Jornalista Andrade Junior

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Cartas em produtos chineses trazem apelos desesperados

Escrito por Luis Dufaur 
Julie Keith, uma mãe do Oregon (EUA), enregelou-se ao encontrar uma carta meticulosamente oculta dentro de um pacote para Halloween “made in China” que ela comprou na loja Kmart.

Grafada num inglês trêmulo, a mensagem imergiu-a num cenário de horror pelo qual ela jamais imaginaria que pudesse passar.

O autor estava preso num campo de trabalho forçado em Masanjia, no norte da China, trabalhando 15 horas diárias durante toda a semana sob o látego de desapiedados guardas.

“Se você comprar este produto, por favor, mande esta carta para a Organização Mundial de Direitos Humanos”, leu Julie. “Milhares de pessoas na China, que sofrem a perseguição do Partido Comunista, ficar-lhe-ão gratas para sempre”.

Quanto ao preço que os comunistas pagam por sua liberdade e pela dos demais presos, Zhang diz na carta que é “quase não pagamento”, pois os 10 yuans mensais por ele referidos equivalem a 3,89 reais!


Julie encaminhou ao governo esta carta que era mais um dramático apelo à comunidade internacional para a realidade do regime escravagista chinês encravado na “reeducação através do trabalho”. A reportagem é do influente “The New York Times”.

Na realidade, a carta provinha de uma das tantas colônias penais onde não se sabe quantos críticos do governo, religiosos, simples cidadãos “caçados” para completar o número de trabalhadores e pequenos criminosos podem passar quatro anos sem julgamento segundo a lei. A galáxia do horror.
Fato singular: Zhang, 47 anos, ex-detento de Masanjia, confessou recentemente ser o autor da carta. Reconheceu que essa foi uma das mais de 20 cartas que na fábrica-prisão onde se achava confinado ele colocou em produtos destinados ao Ocidente.


Muitos ex-detentos que como Zhang conseguiram sair do universo carcerário socialista chinês descreveram um quadro de abusos estarrecedores, espancamentos frequentes e privação de sono de prisioneiros acorrentados semanas a fio em posições doloridas.

A morte de colegas por suicídio ou doenças fazia parte do pão quotidiano.
“Às vezes os guardas puxavam-me pelos cabelos, colavam na minha pele barras ligadas à eletricidade, até que o cheiro de carne queimada enchia a sala”, disse Chen Shenchun, 55, que passou dois anos num desses campos.

A maioria dos escravos-operários de Masanjia foi presa por causa de sua crença. Mas o regime os mistura com prostitutas, drogados e ativistas políticos. As violências se concentram naqueles que se recusam a renegar sua fé.

Os chefes do campo de concentração não atendem pedidos de entrevista. Também os guardas temem abrir a boca. Um deles respondeu segundo a cartilha oficial: “Não há prisioneiros aqui. São todos estudantes.”

Tampouco quiseram dar entrevista os executivos da Sears Holdings, dona da loja Kmart que vendeu o pacote com a carta. Afinal de contas, ficam parecendo escoadouros de um negócio sinistro.

Um porta-voz da empresa declarou que a investigação interna realizada após a descoberta da carta nada teria encontrado no sentido do uso de trabalho escravo nos produtos que vende. A falta de transparência informativa da empresa ficou pior quando o referido porta-voz se recusou a dar o nome da fábrica chinesa envolvida no caso.

Zhang estava proibido de ter canetas e papéis, mas surrupiou-os num escritório enquanto fazia limpeza.

Ele redigia enquanto seus colegas de cela dormiam, e escondia as cartas dentro das barras de ferro do beliche até começar a embalagem dos produtos destinados ao Ocidente.

Julie conta: “Quando abri a caixa e minha filha encontrou a carta, duvidei que fosse verdade. Mas então pesquisei no Google ‘Masharjia’ e vi que esse não era um lugar legal” – declarou.

Ela repassou a carta a um órgão governamental americano. A matéria é explosiva e a administração Obama adota uma atitude de subserviência diante das práticas inumanas chinesas.

No fim, um porta-voz do governo defendeu que casos complicados como esse levam muito tempo para serem averiguados.

Ou seja, é para nunca serem esclarecidos e nenhuma decisão proporcionada ser adotada.

Como no caso de Zhang...

Da próxima vez que o leitor for comprar algum produto chinês, pense na tragédia que pode estar levando para casa.

 
Luis Dufaur
, escritor, edita o blog Pesadelo Chinês.


 

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