Rodolfo Costa, Gazeta do Povo
Passados quase quatro meses da última reforma ministerial, o presidente Jair Bolsonaro anunciou nesta quarta-feira (21) uma nova mudança na equipe ministerial. O senador Ciro Nogueira (PI), presidente nacional do PP, assumirá a Casa Civil da Presidência da República. Já o atual ministro-chefe da Secretaria-Geral, Onyx Lorenzoni, será transferido para o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que será recriado. Em seu lugar, assumirá o atual ministro-chefe da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos.
A nova reforma ministerial tem como objetivo ampliar a reorganização de forças no xadrez político das eleições de 2022. Em março, Bolsonaro inseriu no núcleo duro do Palácio do Planalto a deputada federal Flávia Arruda (PL-DF) para conduzir a articulação política na Secretaria de Governo. Agora, com Nogueira, o presidente da República atende a um pleito antigo da base governista no Senado e fortalece o processo de montagem de seu palanque nos estados.
Pré-candidato ao governo do Piauí, Nogueira tem interlocutores do PP coordenando campanhas que podem oferecer estrutura eleitoral para Bolsonaro no primeiro e no segundo turno nas eleições de 2022. O senador tem um perfil articulador de bastidores que o presidente da República espera aproveitar para construir sua coligação para o próximo ano, com o apoio de partidos aliados do Centrão, a exemplo do PL e Republicanos.
A reforma ministerial sugere, contudo, que o governo mudará os rumos de sua política — inclusive a econômica. É uma mudança que obrigará o próprio Bolsonaro a se adequar, sob risco de caminhar isolado politicamente em 2022, segundo avaliação feita por interlocutores do Planalto e lideranças do Congresso à Gazeta do Povo.
O que o governo espera de Ciro Nogueira e da reforma ministerial
A chegada de Ciro Nogueira ao governo pode ser resumida como uma forma de Bolsonaro atender a base governista na Câmara e no Senado e preparar o terreno para as eleições. Mas o detalhamento do papel que o senador terá na Casa Civil é mais profundo e complexo do que isso.
Pelas próprias atribuições que a Casa Civil tem, a de coordenação do Estado, é esperado que Nogueira tenha as políticas públicas sobre rédeas curtas. A pasta que o senador chefiará faz a articulação entre ministérios a fim de estruturar e executar programas governamentais, que, normalmente, demandam a atuação conjunta do Estado.
A indicação de um cacique partidário e articulador de bastidores como Nogueira para a Casa Civil mostra que o governo planeja uma visão mais política para a administração pública. A expectativa é que, com ele na coordenação do Estado, o Planalto terá uma postura mais pragmática, inclusive na política econômica, da qual nem mesmo o ministro da Economia, Paulo Guedes, escapará.
"Com o Ciro na coordenação ministerial, é esperado um controle e enquadramento maior ao Guedes, para que a equipe econômica tenha uma visão mais pragmática: 'oh, essa política não adianta, vamos ter eleição ano que vem'. É preciso ter esse sopesamento", sustenta um interlocutor palaciano.
Na terça-feira (20), Bolsonaro comentou que o Ministério da Economia "exagerou" na proposta da reforma tributária, em referência às recentes polêmicas envolvendo a reforma sobre o Imposto de Renda, que precisou ser alterada pelo relator, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), após críticas no mercado financeiro e no Parlamento.
Um dos principais indícios do desconforto do Planalto com algumas decisões da equipe econômica é o desmembramento do Ministério da Economia, algo precificado desde abril. Afinal, a atual Secretaria de Previdência e Trabalho será chefiada por Onyx Lorenzoni, deputado licenciado pelo DEM que passará a atuar em alinhamento com Nogueira.
Além da coordenação de Estado: o que Nogueira pode agregar ao Planalto
O presidente do PP não chega ao governo para necessariamente assumir a articulação política. Mas, naturalmente, somará forças com Flávia Arruda. A ministra da Secretaria de Governo seguirá empenhada com as articulações das reformas tributária e administrativa, que tramitam na Câmara, e Nogueira atuará como articulador no Senado, função até então executada por Lorenzoni.
A expectativa do Planalto é que a chegada de Nogueira permita uma relação melhor com o Senado, sobretudo em um momento em que a Casa legislativa ganha grande protagonismo, não só devido à CPI da Covid. Com a volta do recesso parlamentar, virão as sabatinas do ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), André Mendonça, para a vaga do Supremo Tribunal Federal (STF), e de indicados a embaixadas pelo governo.
Mendonça, por sinal, enfrenta resistências do senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). "Acho que é um momento crucial para o presidente [Bolsonaro] ter uma relação mais tranquila com o Senado, e a escolha do Ciro pode ajudar", analisa um interlocutor do Planalto. A esperada articulação de Nogueira no Senado não significa, entretanto, que ele não terá papel fundamental em matérias tramitadas na Câmara e na interlocução com o Congresso de uma forma geral.
O governo também espera do senador apoio para a aprovação da proposta de emenda à Constituição (PEC) 135/19, que propõe a impressão do voto para fins de auditagem. Como informou a Gazeta do Povo, Bolsonaro articula com dirigentes partidários — a exemplo do próprio Nogueira — a sanção do fundão eleitoral de R$ 5,7 bilhões, desde que com o apoio das legendas para a aprovação da pauta.
"Agora, o Ciro vai ter que vestir a camisa do governo, porque o presidente [Bolsonaro] é totalmente favorável. Ou ele [senador] vai convencer o presidente do contrário, diante das posturas públicas que o presidente teve, ou ele vai ser convencido e melhorar a relação do governo com a própria Câmara", pondera um interlocutor palaciano.
Embora a relação entre o governo e a Câmara esteja ajustada, segundo avaliam assessores do Planalto, a expectativa é de que Nogueira possa reforçar a articulação. Inclusive sendo um intermediador no recente e conturbado relacionamento entre Bolsonaro e o primeiro-vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), que tem respondido a críticas do presidente da República com ameaças de impeachment.
Os riscos que Bolsonaro corre ao trazer Ciro Nogueira para o Planalto
Apesar das vantagens políticas em indicar Ciro Nogueira para a Casa Civil, aliados e correligionários do senador fazem ressalvas. A avaliação quase unânime no meio político é de que a escolha dele sugere um governo mais pragmático, mas ainda paira a dúvida sobre como Bolsonaro se adequará a isso.
O presidente da República dosa o tom e o discurso desde quando se alinhou ao Centrão, em 2020. Ora ele pendula mais ao centro, ora mais à direita, fato que levou ministros políticos a aconselharem um diálogo menos radical com o eleitorado. Agora, com Nogueira na Casa Civil, aliados da base alertam que Bolsonaro terá uma última chance de moderar as falas e evitar maiores polêmicas com as instituições.
"O Ciro é a última trincheira do Bolsonaro. Num eventual racha [com o senador], ele [Bolsonaro] está caçado. É um convite de sobrevivência, o tudo ou nada. Se buscar o equilíbrio e pragmatismo, ele vai se fortalecer muito caso pare de criar confusão desnecessária", avalia um senador da base.
O deputado federal Fausto Pinato (PP-SP), presidente da Frente Parlamentar Brasil-China, analisa que Bolsonaro pode se enfraquecer se a relação com Nogueira ficar insustentável. "O Bolsonaro tem condições de construir muitas pontes com pessoas de centro e centro-direita, que entraram em rota de colisão com o governo pela falta de pragmatismo e o excesso de ideologismo", analisa.
Aliados e correligionários de Nogueira não acreditam que Bolsonaro adotará uma postura totalmente pragmática, mas esperam, ao menos, uma moderação nos discursos. Já governistas no Congresso apostam que Bolsonaro saberá dosar o tom de olho em 2022. "Agora, o foco para todo mundo é a reeleição do presidente, temos que focar nisso", pondera um deputado "bolsonarista".
Bolsonaro no PP?
A decisão de trazer Ciro Nogueira para o governo traz embutida a possibilidade de Bolsonaro se filiar ao PP. Dois interlocutores ouvidos pela Gazeta do Povo acham difícil a filiação, mas um terceiro assessor palaciano aponta que o alinhamento com Nogueira pode tornar isso possível, sobretudo após o próprio presidente afastado do Patriota, Adilson Barroso, confirmar que ele conversa com outras legendas.
Ter o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como potencial adversário em um possível segundo turno levou Bolsonaro a manter conversas e sondar, desde maio, uma filiação ao PP. "É algo que volta ao radar, mas ainda não consigo avaliar o grau de possibilidade de isso se concretizar ou não", sustenta um interlocutor palaciano.
A filiação ou não ao PP não impede, entretanto, que Bolsonaro comece a montar seus palanques eleitorais para 2022, com o apoio de Ciro Nogueira. Além do Piauí, base eleitoral do senador, e do Acre, estado governado por Gladson Cameli (PP) — que tentará a reeleição —, o partido mira a montagem de coligações nos demais estados.
Em São Paulo, por exemplo, o maior colégio eleitoral do país, Nogueira deu sinal verde para o deputado Fausto Pinato atuar na coordenação da campanha de Geraldo Alckmin, ex-governador do estado — que pode ir para o PSD —, na reedição da chapa com seu ex-vice e ex-governador Márcio França (PSB).
O desejo de Bolsonaro é lançar seu ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, para o governo de São Paulo, mas o próprio ministro não demonstra vontade de disputar o cargo, segundo apurou a reportagem. Nas pesquisas eleitorais, Alckmin aparece à frente do vice-governador do estado, Rodrigo Garcia (PSDB), o candidato do tucano João Doria, e do candidato do PT, Fernando Haddad.
O presidente da República não é aliado de Alckmin, mas o PP — por meio da articulação de Pinato nos bastidores — tenta convencê-lo de que, num eventual segundo turno entre o ex-governador e Haddad ou Garcia, a melhor alternativa seria caminhar junto com o possível candidato do PSD ao governo paulista.
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