editorial do Estadão
Nas eleições deste ano, notou-se uma presença acentuada de militares
reformados concorrendo a cargos políticos, na esfera estadual e na
federal, no Legislativo e no Executivo. O destaque tem sido o capitão
reformado Jair Bolsonaro, candidato pelo PSL, com sua expressiva votação
no primeiro turno. Ainda que esteja há muito tempo fora das Forças
Armadas - deixou o Exército em 1988, ano em que foi eleito vereador do
município do Rio de Janeiro, e desde 1991 ocupa ininterruptamente uma
cadeira na Câmara dos Deputados -, Bolsonaro construiu e mantém sua
identidade política vinculada à sua passagem no Exército.
Ao mesmo tempo que há maior participação de ex-militares na vida
político-partidária, deve-se reconhecer que as Forças Armadas têm se
mantido exemplarmente isentas nas questões eleitorais, numa demonstração
de arraigada maturidade institucional. Não se viu, por exemplo, nenhuma
ação político-partidária oriunda de quartéis ou algum movimento
organizado por militares da ativa.
O alto-comando militar foi, a todo momento, muito enfático na isenção
das Forças Armadas em questões políticas. Antes do primeiro turno, o
comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, fez uma firme
defesa do papel institucional das Forças Armadas, em entrevista ao Estado.
“Nós somos instituição de Estado que serve ao povo. Não se trata de
prestar continência para A ou B. Mas, sim, de cumprir as prerrogativas
estabelecidas a quem é eleito presidente”, disse Villas Bôas.
Quando questionado se Jair Bolsonaro era o candidato das Forças Armadas,
o comandante do Exército não titubeou: “Não é candidato das Forças. As
Forças Armadas são instituições de Estado, de caráter apolítico e
apartidário”.
Mais recentemente, em conversa com Eliane Cantanhêde, colunista do Estado,
o comandante da Marinha, o almirante de esquadra Eduardo Leal, frisou a
distância entre o papel institucional das Forças Armadas e as questões
eleitorais. “O candidato ‘x’ ou ‘y’ pode ter muitos eleitores nas Forças
Armadas, mas as Forças Armadas não têm candidato. Repito: as Forças
Armadas, particularmente a Marinha do Brasil, não têm candidato. Não há
nenhuma atividade, nenhuma campanha interna, nenhuma ação que possa nos
associar a um dos dois candidatos. Estamos, institucionalmente,
neutros”, disse Leal.
São muito oportunas essas manifestações dos comandantes do Exército e da
Marinha, pois reforçam uma ideia central de todo Estado Democrático de
Direito: a organização do poder político é tarefa dos civis, e não dos
militares. E essa premissa não é modificada pela presença de militares
reformados na política. Justamente por serem reformados, já não detêm
nenhum poder sobre as instituições militares. Eles são iguais aos outros
candidatos sem histórico militar - e é por isso que podem concorrer,
num Estado Democrático de Direito, a cargos políticos.
As Forças Armadas são enfáticas ao rejeitarem qualquer hipótese de
futura intervenção militar, como se a presença de militares reformados
na política pudesse representar um primeiro passo para a tomada do poder
civil por militares. “Não há ambiente nem condições para qualquer tipo
de golpe, muito menos para um golpe militar. As instituições são fortes,
a iniciativa privada é forte, a mídia é forte e as Forças Armadas
cumprem suas atribuições dentro da Constituição”, afirmou o comandante
da Marinha.
A neutralidade das Forças Armadas nas questões políticas não representa
apenas uma garantia de que o poder civil está, de fato e de direito, nas
mãos dos civis. Serve também de exemplo para outros órgãos do Estado,
influenciados muitas vezes por voluntarismos fora de suas competências
institucionais. Por exemplo, nos últimos anos, membros do Ministério
Público, que estavam em plena atividade, alguns deles comandando
importantes operações, tiveram denodada atuação pública com fins
políticos.
Em tempos de polarizações, radicalismos e paixões exacerbadas, as Forças
Armadas exercem, com seu profundo respeito aos cânones republicanos, um
papel muito importante para a estabilidade e serenidade do País.
extraídaderota2014blogspot
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