Dilma acerta ao condenar o vandalismo e dizer que a violência deve ser coibida, mas Gilberto Carvalho flerta com a depredação ao afirmar que busca interlocutores entre os black blocs
Brasileiros preocupados com os rumos que vem tomando a violência mascarada nas metrópoles brasileiras, especialmente Rio de Janeiro e São Paulo, têm motivos para elogiar a fala da presidente Dilma Rousseff, na manhã de ontem, em entrevista a emissoras de rádio paranaenses. “Defendo qualquer manifestação democrática. Agora, sem sombra de dúvida, acredito que violência dos mascarados não é democrática e tem que ser coibida”, disse Dilma.
Não é a primeira vez que a presidente condena o vandalismo de black blocs e assemelhados. Em junho, ainda no auge das grandes manifestações de rua – várias das quais terminaram com episódios de confronto entre vândalos e policiais –, em pronunciamento em cadeia nacional, a presidente havia dito que “a violência envergonha o Brasil”. Em sua conta no Twitter, a presidente emitiu, nos últimos dias, outras críticas à truculência mascarada. “Agredir e depredar não fazem parte da liberdade de expressão” e “São barbáries antidemocráticas” foram alguns dos tweets publicados no mesmo dia em que Dilma prestava solidariedade a um coronel da Polícia Militar paulista espancado por black blocs.
Se por um lado as afirmações de Dilma são elogiáveis, por outro o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, dá uma piscadela ao vandalismo quando afirma que o governo estaria buscando interlocutores entre os black blocs. Apesar de dizer que “a repressão é necessária”, Carvalho ressaltou que não bastaria criminalizar os vândalos, mas entender o que está acontecendo. Tem razão, mas a melhor maneira de “entender de onde vem esse processo” é realmente chamar os mascarados para uma mesa de negociação à qual eles nunca demonstraram interesse em se sentar? Receber black blocs sem que eles renunciem a seus métodos não é reconhecer que esses métodos funcionam?
Existe, sim, uma indignação legítima entre boa parte da população. É uma revolta motivada por diversos fatores, desde a precariedade dos serviços públicos até casos como o desaparecimento do pedreiro Amarildo, no Rio de Janeiro, e a morte do jovem Douglas Rodrigues, em São Paulo, atingido por um tiro saído da arma de um PM paulista – um disparo acidental, alega a polícia. São episódios inseridos em um histórico de violência policial nas periferias. Não parece haver tanto mistério em compreender por que o brasileiro protesta. A violência dos black blocs e demais vândalos, no entanto, segue uma lógica diferente. Amarildo e Douglas serviram como pretextos úteis, mas que, no fundo, são desnecessários para a selvageria mascarada.
Os mais céticos podem observar que todas as críticas à violência por parte da presidente não serviram para esfriar os ânimos dos vândalos, que só parecem aumentar. Dilma não está sozinha na condenação – pesquisa Datafolha mostrou que 95% dos paulistanos reprovam o vandalismo. Tanto apoio deve servir como um estímulo para que as forças de segurança abandonem uma postura mais passiva e busquem uma forma de agir energicamente, com inteligência e coibindo abusos de seus próprios membros. Mas o Judiciário também precisa seguir o conselho da presidente no Twitter e “punir os abusos, nos termos da lei”, como ela escreveu no dia 26. Na semana passada, comentamos, neste mesmo espaço, o flerte de alguns magistrados com a violência. Preocupa que o primeiro depoimento em um vídeo que convoca para uma manifestação na tarde de hoje, no Rio de Janeiro, seja de um magistrado. “A criminalização dos manifestantes, dos movimentos sociais, é uma expressão da violência ilegítima do Estado, da truculência contra a democracia”, diz o juiz João Damasceno, do TJ fluminense. A tolerância policial e judicial é receita certa para a impunidade, que por sua vez é o melhor incentivo a novas ondas de violência.
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