A corte também apura a possibilidade de que o PT tenha maquiado gastos eleitorais por meio dos custeios da máquina partidária, prática que os técnicos passaram a olhar com muita atenção desde a eleição de 2014.
A Resolução nº 23.553/2017 do TSE estabelece que “as despesas e os custos assumidos pelo partido político e utilizados em benefício de uma ou mais candidaturas devem ser registrados integralmente como despesas financeiras na conta do partido e, concomitantemente, como transferências realizadas de recursos estimáveis aos candidatos beneficiados”. Ou seja: gasto de campanha deve ser declarado como gasto de campanha; gasto do partido deve ser declarado também como tal. Além disso, outro objetivo dessa análise mais detalhada é verificar se houve excesso, abuso ou desvio de finalidade no uso do recurso público.
Notas fiscais anexadas à prestação de contas apontam, por exemplo, que apenas em 19 de março daquele ano o partido gastou R$ 20 mil com a locação de um avião para realizar um voo entre Porto Alegre e Bagé, no Rio Grande do Sul. O período da contratação do jatinho particular coincide com a tal “caravana Lula”, cujo ponto de partida no Rio Grande do Sul era justamente a cidade de Bagé. Na ocasião, Lula fez um discurso de oito minutos na Universidade Federal dos Pampas e foi escorraçado por manifestantes antipetistas. Os técnicos do TSE também solicitam informações detalhadas sobre locação de veículos, de imóveis e até mesmo sobre a folha de pagamento da sigla — parte dos gastos do PT ocorreu durante a campanha Lula Livre, que, segundo vários especialistas em Direito Eleitoral, não pode ser qualificada como “atividade partidária”; seria um ato de promoção pessoal.
Na lista de contratos estão gastos de R$ 13 mil com o aluguel de uma van e de um veículo executivo utilizados por membros do partido durante protestos do Lula Livre entre 15 e 19 de abril de 2018, em Curitiba. Enquanto o ex-presidente cumpria pena, os petistas gritavam seus bordões do lado de fora da Polícia Federal bancados com o dinheiro do pagador de impostos.
O TSE exige detalhes dos processos, quer saber se foram ações de caráter administrativo e em quais tribunais os advogados atuaram. Na lista de contratos, há um com o escritório Aragão e Ferraro Advogados Associados, do jurista Eugênio Aragão, ministro da Justiça do governo Dilma Rousseff em 2016. Oficialmente, o escritório prestou serviços na chamada pré-campanha, quando Lula ainda fazia jogo de cena de que poderia ser candidato. Mas houve encontros entre advogados e o ex-presidente quando ele já estava preso em Curitiba. Apenas em junho de 2018, o escritório recebeu R$ 130 mil.
As mulheres também não escaparam das artimanhas do PT. O partido foi o que mais defendeu a instituição de uma cota de 30% do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas Eleitorais para mulheres. Em maio de 2018, o PT fez uma consulta com pompa e circunstância ao TSE com o propósito de disciplinar a destinação desses tais 30%. O documento teve a assinatura da presidente Gleisi Hoffmann. Tudo lindo. Na teoria. Na prática, o partido deveria ter repassado às candidatas R$ 70 milhões. O valor destinado à ala feminina foi de R$ 54,1 milhões. O resto acabou abastecendo candidaturas masculinas.
Nem mesmo o braço intelectual do PT, a Fundação Perseu Abramo, escapa da lambança contábil.
De acordo com a Lei nº 9.096/1995, as siglas são obrigadas a repassar 20% do Fundo Partidário às suas respectivas fundações. Dos R$ 23,7 milhões obrigatórios para a atividade de sociólogos, pesquisadores, acadêmicos e pelegos sindicais — algo que, em si, precisa ser combatido pela sociedade —, o partido repassou R$ 22,8 milhões. Quase R$ 1 milhão a menos. O TSE quer saber onde foi parar esse dinheiro.
Em 2018, o último ano em que todas as contas dos partidos já estão fechadas, o PT recebeu dos cidadãos trabalhadores que pagam impostos um total de R$ 331,5 milhões. Desse valor, R$ 119 milhões foram destinados ao partido por intermédio do Fundo Partidário. Esse fundo é utilizado para bancar as despesas operacionais das legendas, como pagamento de funcionários e encargos, aluguel de sedes de diretórios municipais e regionais etc. O resto da bolada, R$ 212 milhões, chegou aos cofres petistas pelo Fundo Especial de Financiamento de Campanha. A jabuticabice foi criada pelo ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB), hoje em prisão domiciliar, após decisão questionável por parte do Supremo Tribunal Federal que impedia a doação de empresas a campanhas eleitorais.
As contas do PT reafirmam o que o Brasil já conhece, a mais absoluta disposição do partido para o uso indevido de recursos públicos. Mas expõem também a urgência de revisão dos mecanismos de financiamento das legendas e das campanhas eleitorais. Hoje, apenas o Partido Novo defende a extinção dos Fundos Partidário e Eleitoral. É uma pauta que merece o engajamento de ativistas e de organizações que trabalham em favor de um Estado mais eficiente, como o Centro de Liderança Pública e a Transparência Brasil. O PT apresenta a face mais nefasta do problema. Mas esses fundos são estorvos que precisam ser eliminados.
Wilson Lima, Revista Oeste
Publicadoemhttp://rota2014.blogspot.com/2020/05/a-nova-pedalada-do-pt.html
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