por José Antônio Lemos dos Santos
A Constituição Federal em capítulo dedicado à Política Urbana determinou que todas as cidades brasileiras com mais de 20 mil habitantes tenham um Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU). Passados mais de 30 anos certamente todas as grandes cidades do país, em especial as capitais, dispõem desse importante documento de controle e ordenação urbana. Grosso modo, pode se dizer que um Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano seria o projeto da cidade, isto é, um documento firmado em lei que estabelece tecnicamente como ela deve se desenvolver em um horizonte de 20 a 30 anos tanto em suas condições sociais e econômicas, como em seus aspectos físicos-urbanísticos, em especial sua base geotécnica, a qual determina entre outras especificações as áreas proibidas ao parcelamento do solo pelos graves riscos que oferecem, seja por alagamento, enxurradas, deslizamentos, ou outros que tais. São as chamadas Áreas de Risco.
Repito, todas as cidades brasileiras, se não todas, ao menos as capitais e as de grande porte dispõem de um PDDU, e mais, dispõem também de um órgão técnico de planejamento urbano destinado ao acompanhamento de sua implantação. Mas de que adianta as cidades terem seus PDDUs e órgãos de planejamento se eles, via-de-regra, não são obedecidos? Em sua quase totalidade os PDDUs são documentos para “inglês ver”, ou melhor, para os tribunais de contas e os ministérios públicos verem e atestarem a obrigação constitucional, mesmo que esta obediência se dê apenas nos papeis, principalmente no que diz respeito às ocupações das áreas de risco. Não vemos no país iniciativas consistentes no sentido de evitar novas ocupações em tais áreas de risco e muito menos no sentido de reduzi-las através de programas consistentes e bem planejados de transferências dignas das populações que se encontram sob constante ameaça. Só para se ter uma ideia, são estimadas 3,2 milhões de pessoas ocupando áreas de risco em apenas 8 capitais avaliadas por uma recente estimativa de que tive notícia.
Pois bem, estamos no verão novamente e com ele novas tragédias sempre tratadas pelas autoridades como surpresas excepcionais, muito embora previstas e mapeadas nas leis de uso e ocupação do solo. Neste fim de semana passado 44 pessoas perderam a vida só em Minas Gerais, das quais 26 na Região Metropolitana de Belo Horizonte, com 19 desaparecidos, 3.334 desabrigados e 13.887 desalojados, segundo o último boletim de domingo (26) da Defesa Civil. E de fato choveu como nunca em Minas. Muitos dos sobreviventes perderam tudo ou quase tudo o que tinham. Mas não foi só em Minas. Tristeza e dor se espalham por este Brasil a cada verão. Em geral as autoridades dedicam-se às emergências de praxe refugiando-se às indagações pertinentes e buscam salvação nos números da meteorologia, empurrando por entre lágrimas de crocodilo a culpa para São Pedro, e no esquecimento que sempre vem.
A Civilização é um estágio em que o homem aceita submeter-se a um arcabouço de leis, normas, costumes e princípios em favor da vivência coletiva. Sem ela a cidade vira o algoz do cidadão, ao invés de promotora de sua qualidade de vida. A raiz dos atuais males que afligem as cidades está no descaso oficial com que são tratadas as determinações técnicas urbanísticas consolidadas nos PDDUs. É urgente uma lei de responsabilidade urbanística nos moldes da lei de responsabilidade fiscal com previsão de punição severa, como a perda da elegibilidade para os prefeitos complacentes com a expansão das ocupações em área de risco, conforme proposta em discussão no âmbito do Conselho de Arquitetura e Urbanismo. Condenados à Civilização, ou progredimos nela ou morreremos todos. E o pior já está acontecendo.
*O autor é arquiteto e urbanista, conselheiro licenciado do CAU/MT, acadêmico da AAU e professor aposentado.
*O autor é arquiteto e urbanista, conselheiro licenciado do CAU/MT, acadêmico da AAU e professor aposentado.
extraídadepuggina.org
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