COTAS RACIAIS - UMA IDÉIA ELITISTA - ESCRITO POR PERCIVAL PUGGINA. OUTRO ARTIGO IMPERDÍVEL QUE RECEBI POR E-MAIL
A Universidade Federal do Rio Grande do Sul avaliou o desempenho acadêmico dos alunos cotistas e não cotistas e concluiu, segundo matéria de Zero Hora em 25 deste mês, que "os cotistas negros apresentam índices consideravelmente piores". Para cada aluno admitido pelo ingresso universal em 2008, com desempenho insuficiente, há 2,4 cotistas negros na mesma situação. Em percentuais, o mau desempenho é de 14,8% no sistema geral e de 34,8% entre os autodeclarados negros.
Tal informação
contradiz o que ouvi em sucessivos debates ao longo dos últimos anos, segundo
os quais tudo ia muito bem, graças a Deus. Não havia diferença entre cotistas
e não cotistas. Sabe-se agora que há, sim, como seria previsível. A
universidade não serve - e não deve, mesmo, servir - para suprir deficiências
na escolaridade anterior de seus alunos.
As desigualdades
sociais em meio às quais vivemos excedem, em muito, o tolerável, mesmo se
considerarmos que há uma efetiva desigualdade natural entre os indivíduos.
Nosso índice Gini (que mede a distribuição da renda nos países) é comparável
ao das sociedades com desenvolvimento mais retardado. Chega a ser um
disparate alguém observar o Brasil nessa perspectiva e deduzir que o mal está
no acesso às universidades públicas. Não está! É na base do sistema de
ensino, no bê-á-bá da cadeia produtiva da Educação, que ele se aloja e opera.
Só os gênios que
comandam a Educação nacional não sabem que na vida real, na vida do mau
emprego, do subemprego e do desemprego, no mundo do trabalho árduo e do
salário baixo, para cada graduado de cor negra que recebe seu diploma no
último andar do sistema, dezenas de crianças estão entrando pelo térreo para
padecer as mesmas deficiências que inspiraram a ideia das cotas. Atrás do
conta-gotas racial percebido nos atos de formatura, há uma hidrelétrica de
alunos negros e pobres, recebendo o precário tipo de educação que a nação
fornece a seus alunos pobres e negros. E ninguém vê isso? De nada nos servem
os tantos bons exemplos de outros povos que superaram desigualdades internas
maiores do que as nossas e emergiram como potências no cenário industrial e
tecnológico, através de um bom sistema de ensino, do trabalho e do mérito?
Ademais, o
próprio STF, ao contrário do que vem sendo repetido equivocadamente, deixou
implícito que o sistema de cotas raciais é inconstitucional. "O quê?"
perguntará espantado o leitor. "Mas não foi exatamente o
contrário?". Estive bem atento durante toda a sessão em que o STF
admitiu o sistema. Percebi que os ministros falaram muito mais sobre
Sociologia, História do Brasil, Antropologia e Política do que sobre a
Constituição. Nesse particular, nesse pequeno detalhe, seguiram o voto do
relator, ministro Lewandowski. Quanto a este, era inevitável que, em algum
momento, abrisse a Carta da República e topasse ali com coisas como a
igualdade de todos perante a lei e com o preceito (quase universal no mundo
civilizado) de que ninguém será discriminado, entre outras coisas, por motivo
de raça. Como saiu o ministro dessa enrascada? Afirmou que um sistema de
cotas raciais precisa ser transitório, temporário, devendo viger até que
desapareça a situação que lhe deu causa. Não sendo assim, seria
inconstitucional. Ora, isso significa que o conta-gotas funcionará até que
esvazie a hidrelétrica. O preceito da não discriminação persiste, mas perde
vigência por prazo impreciso, embora não infinito. Ah! Se isso não é um
truque na cartola do politicamente correto, então vou ter que pedir para
voltar à universidade por um sistema de cotas para deficientes mentais. E
mais: doravante, pelas letras da mesma oratória, todo concurso para
magistratura, todo certame intelectual ou cultural, toda prova de habilitação
que não previr cotas raciais será provisoriamente inconstitucional. Arre,
STF!
O Brasil importa
técnicos e trabalhadores qualificados de nível médio porque não oferece esse
tipo de formação aos seus jovens! Enquanto isso, as políticas de
desenvolvimento social via universidade fazem o quê? Reproduzem a estúpida
estrutura, tão do agrado da elite brasileira: um bacharelado, um canudo, um
título de doutor, uma festa de formatura. E está resolvido o problema dos
pobres. Até parece ideia de rico de novela.
______________
* Percival
Puggina (67) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org,
articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas
contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e
Gaviões
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