por Zeina Latif
Nos últimos anos, muitos governadores evitaram o necessário ajuste das
contas públicas, devido ao calendário eleitoral. Para alguns o cálculo
deu errado e a resposta veio das urnas. É o caso de Minas Gerais, que
nem sequer consegue pagar pontualmente a folha do funcionalismo, e tem o
atual governador fora da disputa do segundo turno. Do outro lado, não
parece coincidência que governadores que tiveram gestão mais responsável
foram premiados com a reeleição já no primeiro turno, como Camilo
Santana (PT), do Ceará, e Renan Filho (PMDB), de Alagoas. O mesmo
poderia ter ocorrido no Espírito Santo, não fosse a desistência de Paulo
Hartung (PMDB) de disputar a reeleição.
A situação financeira dos Estados é grave. Muitos não estão cumprindo o
limite legal de comprometer até 60% da receita corrente líquida com a
folha na soma dos três Poderes, quando se inclui os gastos com
terceirizados e o imposto de renda sobre a folha. Informações
preliminares apontam que o número de Estados nessa situação aumentou
sensivelmente em 2017.
Se os números falam alto, a realidade grita. É visível o colapso dos
serviços públicos, com muitos Estados enfrentando dificuldades para
prover serviços básicos e honrar compromissos.
Há Estados em situação crítica, como o Rio de Janeiro, que está em
regime de recuperação fiscal, suspendendo o pagamento da dívida ao
Tesouro em troca de medidas de ajuste fiscal. O governador Pezão
conseguiu algumas vitórias, mas luta praticamente sozinho. Exemplo disso
foi a decisão do Legislativo de aprovar um aumento para servidores do
Judiciário.
O Rio Grande do Sul está na fila de um acordo com a União e Minas Gerais
poderá entrar, sendo que ambos conseguiram liminares no STF para
suspender o pagamento da dívida ao Tesouro. Contratos foram rasgados.
A principal medida de ajuste dos Estados terá de vir do governo federal,
que é a reforma da Previdência. Afinal, em torno de 40% do gasto com a
folha decorre de pensões e aposentadorias. O valor vai aumentar com o
envelhecimento do funcionalismo, lembrando que professores e policiais
contam com regras mais generosas de aposentadoria e pesam bastante nos
orçamentos estaduais. O governo Temer defendeu sozinho a reforma. Os
governadores se esquivaram com medo das urnas.
O outro lado da moeda é a pressão dos governadores para postergar o
acerto de contas. Em 2016, muitos obtiveram liminares do STF para
permitir que as dívidas com a União fossem calculadas com juros simples,
e não compostos. Imaginem se o Tesouro resolvesse fazer o mesmo com os
títulos da dívida pública. O nome para isso seria calote.
Não satisfeito, em abril de 2016, o STF estabeleceu um prazo de 60 dias
para a União renegociar um acordo da dívida e impediu o Tesouro de impor
aos Estados sanções por inadimplência. O STF desequilibrou a negociação
entre as partes, com prejuízo para a União.
Para piorar, o acordo de renegociação postergando o pagamento da dívida
sofreu grande revés na Câmara, que aprovou o projeto, mas retirou as
chamadas contrapartidas, como o congelamento de salários, contratações e
promoções, e o aumento da contribuição previdenciária.
Há ainda o imbróglio da Lei Kandir, de 1996, que isenta as exportações
do ICMS, um imposto estadual. Os governos dos Estados defendem
compensação de R$ 39 bilhões ante os R$ 3,9 bilhões atuais, enquanto a
União contesta o cálculo. O STF determinou que o Congresso regulamente a
lei até novembro deste ano. Esta é uma pauta-bomba que precisará ser
contida pelo novo presidente.
A renovação política poderá atrasar o ajuste fiscal e dificultar o
convencimento das bancadas estaduais no Congresso quanto à necessidade
de reformas, pela inexperiência administrativa e política. Mais grave,
Estados problemáticos, como Rio de Janeiro e Minas Gerais, poderão ser
governados por novatos.
O jogo de empurra precisa acabar, e rapidamente. O próximo presidente
precisará ser o líder dessa agenda, incluindo o diálogo com o STF. Se
falhar, ficará com a fatura.
ECONOMISTA-CHEFE DA XP INVESTIMENTOS
O Estado de São Paulo
exraídaderota2014blogspot
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