Jornalista Andrade Junior

FLOR “A MAIS BONITA”

NOS JARDINS DA CIDADE.

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CATEDRAL METROPOLITANA DE BRASILIA

CATEDRAL METROPOLITANA NAS CORES VERDE E AMARELO.

NA HORA DO ALMOÇO VALE TUDO

FOTO QUE CAPTUREI DO SABIÁ QUASE PEGANDO UMA ABELHA.

PALÁCIO DO ITAMARATY

FOTO NOTURNA FEITA COM AUXILIO DE UM FILTRO ESTRELA PARA O EFEITO.

POR DO SOL JUNTO AO LAGO SUL

É SEMPRE UM SHOW O POR DO SOL ÀS MARGENS DO LAGO SUL EM BRASÍLIA.

sábado, 31 de agosto de 2013

Apagões revelam precariedade da infraestrutura

Apagões revelam precariedade da infraestrutura - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO -
O sistema interligado tem muitos méritos, mas fica vulnerável quando deixam de ser feitas inversões só para assegurar tarifas mais baixas, por motivos políticos



Nove grandes apagões de energia elétrica no atual governo não podem ser vistos como mera coincidência ou obra do acaso. O sistema interligado nacional de eletricidade tem muitos méritos, pelo fato de permitir a transferência de energia de uma região para outra, muito importante em um país com as dimensões continentais do Brasil, devido aos regimes regimes hidrológicos diferenciados.

Como a base do sistema é a geração de energia por hidrelétricas, em determinadas épocas do ano há excedente de água em alguns subsistemas enquanto falta em outros. A interligação permite, então, o uso racional dos excedentes, ainda mais que a expansão da capacidade das hidrelétricas não é mais feita com reservatórios de acumulação, mas sim com a vazão natural dos rios, por exigências ambientais.

O sistema interligado chegou recentemente a Manaus e em futuro próximo estará em Macapá e em Boa Vista. Não haverá mais capital brasileira que dependa de um sistema isolado de eletricidade. A qualidade da eletricidade fornecida tende a melhorar nessas cidades.

Mas, considerando-se as longas distâncias nas quais a energia é transmitida, tal sistema interligado passa a ser mais vulnerável a acidentes. Para que se possa reduzir os riscos, os subsistemas devem ter condições de se isolar por algum tempo, com apoio na geração local de energia, especialmente por usinas térmicas (até mesmo emergenciais). E dentro dos subsistemas, outros isolamentos deveriam estar também previstos.

Tecnicamente isso é possível, e em diversas ocasiões os responsáveis pelo sistema interligado conseguiram fazer esse isolamento, quando os acidentes não foram tão relevantes para o conjunto do setor.

No entanto, como se viu neste último apagão no Nordeste, em que praticamente todas as capitais da região ficaram sem energia por horas, basta que em um estado o subsistema se torne inoperante para que o resto entre em sobrecarga e se desligue, por precaução.

O enorme transtorno e os prejuízos causados por esse tipo de apagão têm um custo bem superior aos investimentos necessários para se eliminar as vulnerabilidades do sistema interligado. Não é subtraindo esses investimentos na infraestrutura que as autoridades governamentais, que ditam a política energética do país, vão conseguir assegurar tarifas mais baixas no fornecimento de eletricidade, como tem prometido a presidente Dilma.

Tarifas módicas de energia elétrica não podem ser resultado de decisões que aumentem a vulnerabilidade técnica do setor ou que o impeçam de ser sustentável econômica e financeiramente com o passar do tempo, ainda mais em uma área que é preciso estar sempre com o visor voltado pra o futuro.

Um governo em apuros

Um governo em apuros - ROGÉRIO FURQUIM WERNECK

O GLOBO -

Em seis meses, o governo passou do triunfalismo de fevereiro à indisfarçável apreensão, que agora se vê em Brasília, com a longa e problemática travessia dos 13 meses que ainda faltam para as eleições de 2014.

No início do ano, embalado pela comemoração de uma década de conquista da Presidência, o PT pretendia estender os festejos por todo o ano de 2013, com a realização de dez grandes eventos nas maiores cidades do País. Há cerca de um mês, contudo, foi discretamente anunciado pelo partido que o último evento seria o de Salvador, no fim de julho. Os demais seriam cancelados. Interrupção tão abrupta das comemorações bem ilustra a rapidez da mudança de clima por que vem passando o governo.

Em fevereiro, o Planalto ainda alimentava a fantasia de que, após dois anos de crescimento econômico pífio, 2013 poderia ser o ano da virada. A ideia era assegurar a retomada da economia, a qualquer custo, e, na medida do possível, manter a inflação sob controle, com a adoção de medidas casuísticas de desoneração. Mas essas esperanças esvaíram-se ao longo dos últimos meses.

Em abril, com a inflação já no teto da meta, o governo se viu obrigado a conter a gritante perda de credibilidade do Banco Central e dar sinal verde para novo ciclo de alta da taxa de juros. No fim do primeiro semestre, as perspectivas de recuperação da economia tornaram-se ainda menos promissoras, na esteira do aumento de incerteza que adveio da onda de protestos de junho e da crescente perda de confiança na condução da política econômica.

Nos últimos dois meses, o que parecia ser apenas um quadro macroeconômico pouco promissor vem evoluindo para uma situação bem mais difícil, marcada por preocupante redução de espaço de manobra na condução da política econômica. Em grande medida, o estreitamento de possibilidades decorre do vigor da depreciação cambial que tem sido induzida pela perspectiva de mudança da política monetária americana e agravada pela perda de credibilidade da política econômica no Brasil.

Se não puder ser revertida, a depreciação do câmbio deverá impor ao governo escolhas muito mais duras na condução da política de metas para inflação. E é bem provável que, ao fim e ao cabo, o governo, com uma eleição pela frente, se veja obrigado a conviver com uma combinação de taxa de juros, crescimento e inflação bem mais desfavorável do que imaginava possível há alguns meses.

As escolhas poderiam ser menos adversas se o governo estivesse de fato disposto a restaurar a credibilidade da política fiscal. Mas tudo indica que lhe falta um requisito básico para fazer um movimento crível nesse sentido: convicção de que isso é efetivamente necessário.

O máximo que o governo se dispõe a fazer nessa linha é prometer, de pés juntos, que não voltará a recorrer à lamentável alquimia contábil que tem conspurcado o registro das contas públicas nos últimos anos. Mas nem mesmo isso é crível. Basta constatar, por exemplo, que, poucas semanas depois de ter ensaiado esse tipo de promessa, o governo já aventou a possibilidade de excluir gastos com projetos de mobilidade urbana da contabilidade da dívida dos governos subnacionais.

A esta altura, qualquer esforço sério de restauração da credibilidade da política fiscal exigiria mudança da equipe econômica. Algo que o governo obviamente não está disposto a fazer. Não obstante o lamentável desempenho da economia e a extensão do descrédito da política fiscal, a presidente não parece ter intenção de fazer qualquer alteração maior na equipe econômica, seja na Fazenda, seja no Tesouro, seja no BNDES.

Isso sugere que o problema de falta de credibilidade da política econômica é de solução bem mais difícil do que em geral se pensa. É preciso levar mais a sério o que diz a presidente Dilma, quando se dá ao trabalho de esclarecer, com todas as letras, que, na verdade, a central de formulação e condução da política econômica está instalada no terceiro andar do Palácio do Planalto. Só não entende quem não quer.

O tempero de Donadon

O tempero de Donadon - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE -

O caso do deputado Natan Donadon, de Rondônia, mereceria uma dissertação de mestrado no sentido de entender o que se passa na cabeça dos políticos. No início da quarta-feira, ninguém apostava que ele seria "absolvido" por seus colegas. Mas, passadas as primeiras 24 horas, era possível vislumbrar o que levou um presidiário a manter o seu mandato. Donadon ganhou na política. E nas próximas linhas você descobrirá o porquê.

A lição número um para sensibilizar os colegas parlamentares foi agir com humildade e ter a coragem de enfrentar o camburão. Só ali, ele conquistou uns votinhos, mas o que provocou as 41 abstenções, a maioria decidida de última hora, foram os 40 minutos em que o congressista ocupou a tribuna da Câmara.
 Dramalhões à parte, com citação da família e etc., Donadon foi crescendo a cada minuto que falava. O discurso cirúrgico bateu exatamente naquilo que cala fundo aos parlamentares: o Ministério Público, instituição da qual os parlamentares, salvo raras exceções, reclamam quase que diariamente. Este ano, por exemplo, os deputados e senadores só não restringiram os poderes de investigação do Ministério Público por causa das manifestações de junho.
Para quem não se lembra, vale um parêntese: em junho, estava em discussão a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37, de autoria do deputado Lourival Mendes (PTdoB-MA). A PEC definia que as investigações seriam de responsabilidade da polícia e não do MP, a quem cabe fazer as denúncias de cada caso. A proposta seria aprovada, não fosse a presença maciça de jovens na porta do Congresso Nacional naqueles dias de outono.
Em seu discurso, Donadon usou e abusou de expressões para atacar o MP e se colocar como vítima dos procuradores de Rondônia que apuraram o desvio de recursos na Assembleia Legislativa do Estado. "Entraram, arrombaram, invadiram", disse ele ao se referir à apreensão de documentos na Assembleia estadual. Mencionou ainda que, se os procuradores quisessem, poderiam ter investigado as empresas envolvidas, mas não o fizeram com o intuito de condená-lo. "O MP diz que fui cooptado. Quem cooptou foi o MP", afirmou.
Dada a quantidade expressiva de deputados que se considera vítima do ímpeto dos procuradores, não foi tanta surpresa a absolvição. Quem ouviu atentamente seu discurso concluiu na hora que muitos ali se identificaram. Isso, somado à vontade dos deputados de mandar um recado ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre quem manda no parlamento, foi como juntar a fome à ânsia de comer. Tanto é que, quem tiver curiosidade de verificar as ausências em plenário por partido, verá que não houve uma única legenda responsável pela absolvição. A média foi de 20% de ausências por partido, o que, grosso modo, tem relação direta com o percentual de deputados que têm alguma restrição ao Ministério Público.

Por falar em responsável.
Em conversas reservadas, muitos debitam a absolvição de Donadon na conta do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, que começou a sessão tarde da noite, numa semana em que o plenário ficaria restrito a debates na quinta-feira, sem que fosse obrigatório o registro da presença. Isso permitiu que muitos voltassem a seus estados ainda na quarta-feira à noite, contribuindo para as ausências.
Há quem diga ainda que a data para votar o processo de Donadon foi mal escolhida, uma vez que estamos a oito dias do
Sete de Setembro e da perspectiva de uma grande manifestação. Agora, com a manutenção do mandato, há quem aposte em um aumento no número de pessoas dispostas a participar dos protestos por todo o país, especialmente, em Brasília. Talvez, se Henrique Eduardo Alves estivesse esperado passar o Dia da Independência ou a aprovação do voto aberto para efeito de cassação de mandato, o resultado tivesse sido outro.

Enquanto isso, no Planalto.
Quem observa tudo a distância é a presidente Dilma Rousseff. Dentro do governo e do parlamento, muitos consideram que o resultado em favor de Donadon é para desviar a atenção dos manifestantes no Dia da Pátria. Não se surpreendam se, em vez dos protestos serem dirigidos ao Poder Executivo, as palavras de ordem e os cartazes centrarem fogo sobre o Congresso Nacional. Aliás, leitor, pode reparar que, todas as vezes em que os congressistas decepcionam um pouco mais os eleitores, a turma do Planalto fica bem na fita. E, para sorte da presidente Dilma, quem comanda o parlamento é o PMDB, que dia sim e outro também se desgasta perante o eleitorado e fica mais dependente do governo para se manter no poder e eleger bancada. Mas essa é outra história.

STF e Congresso nos seus labirintos

STF e Congresso nos seus labirintos - MERVAL PEREIRA

O GLOBO -

A situação criada pela decisão da Câmara de não cassar o mandato de Natan Donadon, condenado pelo STF a 13 anos de prisão pelos crimes de formação de quadrilha e peculato, por desvios na Assembleia de Rondônia, poderá repercutir no julgamento do mensalão, mas dificilmente alterará o entendimento sobre o tema já na próxima semana, quando será julgado embargo de declaração do deputado João Paulo Cunha.

Caso o plenário admita os embargos infringentes, aí sim, é quase certo que tanto as decisões sobre cassação de mandatos quanto formação de quadrilha serão alteradas, favorecendo os condenados, em especial os membros do núcleo político.
Essa será uma mistura politicamente explosiva, provocada pela posição dos dois novos ministros, Roberto Barroso e Teori Zavascki, que mudaram a jurisprudência do STF nos dois casos.
Embora a maioria dos ministros não veja espaço para uma alteração desse tipo nesta fase, pois os embargos de declaração têm abrangência muito restrita, há pelo menos dois precedentes no STF em que a jurisprudência do tribunal foi atualizada através de embargos de declaração. O entendimento sobre formação de quadrilha, por exemplo, não foi atualizado nessa etapa, mesmo que tenha sido modificado.
Os votos de Barroso e Zavascki mudaram o entendimento do STF quanto à cassação de mandatos no julgamento do caso do senador Ivo Cassol, fazendo com que a decisão final passasse a ser do Congresso. No julgamento do mensalão, a Corte havia decidido pela perda dos direitos políticos dos condenados, o que levaria automaticamente à cassação do mandato de acordo com o parágrafo IV do artigo 55 da Constituição.
Nos dois casos fora do mensalão, há essa diferença crucial: as penas não se referiam à perda dos direitos políticos, e, portanto, abriu-se uma brecha para que fosse usado o artigo VI do mesmo artigo 55 da Constituição, que determina que perderá o mandato o deputado ou senador "que sofrer condenação criminal em sentença transitada".
Nesse caso, a cassação do mandato, em vez de ser automática, dependeria de votação secreta do plenário. Acontece que, de acordo com artigo 15 da Constituição, a perda ou suspensão dos direitos políticos acontece devido a (...) III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos.
Como não é possível haver um deputado ou senador sem os direitos políticos, a cassação do mandato é automática.
Tanto é verdade que o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves, ao constatar que o plenário se inclinaria para salvar o mandato do deputado condenado e já preso na Papuda, decidiu que ele não poderia exercer o mandato da cadeia e convocou imediatamente seu suplente.
Na verdade, a Mesa Diretora da Câmara não quis assumir a cassação do mandato de um par e acreditou no bom senso do plenário, e deu no que deu. Há diversas versões para o que aconteceu no plenário
da Câmara na noite de quarta-feira, desde a conjunção de interesses variados - os evangélicos salvaram "um irmão", os deputados que já tiveram ou têm problemas com o Ministério Público votaram em seu próprio benefício, muitos tiveram uma mera atitude corporativa, votando contra, não comparecendo ou abstendo-se de votar.
Mas há também a teoria conspiratória de que tudo não passou de um ensaio para os petistas sentirem a tendência do plenário quando chegar a hora de decidir sobre os mandatos dos mensaleiros condenados pelo Supremo. Se foi isso, o tiro pode ter saído pela culatra, pois a reação dos que se indignaram com a decisão final foi apressar a votação da emenda constitucional que acaba com o voto secreto para cassação de mandatos e outros votos no Congresso.
Além disso, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, garante que não colocará mais em votação casos de cassação até que acabe o voto secreto, o que faria, no limite, que os políticos condenados no julgamento do mensalão passassem a cumprir suas penas ao fim do julgamento, ainda investidos do mandato parlamentar.

Suicídio

Suicídio - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP -

BRASÍLIA - Ninguém trata tão mal os políticos quanto os próprios políticos. Nem mesmo o mais ácido crítico teria tanta eficácia quanto Suas Excelências ao corroer a imagem de deputados, de senadores e, pior, do Congresso Nacional.

Há inúmeros adjetivos, além de expressões impublicáveis, para definir a decisão de quarta-feira à noite, absolvendo o presidiário Natan Donadon da cassação de mandato, mas um só basta: é inacreditável.

Os parlamentares que votaram a favor de Donadon, abstiveram-se ou ausentaram-se sem bons motivos deixam uma dúvida. Se eles são colegas de Donadon na corporação Congresso ou deveriam ser na corporação Papuda, onde o parlamentar-presidiário está preso, com uma condenação de mais de 13 anos por formação de quadrilha e desvio de dinheiro público, o popular roubo.

Para tentar contornar o clima de enterro da instituição, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, saca uma solução heterodoxa e sem respaldo no regimento, declarando o afastamento de Donadon e a convocação de seu suplente, Amir Lando. Está criada a seguinte situação: Donadon não é deputado, mas é; Lando é deputado, mas não é.

E, numa tentativa patética de reduzir as labaredas na opinião pública, o presidente do Senado, Renan Calheiros, desfralda uma "saída célere" anunciando a votação da PEC 18, que determina a perda automática de mandato, sem votação do Legislativo, em caso de condenação por improbidade administrativa e crime contra a administração pública.

Ah! Todos, claro, berram pelos salões, corredores e comissões contra o instituto do voto secreto para a cassação de parlamentares. Quem quiser se igualar a condenados, que vote pelo menos às claras.

Agora, porém, tudo isso é secundário, porque Inês é morta e Donadon está bem vivo. Mas, se alguém acha que isso pode ajudar Genoino, João Paulo Cunha e Costa Neto, está muito enganado. Ou será que não?

O que ele admira é a ditadura







Fonte: Revista VEJA - edição Nº 2337 - 31/08/2013

Maioria licenciosa

Maioria licenciosa - DORA KRAMER

O ESTADÃO -

O que dizer diante da decisão da Câmara de preservar o mandato de Natan Donadon, ora em cumprimento de pena no Presídio da Papuda (DF) por desvio de dinheiro público e formação de quadrilha?

Se ele mesmo se surpreendeu – “Não acredito!”, reagiu – com o resultado da votação secreta (233 votos pela cassação, 131 pela absolvição e 41 abstenções), é de se ressaltar o caráter espantoso da decisão.

O aparentemente impossível, no Parlamento acontece. Parecia óbvio que suas excelências não cometeriam tal abuso: mais que uma agressão aos fatos, um desrespeito ao Judiciário que o condenou a 13 anos de prisão e uma afronta ao próprio Legislativo que admitiu, assim, a compatibilidade entre o exercício do mandato e a condenação penal.

Durante o dia a cassação era dada como certa. De noite, na sessão em que Donadon foi autorizado a tirar as algemas para apresentar sua defesa, nenhum discurso em prol da absolvição. Apurados os votos, contudo, emergiu a força da maioria silenciosa e, por ação e omissão, licenciosa.

Houve maior número de votos pela condenação, mas somadas as abstenções, os ausentes (108) e os favoráveis à preservação do mandato, chegamos a 280 deputados em apoio a Donadon contra 233. Faltaram 24 votos para o alcance do quórum necessário (257) à cassação.

O presidente da Câmara, Henrique Alves fez o gesto inútil de declarar afastado do cargo o deputado que já estava afastado, confinado a uma cela desde o dia 28 de junho e, não obstante, será “excelência” ainda por um ano e meio. A maior parte de seus pares fez isso confiando na proteção do sigilo. Atingiram a todos, inevitavelmente nivelados por baixo.

O resultado não seria o mesmo se a votação fosse aberta. Nem a Câmara precisaria arcar com o inevitável acréscimo em seu robusto patrimônio de desgaste se tivesse optado pelo artigo da Constituição que determina a perda do mandato para os condenados em ações penais, e não pelo dispositivo que transfere a última palavra ao Legislativo.

As duas questões já poderiam ter sido resolvidas, caso houvesse interesse real em resolvê-las com a aprovação do fim do voto sigiloso em processos de cassação e da emenda que prevê a perda automática de mandato para condenados, ambas as propostas em tramitação no Congresso.

Mas, como ficou claro na exorbitante decisão da noite de quarta-feira, a maioria no Legislativo não está preocupada em corrigir nada. Aliás, está pouco ligando para coisa alguma que não seja a causa própria, neste caso a autoproteção.

Está criado o precedente para que os condenados no processo do mensalão continuem deputados até o início de 2015, independentemente de o Supremo Tribunal Federal daqui até lá determinar ou não o cumprimento das sentenças.

Os quatro, José Genoino, Pedro Henry, João Paulo Cunha e Valdemar Costa Neto estavam ausentes da sessão, engrossando a tropa dos que ajudaram a absolver o condenado fazendo da Câmara merecedora do troféu vergonha alheia do ano.

Los médicos

Los médicos - LUIZ GARCIA

O GLOBO - A opinião pública talvez esteja solidária com eles. Ela certamente quer mais médicos no país


O programa Mais Médicos não pode ser condenado pelo nome. Ninguém deveria ser contra uma iniciativa que aumente o atendimento aos doentes brasileiros.

Mas é compreensível a irritação dos nossos doutores com a importação, pelo Ministério da Saúde, de profissionais, quase todos cubanos, provocando nos profissionais brasileiros a desconfiança, ou mesmo a certeza, de que o governo não os considera capazes de cuidar da saúde do nosso povo.

Mesmo assim, não é possível aplaudir as vaias e insultos contra os médicos estrangeiros que estão sendo treinados em Fortaleza esta semana. O sindicato local dos profissionais brasileiros, responsável pela manifestação, afirmou que o protesto era apenas contra o Ministério da Saúde, O que pode ser verdade — mas vaia não tem rótulo, e os profissionais importados, todos cubanos, têm direito a se sentirem injustamente insultados.

E a opinião pública talvez esteja solidária com eles. Ela certamente quer mais médicos no país — desde, é claro, que o Ministério da Saúde não se esqueça de providenciar intérpretes em quantidade e qualidade adequadas.

Outra providência oficial obviamente necessária é um diálogo inteligente com os profissionais brasileiros. Não será acusando-os de xenofobia — como fez o ministro da Saúde, Alexandre Padilha — que se resolverá o problema. Inclusive porque os médicos brasileiros insistem em afirmar que seu protesto não era contra os estrangeiros, e sim contra o Ministério da Saúde. Segundo o presidente do Sindicato dos Médicos do Ceará, José Maria Pontes, ninguém vaiou os cubanos: o alvo era apenas o Ministério da Saúde. Mas é óbvio que os estrangeiros se sentiram atingidos pela reação dos colegas brasileiros à sua presença.

Parece ser uma boa ideia a sugestão dos brasileiros de que os seus colegas estrangeiros sejam submetido ao Revalida, que é um exame nacional de validação do diploma dos médicos. E ninguém falou nisso, mas é obviamente necessário resolver o problema do idioma.

No fim das contas, é obviamente necessário aumentar e melhorar o atendimento aos nossos doentes — principalmente no interior do país. Desde, é claro, que o paciente e o médico entendam claramente o que um e outro estão dizendo.

Colhendo os frutos da violência

Colhendo os frutos da violência - FERNANDO GABEIRA


O ESTADO DE S. PAULO -

A presença no interior do País, que alguns jornalistas chamam de Brasil profundo, às vezes me deixa em dúvida se estou levando em conta todos os dados possíveis da realidade. Será que tudo o que estou vendo é só um refluxo do movimento de massas e a ocupação do terreno por grupos radicais que usam a violência como um instrumento pedagógico?
Usei um verso de Drummond para definir os acontecimentos de junho: nasce uma flor no asfalto. E disse que seu maior inimigo era a violência, que terminaria por esvaziar as mas e fortalecer o lado que se pretende combater. Não pensava em nada do tipo conselho aos jovens. Apenas dizia que é ilusão supor que a História recomeça do zero. Vive na minha memória, e de todos os sobreviventes dos anos 6o, a lembrança dos acontecimentos que resultaram na luta armada e no fortalecimento da ditadura militar.
Os grampos que se radicalizam na maré baixa dos movimentos acreditam estar mantendo o espírito e preparando nova investida. No 7 de Setembro, quem sabe? Tenho algumas razões para discordar dessa tática, para além da pura e simples objeção à violência. Claro que não me importo com os mal-entendidos nem espero indulgência dos críticos. Valho-me do sentido da realidade que às vezes abandona os grupos radicais quando as mas se esvaziam e só ouvimos o barulho do trânsito.
Nas ruas multidões portavam cartazes dizendo: "Desculpem o transtorno, estamos mudando o Brasil. As pessoas viam isso com tolerância, pois era verossímil que tamanha energia concentrada pudesse mudar o País. O mesmo não vale para um grupo de vanguarda, pois é difícil atribuir capacidade de modificar o País a círculos isolados que se escondem sob máscaras e destroem símbolos do capitalismo.
Essas ações pedagógicas são  realizadas na esperança de que I se universalizem, de que outros  as sigam e todos juntos destruam o sistema. Por essa esperança as pessoas se arriscam a ser presas. Acham que mais cedo ou mais tarde vingarão os frutos de sua ação pedagógica. O difícil é ver o tempo passando no cárcere e perceber que tudo aquilo era uma ilusão, constatar que a maioria esmagadora segue rejeitando a violência como forma de luta política.
É preciso passar um tempo  no cárcere, comprometer a própria vida, para aprender essa lição elementar? Pode ser que entre os que queimam e destroem haja alguns que o façam por uma simples explosão nervosa. Mas os que organizam sistematicamente e consideram a tática correta estão jogando conscientemente com o próprio futuro.
Cansei de ver quebra-quebras em Berlim no 1.° de Maio. Sempre os mesmos, sempre na  mesma loja de departamentos.
 E a Alemanha segue seu rumo.

Os políticos agora refluíram e  a polícia brasileira parece indecisa sobre o que fazer com a violência que sobrevive no rescaldo das grandes manifestações. Os políticos temem a eleição, sabem que, mesmo calados, terão dificuldades em 2014. Por que se pronunciar e afastar mais a chance de voltar ao cargo?
Os resultados da baixa maré são claros. As bandeiras principais dos movimentos foram enfraquecidas. O governo recupera gradualmente o prestígio perdido. Não importa se o gigante acordou ou voltou a dormir. Vamos supor como correta a inversão daquela frase comum: quanto mais as coisas ficam as mesmas, mais elas mudam. Ainda não sabemos o impacto que o movimento de junho deixou na consciência de muitos. A pura observação nos autoriza a dizer que se buscava mais a condenação da política do que propriamente uma alternativa. Não só continuaram insolúveis alguns problemas na área política, como se acentuaram os indícios de que a ilusão de prosperidade sustentada foi para os ares.
A queda do real é só mais um capítulo da queda na realidade. Espera-se um aumento da gasolina e com ele mais aperto no bolso, apesar de sua correção. A sensação de crise econômica ; aos poucos vai se impondo à euforia da prosperidade, mas não há nenhuma esperança, no momento, de que possa ser superada por uma visão correta do atual governo.
A política externa brasileira continua sendo a política de um partido. Foi preciso que um jovem diplomata arrancasse um asilado de um quarto da embaixada em La Paz e fugisse com ele para o Brasil. No episódio da prisão dos torcedores corintianos, o mesmo diplomata, Eduardo Saboia, se esforçou para atendê-los enquanto as negociações com Evo Morales patinavam.
Estive na Bolívia para cobrir a revolta dos índios contra a construção de uma estrada na região Amazônica com financiamento do BNDES. Dois governos que se dizem populares se meteram numa aventura altamente impopular. Alguns adeptos do PT acham que é preciso falar fino com a Bolívia e grosso com os EUA. Será que a maioria da Nação realmente se sente paternal diante da Bolívia e ofendida diante dos EUA?
Com todos os descaminhos do governo é preciso contar apenas com novas manifestações? Elas têm um grande poder, mas já não somos inocentes sobre seu alcance real. Os políticos encenam um esforço concentrado, esperam o refluxo do movimento e caem, de novo, nas mesmas práticas repulsivas.
As grandes manifestações de junho tiveram o poder de revelar a incapacidade do sistema político no conjunto, a incompetência do governo e a repulsa à corrupção. Está na hora de valorizar não só o protesto, mas a busca de alternativas reais para o País. O crescimento dos últimos anos, apoiado numa bolha de consumo, parece ter chegado ao fim. A mediocridade do governo fica mais clara ainda.
Manifestações são vitais, mas a História é mais parecida com maratona do que tiro de cem metros. E a política, uma navegação que requer conhecimento dos mares, rochedos, portos a serem alcançados e as dificuldades do caminho. Estamos à deriva. Tal como na Espanha, sabemos o que as pessoas não querem. Prevemos altos índices de voto nulo. Cairá a legitimidade do poder político. Saída mesmo ainda não se vê no horizonte.

Diplomata inteligente se refugia na literatura

Diplomata inteligente se refugia na literatura - SILVESTRE GORGULHO


CORREIO BRAZILIENSE -
O Correio Braziliense, edição de 27 de agosto, foi duro e verdadeiro em sua manchete: "Crise joga Itamaraty no inferno". O jornal da capital da República aborda com mais propriedade e mostra os fatos que estão na mídia do mundo inteiro. - O senador Roger Pinto Molina, depois de 450 dias asilado na Embaixada do Brasil, em La Paz, encontrou a liberdade pelas mãos do diplomata Eduardo Saboia, que, numa viagem dramática de 22 horas, rodou 1.600km e chegou ao Brasil quase sem gasolina.
- Antes, o embaixador brasileiro na Bolívia, Marcel Biato, havia sido afastado do posto em La Paz por exigência do presidente Evo Morales.
- A presidente Dilma Rousseff decidiu demitir o ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, por perceber que ele não estava indignado o suficiente com o episódio...
- A jornalista Miriam Leitão faz um comentário ácido: A presidente Dilma bateu boca com um diplomata "e, pior, ao negar o que ele disse, acabou confirmando...".
- O embaixador boliviano no Brasil, Jerjes Talavera, lavou as mãos e disse que a demissão do chanceler Antônio Patriota é um "problema interno do Estado brasileiro".
- Os atos de força de Evo Morales contra o Brasil são constantes: ele mandou revistar o avião do ministro Celso Amorim e invadiu, de surpresa, as refinarias da Petrobras com tropas do exército boliviano.
Não sei por que o governo brasileiro é tão cordato com Evo Morales, com as Farc, com Cuba e tão parceiro das sangrentas e corruptas ditaduras africanas. Sim, já perdoou as dívidas do Congo, do Sudão, da Guiné Equatorial e do Gabão. Agora o governo quer a aprovação da liquidação das dívidas de Zâmbia, Tanzânia, Costa do Marfim e República Democrática do Congo. O perdão da dívida desses países soma mais ou menos R$ 1,8 bilhão.
A população desses países é pobre. Mas os ditadores são biliardários. Por exemplo: Teodorin, filho mais velho e possível sucessor do ditador Oblang (Guiné Equatorial), gastou num só leilão de arte na Christie"s, em Paris, o dobro da sua dívida com o Brasil. E comprou uma mansão em Malibu, na Califórnia, de 48,5 mil metros quadrados, ou seja, 15% do tamanho de Ipanema, no Rio.
É bom ficar claro: o governo federal perdoa a dívida, mas é cada um dos 201.032.714 brasileiros que paga a conta. No rateio, são R$ 8,95 por pessoa.
Eu fiz esta abertura toda para voltar no tempo. Li uma entrevista que Clarice Lispector fez para o jornal Última Hora com a escultora e embaixatriz Maria Martins, mulher do diplomata Carlos Martins.
Maria Martins, mineira de Campanha, no sul de Minas, é uma das artistas mais premiadas na Bienal de São Paulo. Era amiga de artistas como Picasso, Mondrian e do pintor e escultor franco-estadunidense Marcel Duchamp. Suas esculturas, que estão espalhadas pelos principais museus do mundo, têm uma característica muito forte, por apresentar formas orgânicas, contorcidas e sensuais. São inspiradas em culturas arcaicas e nas lendas amazônicas. Ela foi destaque na Corcoran Gallery of Art, em Washington, e o Museu de Arte Moderna de Nova York, o MoMa, tem obras sua.
Tendo acompanhado o marido embaixador em vários países e convivido com reis, rainhas e artistas de primeira grandeza, Maria Martins, ao dar essa longa entrevista para Clarice Lispector, foi direto ao ponto, logo na primeira pergunta, justamente sobre a importância atual da diplomacia.
- Outrora, a vida diplomática era uma beleza. O embaixador representava seu governo. A responsabilidade era total. Hoje, a diplomacia é uma droga. O diplomata não passa de um caixeiro-viajante para vender café, meia de náilon etc.
E mais: "Quando o embaixador tem uma vitória política, se por acaso acontece, é do governo. Quando tem um fracasso, é dele, diplomata".
Mais interessante, ainda, é que Maria Martins termina sua resposta com uma pergunta para a entrevistadora, que também era mulher de diplomata:
- E você, Clarice, qual é a sua experiência de vida diplomática, você que é uma mulher inteligente?
- Não sou inteligente, sou sensível, Maria. E, respondendo à sua pergunta: eu me refugiei em escrever.
Clarice Lispector volta ao tema: "E como você conservou sua espontaneidade, mesmo depois de uma longa carreira de mulher de diplomata, o que é raríssimo?".
Maria Martins não pestanejou: "Eu respondo como você: porque eu me refugiei na arte".
A pergunta que deixo é simples. Dada a facilidade de encontros pessoais e de comunicação on-line entre presidentes, chefes de Estado e chanceleres, que papel têm hoje os diplomatas? Será que os diplomatas inteligentes têm mesmo que se refugiarem na literatura e na arte?

A cidade é deles

A cidade é deles - RUY CASTRO

FOLHA DE SP -

RIO DE JANEIRO - Outro dia, pelo calçadão do Arpoador, vinham dois "black blocs" no rigor dos trinques: coturno, calças, mochila, camiseta e jaqueta pretos, e moletom com touca idem enrolado à cabeça, deixando apenas os olhos de fora --uma espécie de burca militar, como já se disse aqui. Imagino que trouxessem consigo os adereços de mão próprios da categoria: álcool, vinagre, pedras, molotovs e máscaras contra gases --todo cuidado é pouco quando se tem a lei pela frente.

Mas não havia lei à vista, nem roupa mais imprópria para um "footing" àquela hora --três da tarde, com um sol de veranico sob o qual a dupla suava e parecia apenas exótica, não ameaçadora. Bem faz o Batman, que só sai à noite para trabalhar --sabe que, à luz do dia, sua roupa de morcego tem algo de ridícula. Por sinal, a fantasia dos "black blocs" é a mais próxima que eles acharam para substituir a de Batman --que, tudo indica, usavam até há pouco.

Nossas cidades não têm opções para se trocar de roupa em público. Donde os dois devem ter saído de casa já paramentados e cruzado no prédio com seus vizinhos e porteiros --que os conhecem desde crianças e sabem muito bem quem são. Bem provável que morassem na Vieira Souto (com os pais, naturalmente) e estivessem a caminho do acampamento armado pelos meninos do "Ocupa Delfim", no Leblon.

O fato de saírem fantasiados às ruas e com a maior naturalidade sugere que estamos nos habituando aos "black blocs". E por que não? A cidade é deles. A noite cai e a função começa. Do Leblon, seguem para o largo do Machado, onde quebram o que encontram pela frente. Destroem metade de Laranjeiras e, de lá, vão para o Castelo, a Cinelândia ou a Lapa, onde o rastro da depredação continua.

Hoje, já não passam de 200. Mas são suficientes para subjugar os demais 5.999.800 com que convivem.

O deputado presidiário é uma aberração que tem mãe, pai, padrinhos e madrinhas

AUGUSTO NUNES Direto ao Ponto

O deputado presidiário é uma aberração que tem mãe, pai, padrinhos e madrinhas

A votação que impediu a cassação do mandato de Natan Donadon, preso desde junho no presídio da Papuda, transformou a Câmara na mãe do primeiro deputado presidiário da história. O pai é o Supremo Tribunal Federal. Os padrinhos são Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Roberto Barroso e Teori Zavascki. As madrinhas são Rosa Weber e Carmen Lúcia. Eles garantiram a duvidosa honraria na sessão em que, depois da condenação do senador Ivo Cassol a uma temporada na cadeia, ficou decidido por 6 togas contra 4 que só o Congresso pode deliberar sobre cassação de mandatos.
Em dezembro, durante o julgamento do mensalão, o Supremo havia resolvido por 5 a 4 que o confisco da vaga no Senado ou na Câmara deve ocorrer automaticamente em dois casos: quando a condenação superior a um ano envolver improbidade administrativa ou quando a pena for superior a quatro anos. “Nessas duas hipóteses, a perda de mandato é uma consequência direta e imediata causada pela condenação criminal transitada em julgado”, ensinou o decano da Corte, Celso de Mello, que acompanhou os votos de Joaquim Barbosa, Marco Aurélio, Gilmar Mendes e Luiz Fux.
Na sessão que aprovou o retrocesso, Fux declarou-se impedido. Sobraram quatro. Os derrotados em dezembro viraram seis graças à adesão de Theori Zavascki, que substituiu Cezar Peluso, e Roberto Barroso, que assumiu o lugar de Ayres Britto. ”Não posso produzir a decisão que gostaria, porque a Constituição não permite”, recitou Barroso, pendurado no parágrafo 2º do artigo 55 da Constituição, que estabelece a perda do cargo “por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”.
Se tivesse optado pelo caminho da sensatez, o caçula do Supremo compreenderia que acabara de chancelar o que Gilmar Mendes batizou de “fórmula-jabuticaba”, por existir apenas no Brasil.”Não é possível um sujeito detentor do mandato cumprindo pena de cinco ou dez anos”, espantou-se Mendes. “Vossa Excelência sabe que consequência dará condenar a cinco anos e deixar a decisão final para a Congresso”, advertiu Joaquim Barbosa. “Esta Corte tem de decretar a perda do mandato, sob pena de nossa decisão daqui a pouco ser colocada em xeque”. Deu no que deu.
“Agora temos essa situação de alguém com direitos políticos suspensos, mas deputado com mandato”, ironizou nesta quinta-feira o ministro Marco Aurélio. “A Papuda está homenageada. Vai causar inveja muito grande aos demais reeducandos”. Não foi por falta de aviso. Em fevereiro de 2009, ao ser eleito corregedor da Casa dos Horrores, o deputado mineiro Edmar Moreira sucumbiu a um surto de sinceridade e contou numa frase como as coisas funcionam por lá: “No Legislativo, temos o vício insanável da amizade”. Como toda mãe, a Câmara protege também filhotes delinquentes. Por que haveria de negar socorro a Donadon?
O primeiro deputado presidiário foi parido pela Câmara. Mas a aberração só viu a luz graças à ajuda militante do pai, dos padrinhos e das madrinhas.

 


Um zumbi na Casa do Espanto

Um zumbi na Casa do Espanto - NELSON MOTTA

O GLOBO -
Donadon é o simbolo máximo do ponto mais baixo de uma instituição que, unindo o espírito de corpo ao espírito de porco, não hesita em se solidarizar com um condenado



“Não acredito”, bradou aos céus o deputado Natan Donadon, caindo de joelhos em patética pantomima, quando viu no placar da Camara 131 votos a favor, 41 abstenções e 108 bem-vindas ausências, que mantinham o seu mandato e o consagravam como o primeiro deputado-presidiário da nossa história. Que ronco das ruas que nada, eles não ouvem e não têm medo, e mais uma vez votaram, ou fugiram, em causa própria, porque também acumulam processos na Justiça e podem ser o Donadon de amanhã.

“Não a-cre-di-to” digo eu, dizemos nós, diante da cena inacreditável, mas quando se trata dos 300 picaretas que Luiz Inacio falou deve-se acreditar em tudo, porque de tudo eles são capazes. Nunca na história desse país houve um deputado-detento, mas Lula agora diz que fica puto quando falam mal de políticos.

Zoologicamente é facil identifica-los: andam em bandos, têm pelagem acaju, negro graúna ou raposa prateada, alimentam-se de verbas públicas e são pacificos e afáveis, condição necessária para seus golpes e tramoias, mas quando ameaçados podem se tornar hostis e violentos em defesa dos privilégios e impunidades do bando. Seu habitat natural é a Câmara dos Deputados.

Donadon é o simbolo máximo do ponto mais baixo de uma instituição que existe para dar voz e poder aos representantes dos eleitores, mas, unindo o espírito de corpo ao espírito de porco, não hesita em se solidarizar com um condenado pelo STF, que teve amplo direito de defesa e usou todos os recursos e chicanas para retardar o processo.

Aprendi com meu pai que é covardia tripudiar sobre os caídos, que a compaixão beneficia mais quem se compadece do que ao compadecido, que perdoar é mais leve do que carregar o saco do rancor e do ressentimento. Mas no caso desse picareta foram ele e seus colegas de trabalho que tripudiaram sobre todos os cidadãos honestos e as instituições democráticas.

E também sobre os presidiários. Reclamando da comida, da falta de água, das algemas, do camburão “escuro como um caixão”, viveu a realidade diária dos presos brasileiros, a maioria por crimes menores que os dele, que prejudicaram toda a sociedade.

China: comércio de órgãos humanos se apoia em execuções capitais

Escrito por Luis Dufaur
A Sra. Zhang pagou quase 75.000 euros (R$ 225.000 aprox.) a fim de obter em Xangai um fígado para seu marido alcoólatra.
Ela não ignora que esse órgão foi tirado de um condenado à morte: “A maioria dos órgãos provém de criminosos e nós o obtivemos por decisão de um tribunal de Justiça”, explicou ela, segundo notícia do jornal “Le Monde”.
A esposa de um outro paciente do hospital Ruijin acabava de pagar por volta de 36.000 euros por um fígado e também respondeu: “O doutor disse que o órgão era de um prisioneiro”.
Todo ano há oficialmente na China 10.000 transplantes de órgãos, 65% dos quais, em 2009, provinham de condenados a morte. Um chefe de serviço de um grande hospital de Xangai contou sob anonimato que a proporção atingia 80%.
O regime procura abafar as críticas com anúncios “humanitários” do gênero de classificação eletrônica dos doentes para evitar favoritismos, etc.
Huang Jiefu, personagem ambíguo, ex-vice-ministro da Saúde e atual diretor do Comitê chinês de doação de órgãos, garante que o governo exige “o consentimento escrito do prisioneiro e de sua família”, mas acenou para uma estranha obrigação do condenado de “devolver sua dívida social” com órgãos.
É mínimo o número de execuções praticadas na presença de um médico. A Corte Suprema exortou os juízes a aplicar nesses casos uma “justiça misturada com compaixão”. Mas, o que isso quer dizer na China?
Após a exortação, o número oficial de condenações diminui um terço. Mas os métodos de execução ficaram misteriosos.
Os hospitais de Xangai são informados em cima da hora. Quando os médicos podem chegar e ver o condenado, a morte é aplicada num local contíguo ao Tribunal.
Mas quando o Tribunal “não está equipado”, o condenado é morto numa van especialmente concebida para o “serviço”, parecida com um furgão da polícia.
A Jinguan Automobiles, empresa fabricante dessas vans-matadouro de homens, respondeu por e-mail:
“A respeito da unidade móvel de execução da pena de morte, podemos certamente produzi-la e exportá-la para o exterior. Até o presente, nossos clientes estão constituídos somente por Varas Penais em todos os níveis da China (a Alta Corte de Chongqing comprou uma nova há poucos meses). Nosso modelo SLT 5040XZXE1 (chassi Ford), preço: 87.600 dólares/unidade”.
Segundo Nicholas Bequelin, da organização humanitária Human Rights Watch, de Hong Kong, essas vans “permitem realizar execuções químicas onde a Justiça não possui competência técnica e também podem servir de locais de detenção num efeito em escala”.
Embora em tese o comércio de órgãos esteja interditado, a obtenção destes depende das amizades do médico na Justiça e de transações financeiras entre os interessados,
Por isso, a mulher de um paciente do hospital Ruijin de Shangai diz que o bom médico se define pelos seus contatos com Varas e Tribunais.
O cirurgião-chefe de um grande hospital conta que o esquartejamento do corpo é feito às pressas, muitas vezes sem testes sanguíneos, e o próprio médico leva as partes de avião até sua cidade.
E o atestado de consentimento da vítima exigido pela lei? “Não se pergunta, não se sabe, reconhece o chefe do serviço citado. O tribunal representa a lei, nós não temos outra opção senão confiar nele”.
Nada é feito para que familiares ou advogados possam tomar conhecimento desse consentimento. A vítima deve assinar um papel concedendo a doação. Mas, segundo Liu Changqiu, investigador da Academia de Ciências Sociais de Xangai, “acontece que não há papel ou que o papel é falso”.
O citado diretor do hospital Ruijin diz ter ouvido falar que “talvez na última hora as vítimas disseram sim, talvez porque lhes prometeram passar dinheiro a seus familiares”.
Em certos casos, o supliciado assina antes do veredicto, diz o advogado Zhang Peihong, na esperança de evitar a morte.
Para as famílias dos condenados, é impossível verificar. Yao Jiaxin, estudante do conservatório de música, atropelou em outubro de 2010 uma jovem em Xi'an (região Centro), tendo sido executado em 7 de junho de 2011.
Yao Weiqing, pai do rapaz, escreveu em seu microblog que naquele dia “nós aguardamos para identificar seu cadáver, mas a Vara não nos autorizou. Só nos disseram para preparar uma urna para as cinzas. Eu sempre disse a meu filho que eu não doaria seus órgãos”.
Num outro caso, a família só pôde ver a vítima 30 minutos antes de sua morte; os advogados jamais puderam saber o que aconteceu com seu corpo.
Achar vendedores de órgãos por Internet é fácil. Eles alegam que querem vender um rim para comprar um iPad ou um iPhone. Mas há riscos de que a história verdadeira seja diferente.
O governo marxista continua alegando que deseja um sistema puramente voluntário, sem dinheiro pelo meio. Mas os médicos do hospital Ruijin acham isso muito difícil, pois ninguém quer correr o risco de doar voluntariamente algum órgão.
Mais recentemente, o governo voltou a prometer que proibirá que os órgãos de executados sejam destinados a transplantes.
Se acontecer como nas outras promessas, na prática nada mudará, embora no papel alguma coisa possa ficar “para inglês – ou 'ingênuo' humanitário – ver”.
Luis Dufaur edita o blog Pesadelo Chinês.


Conflito de interesses

Ed Ferreira/AE
Toffoli durante sessão de julgamento do mensalão

Conflito de interesses

Ministro do STF relata ações de banco no qual obteve empréstimo milionário


10:26:29

Responsável no Supremo por dois recursos de autoria do Banco Mercantil do Brasil, Dias Toffoli conseguiu R$ 1,4 milhão em créditos, além de descontos de juros, numa operação considerada 'pouco usual' até por superintendente da instituição

Relator de processos do Banco Mercantil do Brasil, o ministro do Supremo Tribunal Federal José Antonio Dias Toffoli obteve empréstimos de R$ 1,4 milhão da instituição financeira, a serem quitados em até 17 anos. Com sede em Minas, o banco de médio porte concedeu desconto nos juros dos dois empréstimos feitos pelo magistrado, após decisões nos processos. A alteração assegurou uma economia de R$ 636 mil no total de prestações a serem pagas.
 
Segundo o Código do Processo Civil, o Código de Processo Penal e o Regimento Interno do Supremo, que tem força de lei, cabe arguir a suspeição do magistrado quando alguma das partes do processo for sua credora. ...
Toffoli relata ações do Mercantil desde que assumiu a cadeira no Supremo, em 2009. Ele contraiu os dois empréstimos em 2011. A redução dos juros, em abril deste ano, foi considerada "pouco usual" para os padrões da instituição até por funcionário do banco.

O primeiro empréstimo, de R$ 931 mil, foi concedido em setembro de 2011, em 180 parcelas fixas de R$ 13,8 mil, a serem pagas até 2026. Conforme escritura da operação, registrada em cartório, Toffoli deu como garantia de pagamento sua casa no Lago Norte, em Brasília.

Liberado três meses depois, o segundo crédito, de R$ 463,1 mil, teve pagamento definido em 204 prestações fixas de R$ 6,7 mil, com vencimento até 2028. Para assegurar o pagamento da dívida, o banco aceitou o mesmo imóvel de Toffoli, fazendo uma "hipoteca em segundo grau".

Em ambos os casos, os juros fixados num primeiro momento foram de 1,35% ao mês.

As parcelas inicialmente definidas nos contratos somavam R$ 20,4 mil, mais que a remuneração líquida de Toffoli no Supremo à época, que girava em torno de R$ 17,5 mil. Em abril deste ano, as duas partes repactuaram os empréstimos, por meio de aditivos às cédulas de crédito originais, registrados em cartório.

Conforme os registros, o banco baixou a taxa para 1% ao mês. Com a alteração, a soma das prestações caiu para R$ 16,7 mil mensais - representa um comprometimento de 92% dos ganhos atuais do ministro no Supremo.

Toffoli afirmou ter outras fontes de renda e negou relação entre os processos dos quais é relator e os empréstimos. O banco não quis se pronunciar sobre o caso (mais informações abaixo).

Mais que VIP. O Estado consultou dois gerentes da agência responsável pelo relacionamento com Toffoli, em Brasília. As taxas oferecidas para empréstimo de mesma natureza e com garantias semelhantes a "clientes VIP" variaram entre 3% e 4% ao mês, com parcelamento em, no máximo, quatro anos.

O superintendente do Mercantil em Brasília, José Alencar da Cunha Neto, representou o banco em uma das operações com Toffoli. Ele afirmou que não participou da negociação, mas admitiu que a redução de juros, nas condições descritas nas escrituras do negócio, é atípica: "Não saberia dizer o que aconteceu com a negociação. Confesso que não é muito usual", disse.

Segundo Cunha, a redução é mais comum quando o cliente oferece mais garantias do pagamento. Assim, como o risco de calote fica menor, é possível aliviar os juros. No caso do ministro, conforme os documentos, isso não ocorreu.

Vaivém. Em um dos casos que Toffoli relata, o Mercantil tenta ser compensado por contribuições que afirma ter feito em porcentual maior que o realmente devido ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Em junho de 2011, três meses antes do primeiro empréstimo, Toffoli negou recurso do Mercantil nesse processo. Segundo ele, não cabia reapreciação do caso, com base na jurisprudência do tribunal, por se tratar de "coisa julgada".

Depois de concedidos os dois empréstimos, em janeiro de 2012, ao analisar um agravo regimental do banco, o ministro suspendeu o processo até o julgamento de outros dois recursos nos quais foi reconhecida repercussão geral de questão similar. Na prática, a decisão manteve o caso em discussão no Supremo.

A repercussão geral é um instrumento que permite ao STF selecionar um recurso, considerado relevante, para julgamento. A decisão nesse recurso servirá de parâmetro para as demais instâncias em casos idênticos.

Em outro processo sob relatoria de Toffoli, o Mercantil questiona lei que aumentou de 3% para 4% a alíquota da Cofins para bancos. O processo foi distribuído ao ministro em 16 de setembro de 2011, 14 dias após o primeiro empréstimo. Em 28 de novembro do mesmo ano, ele reconheceu repercussão geral. "Foi uma decisão favorável, porque demonstra que é um assunto que o STF vai discutir", disse a advogada Daniela Procópio, do escritório que representa o banco.

 
Toffoli diz que operações financeiras são regulares
O ministro do Supremo Tribunal Federal José Antonio Dias Toffoli informou que os empréstimos com o Banco Mercantil do Brasil são regulares e foram contraídos a juros de mercado.
Em nota, ele explicou que as operações foram registradas em escrituras públicas do imóvel dado como garantia e declaradas à Receita Federal, assim como os pagamentos ao banco.

O ministro disse ainda, por meio de sua assessoria, que seus rendimentos "não se resumem aos vencimentos no Supremo Tribunal Federal". Mas não quis detalhá-los.

O Estado enviou e-mails com questionamentos ao gabinete de Dias Toffoli na noite de terça-feira, mas a maioria das perguntas não foi respondida.

O ministro não deu explicações para a redução da taxa de juros pelo Banco Mercantil, de 1,35% ao mês para 1% ao mês. Também não respondeu à pergunta sobre eventual suspeição por julgar um banco que lhe emprestou R$ 1,4 milhão.

"Quanto aos processos mencionados, é imperioso esclarecer que não há nenhuma relação entre as decisões proferidas e os empréstimos contraídos", diz a nota enviada por Dias Toffoli na noite de ontem.

Quanto à decisão envolvendo o recurso sobre INSS impetrado pelo banco, a assessoria de imprensa limitou-se a relatar que o ministro negou provimento a agravo sob sua relatoria, "o qual foi posteriormente sobrestado para se aguardar o julgamento do RE (recurso extraordinário) 611.503 e do RE n.º 586.068, ambos com repercussão geral reconhecida pelo STF".

Sobre o outro caso do Mercantil do qual é o relator, que questiona a alíquota da Cofins aplicada a bancos, o ministro alegou não haver decisão de mérito. "O tribunal tão somente reconheceu a repercussão geral da matéria, que, oportunamente, será decidida pelo plenário da corte", argumentou Toffoli, na nota.

Além da alíquota, o banco questiona em outros processos judiciais a base de cálculo da Cofins. A Receita considera todo o faturamento para mensurar a contribuição, o que, para a empresa, é inadequado.

O Mercantil não respondeu a perguntas enviadas pelo Estado. Em nota oficial, justificou que, "em obediência às disposições legais de sigilo bancário, encontra-se impedido de manifestar-se publicamente quanto à movimentação bancária de seus clientes".

Médio porte. Com sede em Minas, o Mercantil do Brasil é um banco de médio porte, com cerca de 150 agências. O grupo tem sete empresas no segmento financeiro e outras cinco no não financeiro. Em Brasília, a atuação é discreta, com apenas uma loja no Setor Comercial Sul.
 
Por Fábio Fabrini e Andreza Matais
Fonte: Jornal Estado de São Paulo -

 

O ensaio de nova tragédia

O ensaio de nova tragédia - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE


CORREIO BRAZILIENSE -
Ditadores são, por princípio, violadores de toda espécie de direito. Mas o que dizer de chefes de governos e de Estados democráticos que, sob o pretexto de punir tais violações, se postam acima da jurisprudência internacional? A prática, contrária ao concerto das nações e ao cânone diplomático, vem perigosamente sendo incorporada pelas potências mundiais. Sem constrangimento ou acanhamento por precedentes - mais do que malsucedidos - desastrosos, passa-se por cima até mesmo do fechado clube do Conselho de Segurança (CS) da ONU, com poder de veto, restrito a cinco países: China, Estados Unidos, França, Reino Unido e Rússia. À revelia desse fórum mundial, coalizão liderada por Washington e Londres invadiu o Iraque em 2003. A desculpa era destruir suposto arsenal de armas de destruição em massa, inclusive químicas, jamais encontrado. Derrubado o regime de Saddam Hussein e enforcado o ditador ao custo da vida de mais de uma centena de milhares de civis e da destruição de boa parte da infraestrutura nacional, o país, uma década depois de iniciada a ofensiva, é o signo da instabilidade. Disputas étnicas e religiosas se radicalizaram e atentados terroristas estão integrados ao cotidiano de completa insegurança.
Mesmo assim, novamente se fala numa invasão unilateral, sem o endosso das Nações Unidas e por causa de suposto uso de armas químicas. Desta vez, o alvo é a Síria, que tem como aliados dois dos membros permanentes do CS: a China e a Rússia. Mais uma vez, a orquestração do ataque parte dos Estados Unidos e do Reino Unido. Com a diferença de que já não são George W. Bush e Tony Blair os ocupantes da Casa Branca e de Downing Street, mas Barack Obama e David Cameron. Grave sinal de que a política internacional imperalista não é questão de governo, mas de Estado. Muda-se o presidente e o primeiro-ministro, mantém-se o modus operandi.
É razoável supor que agora haja de fato um tirano sanguinário fazendo uso de armas químicas contra populações civis. Mas o massacre da semana passada na periferia de Damasco segue sob investigação e ainda não foi possível determinar se teve a condução de forças leais ao presidente sírio, Bashar Al-Assad, ou de rebeldes que lutam para tirá-lo do poder. De todo modo, as consequências de uma intervenção externa são previsíveis. Primeiro, a ONU estaria mais uma vez desmoralizada. Segundo, a morte de inocentes é mais do que uma probabilidade, uma certeza diante da hipótese de ataque. Terceiro, o recrudescimento da ira de grupos terroristas, com a disseminação de atentados mundo afora, é evidência irrefutável.
A falta de bom senso no encaminhamento da solução bélica é tamanha que, na lista de pelo menos 50 alvos em poder do comando militar americano, segundo admitiu fonte do Pentágono ao New York Times, não constam depósitos de arsenal tóxico. Ora, não seriam as armas químicas a razão do ataque? E, por óbvio, não seriam elas detonadas com disparos de foguetes, causando o desastre humanitário e ambiental que justamente se diz querer evitar? Os riscos da estupidez de uma ação armada crescem na exata medida em que ela vai se tornando iminente. O uso da força não deve ser descartado a priori. Mas a montagem do teatro da guerra não pode ir além de ensaio destinado a dissuadir a Síria a aceitar a saída diplomática.

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