Contra os comissários da ignorância
Excelente artigo de Luiz Felipe Pondé na Folha de hoje. Leiam:
O que é
conservadorismo? Tratar o pensamento político conservador
(“liberal-conservative”) como boçalidade da classe média é filosofia de
gente que tem medo de debater ideias e gosta de séquitos babões, e não
de alunos.
Proponho a
leitura de “Conservative Reader” (uma antologia excelente de textos
clássicos), organizada pelo filósofo Russel Kirk. Segundo Kirk, o termo
começou a ser usado na França pós-revolucionária.
Edmund
Burke, autor de “Reflexões sobre a Revolução na França” (ed. UnB,
esgotado), no século 18, pai da tradição conservadora, nunca usou o
termo. Tampouco outros três pensadores, também ancestrais da tradição,
os escoceses David Hume e Adam Smith, ambos do século 18, e o francês
Alexis de Tocqueville, do século 19.
Sobre
este, vale elogiar o lançamento pela Record de sua biografia, “Alexis de
Tocqueville: O Profeta da Democracia”, de Hugh Brogan.
Ainda que
correta a relação com a Revolução Francesa, a tradição
“liberal-conservative” não é apenas reativa. Adam Smith, autor do
colossal “Riqueza das Nações”, fundou a ideia de “free market society”,
central na posição “liberal-conservative”. Não existe liberdade
individual e política sem liberdade de mercado na experiência histórica
material.
A
historiadora conservadora Gertrude Himmelfarb, no seu essencial “Os
Caminhos para a Modernidade” (ed. É Realizações), dá outra descrição
para a gênese da oposição “conservador x progressista” na modernidade.
Enquanto
os britânicos se preocupavam em pensar uma “sociologia das virtudes” e
os americanos, uma “política da liberdade”, inaugurando a moderna
ciência política de fato, os franceses deliravam com uma razão descolada
da realidade e que pretendia “refazer” o mundo como ela achava que
devia ser e, com isso, fundaram a falsa ciência política, a da esquerda.
Segundo Himmelfarb, uma “ideologia da razão”.
O
pensamento conservador se caracteriza pela dúvida cética com relação às
engenharias político-sociais herdeiras de Jean-Jacques Rousseau (a
“ideologia da razão”).
Marx nada
mais é do que o rebento mais famoso desta herança que costuma “amar a
humanidade, mas detestar seu semelhante” (Burke).
O
resultado prático desse “amor abstrato” é a maior engenharia de morte
que o mundo conheceu: as revoluções marxistas que ainda são levadas a
sério por nossos comissários da ignorância que discutem conservadorismo
na cozinha de suas casas para sua própria torcida.
Outro
traço desta tradição é criar “teorias de gabinete” (Burke), que se
caracterizam pelo seguinte: nos termos de David Hume (“Investigações
sobre o Entendimento Humano e sobre os Princípios da Moral”, ed. Unesp),
o racionalismo político é idêntico ao fanatismo calvinista, e nesta
posição a razão política delira se fingindo de redentora do mundo. Mundo
este que na realidade abomina na sua forma concreta.
A dúvida
conservadora é filha da mais pura tradição empirista britânica, ao passo
que os comissários da ignorância são filhos dos delírios de Rousseau e
de seus fanáticos.
No século
20, proponho a leitura de I. Berlin e M. Oakeshott. No primeiro,
“Estudos sobre a Humanidade” (Companhia das Letras), a liberdade
negativa, gerada a partir do movimento autônomo das pessoas, é a única
verdadeira. A outra, a liberdade positiva (abstrata), decretada por
tecnocratas do governo, só destrói a liberdade concreta.
Em
Oakeshott, “Rationalism in Politics” (racionalismo na política), os
conceitos de Hume de hábito e afeto voltam à tona como matrizes de
política e moral, contra delírios violentos dos fanáticos da razão.
No 21,
Thomas Sowell (contra os que dizem que conservadores americanos são
sempre brancos babões), “Os Intelectuais e a Sociedade” (É Realizações),
uma brilhante descrição do que são os comissários da ignorância
operando na vida intelectual pública.
Conservador
não é gente que quer que pobre se ferre, é gente que acha que pobre só
para de se ferrar quando vive numa sociedade de mercado que gera
emprego. Não existe partido “liberal-conservative” no Brasil, só
esquerda fanática e corruptos de esquerda e de direita.
0 comments:
Postar um comentário