por Leonardo Coutinho
O cartaz que ilustra essa coluna é real. O ditador Nicolás Maduro é procurado pela Justiça dos Estados Unidos desde o ano de 2020. As autoridades americanas oferecem 15 milhões de dólares por informação que leve à sua prisão. Tudo indica que Maduro estará em Buenos Aires para o encontro da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) – a versão bolivariana da Organização dos Estados Americanos, fundada em 2010 sob os auspícios de Hugo Chávez, Raúl Castro, Cristina Kirchner, Evo Morales e, claro, Luiz Inácio Lula da Silva.
As autoridades argentinas prepararam um esquema de segurança especial para Maduro, que tem hospedagem prevista no país até o dia 23 de janeiro. A líder opositora Patricia Bullrich entrou com um pedido na Justiça argentina para que Maduro seja preso ao pisar em Buenos Aires. Segundo ela, o ditador – independentemente da ordem de captura emitida pelos Estados Unidos por crime de tráfico de cocaína (sim, Maduro é acusado de tráfico de cocaína) – deveria ser preso e julgado pelos crimes contra a humanidade que ele e seu regime cometem. Um movimento jurídico baseado em argumentos que já foram aplicados contra outros ditadores como o chileno Alberto Pinochet, mas que no caso de Maduro deverá ficar restrito ao âmbito meramente político.
Maduro é esperado em Buenos Aires como uma das estrelas do evento. Seu desembarque na capital argentina terá o mesmo significado apoteótico que seu criador e mentor Hugo Chávez imprimia em suas várias demonstrações de não-subordinação a qualquer regra. No caso em questão, Maduro mostrará ao mundo que a recompensa de 15 milhões de dólares oferecida pelos Estados Unidos só serve para enfatizar que ele e seus amigos estão pouco se lixando para Justiça. Mais especificamente a Justiça dos Estados Unidos reconhecida por ter sido (aqui o tempo verbal é importante) implacável com traficantes latino-americanos que despejam toneladas de drogas no território americano.
O desprezo de Maduro para com o seu povo, a região, as leis e a Justiça pode ser explicado pelas suas vitórias ao longo de quase uma década à frente de um regime reconhecidamente brutal. Maduro trincou os dentes e encarou seus opositores dentro e fora da Venezuela. Ele prendeu, torturou, matou. E daí? Ele não foi o primeiro e nem o único a sobreviver no poder com esse currículo de brutalidades.
Focando apenas em exemplos latino-americanos, antes dele vieram Fidel Castro e seus gerontocratas que até hoje estão no poder. Evo Morales, perseguiu, prendeu, matou e atualmente está engajado na promoção de uma guerra com o objetivo de dividir e roubar um pedaço do Peru (e se der certo, um naco do Chile também).
Em outubro passado, Maduro conseguiu algo inédito. Conseguiu que os Estados Unidos libertassem seus sobrinhos presos em flagrante por tráfico de drogas, em uma operação da DEA, a agência antidrogas dos Estados Unidos, em 2015. A operação foi tratada como “troca de prisioneiros”. A administração Biden celebrou que o regime chavista libertou sete cidadãos americanos que estavam presos na Venezuela. Mas não há como equiparar a situação de quem foi preso, julgado e condenado por um sistema judicial independente com quem foi praticamente sequestrado por uma ditadura, onde o Poder Judiciário funciona como linha auxiliar do regime.
O desembarque impune de Maduro na Celac vem acompanhado de outros dois movimentos relevantes. O primeiro é de escala regional. O presidente Lula, que é um dos pais da criatura, é outra estrela da edição atual da Celac. Sua participação marca o retorno do Brasil ao bloco. Em 2019, o então presidente Jair Bolsonaro virou as costas para a iniciativa.
O segundo evento relevante tem escala global. A possível vinda do presidente chinês Xi Jinping. Os argentinos esperam o desembarque do chinês, que viria dar a sua benção para o renascimento do bloco com o retorno de seu membro mais musculoso, que é o Brasil.
A presença de Xi na Argentina pode ser lida como um salto da Celac – que surgiu como alternativa à Organização dos Estados Americanos, como dito no início da coluna, mas também como força antagônica aos Estados Unidos e Canadá, que “mandam demais” na OEA. Xi, que lidera um avanço sem precedentes da China sobre a região – sobretudo na Argentina – dará seu aval e suporte ao bloco.
Os bolivarianos estão de volta e vieram com tudo. Os sinais de que a China os alimentará eram evidentes, mas muitos fazem questão de não enxergar.
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