A negação e o preconceito não solucionam o problema. Para mudar a prática corrente da política brasileira, vai ser preciso que a sociedade novamente se engaje dentro dos partidos
Em duas semanas termina o prazo para que todos aqueles que queiram se candidatar filiem-se a partidos. Especialmente na ressaca da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito da continuação do julgamento do mensalão, é possível pensar que isso não interessa ao cidadão, e que os partidos estão dominados por grupos que têm como único objetivo permanecer no poder para benefício próprio. É um diagnóstico não de todo errado, mas incompleto: é preciso saber como se chegou a esse patamar de descrença.
É bem verdade que as legendas andam com a má fama de serem, ao menos em parte, culpadas pelas disfunções da política brasileira. Elas têm lá sua parcela de responsabilidade sobre os desvios de conduta de seus integrantes. Há, entretanto, um outro lado dessa mesma verdade que é deliberadamente esquecido. É preciso admitir que boa parte da sociedade se distanciou da vida partidária e, ao agir assim, ao menos indiretamente contribuiu para se chegar ao estado de coisas atual.
Qualquer solução para a crise das instituições brasileiras precisa contemplar obrigatoriamente mecanismos que promovam uma maior sintonia entre partidos políticos e sociedade. As legendas são, na democracia brasileira, os instrumentos legítimos para a disputa política – é por meio delas que são escolhidos os representantes que decidem os rumos do país. Negar a atividade partidária, considerá-la uma atividade criminosa ou trabalho para corruptos é, em última instância, condenar a própria política.
A negação e o preconceito não solucionam o problema. Para mudar a prática corrente da política brasileira, vai ser preciso que a sociedade novamente se engaje dentro dos partidos. Vai ser preciso o aparecimento de novas lideranças partidárias, descomprometidas com a reprodução do fisiologismo e das práticas patrimonialistas. Vai ser preciso empreender um processo de revitalização das legendas, esforçando-se para torná-las mais democráticas e mais férteis no debate do programa partidário. Esse esforço só será possível se o preconceito for quebrado e se cidadãos que têm participado da vida pública, mas que estão neste momento alheios aos partidos, decidirem participar do processo eleitoral.
O retorno dos cidadãos às atividades partidárias é possível. Já aconteceu em outros lugares do mundo. Na Noruega, por exemplo, as filiações partidárias dispararam entre os jovens no fim de julho de 2011. A razão para esse comportamento não foi nada banal. O terrorista Anders Breivik havia assassinado a tiros 77 pessoas na ilha de Utoya. A tragédia que comoveu a Noruega serviu para despertar a consciência da necessidade de participar dos assuntos públicos. Segundo notícias veiculadas naquela ocasião, todas as legendas tiveram adesão de jovens, até mesmo o Partido Progresso, sigla conhecida por suas posições radicais anti-imigração, ao qual Breivik era filiado.
No Brasil, não é necessário esperar que ocorram tragédias civis ou rupturas políticas revolucionárias para haver um despertar do envolvimento da sociedade na política. Não é preciso ter eventos inusitados nem situações dramáticas. É preciso, sobretudo, uma mudança de perspectiva dos cidadãos que hoje não estão incluídos nas disputas partidárias. O nascimento de novas lideranças, genuinamente comprometidas com os assuntos públicos, fará com que os partidos voltem a cumprir sua função na democracia. E até o 5 de outubro há uma janela de oportunidade para iniciar essa mudança.
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