O tempero de Donadon - DENISE ROTHENBURG
O caso do deputado Natan Donadon, de Rondônia, mereceria uma dissertação de mestrado no sentido de entender o que se passa na cabeça dos políticos. No início da quarta-feira, ninguém apostava que ele seria "absolvido" por seus colegas. Mas, passadas as primeiras 24 horas, era possível vislumbrar o que levou um presidiário a manter o seu mandato. Donadon ganhou na política. E nas próximas linhas você descobrirá o porquê.
A lição número um para
sensibilizar os colegas parlamentares foi agir com humildade e ter a
coragem de enfrentar o camburão. Só ali, ele conquistou uns votinhos,
mas o que provocou as 41 abstenções, a maioria decidida de última hora,
foram os 40 minutos em que o congressista ocupou a tribuna da Câmara.
Dramalhões à parte, com
citação da família e etc., Donadon foi crescendo a cada minuto que
falava. O discurso cirúrgico bateu exatamente naquilo que cala fundo aos
parlamentares: o Ministério Público, instituição da qual os
parlamentares, salvo raras exceções, reclamam quase que diariamente.
Este ano, por exemplo, os deputados e senadores só não restringiram os
poderes de investigação do Ministério Público por causa das
manifestações de junho.
Para quem não se lembra,
vale um parêntese: em junho, estava em discussão a Proposta de Emenda
Constitucional (PEC) 37, de autoria do deputado Lourival Mendes
(PTdoB-MA). A PEC definia que as investigações seriam de
responsabilidade da polícia e não do MP, a quem cabe fazer as denúncias
de cada caso. A proposta seria aprovada, não fosse a presença maciça de
jovens na porta do Congresso Nacional naqueles dias de outono.
Em seu discurso, Donadon
usou e abusou de expressões para atacar o MP e se colocar como vítima
dos procuradores de Rondônia que apuraram o desvio de recursos na
Assembleia Legislativa do Estado. "Entraram, arrombaram, invadiram",
disse ele ao se referir à apreensão de documentos na Assembleia
estadual. Mencionou ainda que, se os procuradores quisessem, poderiam
ter investigado as empresas envolvidas, mas não o fizeram com o intuito
de condená-lo. "O MP diz que fui cooptado. Quem cooptou foi o MP",
afirmou.
Dada a quantidade
expressiva de deputados que se considera vítima do ímpeto dos
procuradores, não foi tanta surpresa a absolvição. Quem ouviu
atentamente seu discurso concluiu na hora que muitos ali se
identificaram. Isso, somado à vontade dos deputados de mandar um recado
ao Supremo Tribunal Federal (STF)
sobre quem manda no parlamento, foi como juntar a fome à ânsia de
comer. Tanto é que, quem tiver curiosidade de verificar as ausências em
plenário por partido, verá que não houve uma única legenda responsável
pela absolvição. A média foi de 20% de ausências por partido, o que,
grosso modo, tem relação direta com o percentual de deputados que têm
alguma restrição ao Ministério Público.
Por falar em responsável.
Em conversas reservadas,
muitos debitam a absolvição de Donadon na conta do presidente da
Câmara, Henrique Eduardo Alves, que começou a sessão tarde da noite,
numa semana em que o plenário ficaria restrito a debates na
quinta-feira, sem que fosse obrigatório o registro da presença. Isso
permitiu que muitos voltassem a seus estados ainda na quarta-feira à
noite, contribuindo para as ausências.
Há quem diga ainda que a data para votar o processo de Donadon foi mal escolhida, uma vez que estamos a oito dias do
Sete de Setembro e da
perspectiva de uma grande manifestação. Agora, com a manutenção do
mandato, há quem aposte em um aumento no número de pessoas dispostas a
participar dos protestos por todo o país, especialmente, em Brasília.
Talvez, se Henrique Eduardo Alves estivesse esperado passar o Dia da
Independência ou a aprovação do voto aberto para efeito de cassação de
mandato, o resultado tivesse sido outro.
Enquanto isso, no Planalto.
Quem observa tudo a
distância é a presidente Dilma Rousseff. Dentro do governo e do
parlamento, muitos consideram que o resultado em favor de Donadon é para
desviar a atenção dos manifestantes no Dia da Pátria. Não se
surpreendam se, em vez dos protestos serem dirigidos ao Poder Executivo,
as palavras de ordem e os cartazes centrarem fogo sobre o Congresso
Nacional. Aliás, leitor, pode reparar que, todas as vezes em que os
congressistas decepcionam um pouco mais os eleitores, a turma do
Planalto fica bem na fita. E, para sorte da presidente Dilma, quem
comanda o parlamento é o PMDB, que dia sim e outro também se desgasta
perante o eleitorado e fica mais dependente do governo para se manter no
poder e eleger bancada. Mas essa é outra história.
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