Você tem crédito em milhas de companhias aéreas? Pois se não enfrentou problemas, tem tudo para enfrentar. Está cada vez mais difícil converter os pontos em passagens aéreas. Tanto que começam a aparecer despachantes que compram e revendem milhagens. E multiplicam-se mudanças repentinas nos critérios de pontuação.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), instituição reguladora do setor, não tem interesse em corrigir esse descaso. Seus dirigentes argumentam que esses programas configuram “pacto acessório” entre companhia aérea e consumidor, que não faz parte dos propósitos de regulação.
As principais companhias aéreas que atuam no País também se eximem da responsabilidade por entender que, por contrato, têm o direito de mudar as regras “a qualquer tempo”.
Maria Inês Dolci, coordenadora da Associação de Consumidores Proteste, observa que “essa situação ocorre de modo sistemático; não há transparência na relação com o cliente”. Por essas e outras, os 9,3 milhões de associados do Smiles, programa de fidelidade vinculado à companhia aérea Gol, acabam de ser prejudicados. No dia 10, a empresa anunciou que o acúmulo de milhas em voos domésticos passará a ser calculado pelo valor da passagem, e não mais pela distância do voo. Com isso, bilhetes adquiridos com tarifas promocionais deixam de acumular pontos. “O objetivo é fidelizar passageiros que apresentam perfil diferenciado pela frequência e padrão de consumo”, reza o comunicado oficial. A regra passa a valer no dia 10 de outubro.
A Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor de São Paulo (Procon-SP) solicitou que a Gol preste esclarecimentos sobre as novas regras até amanhã. A advogada Cíntia Pereira de Lima, especialista em Direito do Consumidor da Universidade de São Paulo (USP), reconhece que as milhas não podem ser consideradas amostras grátis, que beneficiam apenas o consumidor. A empresa aérea ganha com o negócio. “O Código de Defesa do Consumidor se aplica ao caso, pois há fidelização e ganho indireto para as empresas”, diz. Ela sugere que a Anac intervenha, ao menos porque há forte demanda da sociedade.
Hoje, os programas de fidelidade operam como redes que reúnem empresas de vários setores, como postos de gasolina, operadoras de TV a cabo e telefonia móvel e supermercados. Para fidelizar clientes, essas empresas compram pontos do programa. Assim, o consumidor pode acumular crédito ao adquirir produtos e serviços das parceiras e, ao atingir determinado volume, trocá-los por prêmios. O valor dos benefícios concedidos, por sua vez, é pago pelo programa de fidelidade às parceiras.
Além da diferença entre o valor cobrado pelos pontos e o que é pago às parceiras, a receita desses programas vem dos pontos não resgatados. “O modelo depende muito da chamada taxa breakage, quando há a receita de venda de pontos e nenhum custo para aquisição de produtos”, diz Carlos Daltozo, analista do BB Investimentos. Na Smiles, os pontos expiram em 36 meses e na Multiplus, vinculada à TAM, em 24 meses.
E o direito do consumidor fica para depois.
Parceria. Enquanto as empresas aéreas passam por dificuldades financeiras, os programas de fidelidade comemoram a expansão do número de associados e a rápida capacidade de geração de caixa. É juntar a fome com a vontade de comer. Gol e TAM são as principais parceiras da Smiles e da Multiplus. As passagens aéreas representam, em média, 80% dos resgates de pontos.
0 comments:
Postar um comentário