Jornalista Andrade Junior

sábado, 24 de agosto de 2024

O erro do Tratado de Versalhes não foi ser duro demais, foi não ser cumprido

Tiago Pedreiro de Lima 


Introdução

Ao final da 1ª Guerra Mundial, as grandes potências se viram na obrigação de criar um arranjo internacional capaz de garantir a paz duradoura. As nações vencedoras também se esforçaram em punir aquela que teria sido culpada por arrastar milhões de pessoas para a morte no campo de batalha: a Alemanha. O Tratado de Versalhes, assinado em junho de 1919, tentou alcançar esses objetivos, falhando miseravelmente em ambos: a Liga das Nações foi inepta em evitar a 2ª Guerra Mundial e a Alemanha pôde se rearmar e ceifar outros milhões de vidas apenas alguns anos mais tarde.

Uma crítica comum ao Tratado de Versalhes é que ele foi duro demais com a Alemanha, o que fez surgir na sociedade alemã um sentimento nacionalista e revanchista, possibilitando a ascensão do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães e seu líder bigodudo. Essa crítica, nas palavras de Ludwig von Mises, “é totalmente desprovida de fundamento”.

Essa versão da história seria resultado de uma exitosa propaganda alemã. “O problema não foi o tratado ser ruim no que dizia respeito à Alemanha, mas as potências vitoriosas permitirem que a Alemanha descumprisse algumas de suas cláusulas mais importantes.”

O “Corredor polonês”

O tratado obrigava que a Alemanha cedesse parte de seu território à Polônia e à França, o que os nazistas  —  e seus amigos estrangeiros  —  alegavam ser um roubo absurdo. Porém, o que nem os poloneses foram capazes de explicar é como esses territórios que lhes pertenciam haviam sido anexados pelo Império da Prússia, não pelo império alemão. A reconstrução dos fatos é importante para desfazer a propaganda alemã de que se criou um corredor que dividia seu país ao meio.

Na Idade Média, os Cavaleiros Teutônicos conquistaram a região que seria, no futuro, a Prússia Oriental. Porém, não conseguiram conquistar a região que viria a ser a Prússia Ocidental. Portanto, o Sacro Império Romano-Germânico já teve que conviver com um território governado por reis poloneses entre as suas fronteiras. Foi apenas em 1772, durante a primeira partição da Polônia, que a Prússia anexou esse território.

“Essas províncias”, explica Mises, “não pertenciam nem ao Sacro Império, que se desintegrou em 1806, nem à Confederação Alemã, que entre 1815 e 1866 era a organização política da nação alemã. Elas eram como que a ‘propriedade privada’ dos reis da Prússia.” Foi em 1866 que o rei da Prússia decidiu anexar as províncias à Confederação da Alemanha do Norte e, em 1871, ao império Alemão. Os poloneses não concordaram e mandaram seus parlamentares ao Reichstag alemão para resistir a todas as tentativas de germanização em suas próprias terras.

O Tratado de Versalhes apenas devolveu a independência daqueles poloneses, não criou um corredor polonês. Em uma linguagem contemporânea, foi uma “reparação histórica”. Ele desfez as conquistas prussianas — não alemãs.

As reparações econômicas

Por falar em reparação, a principal crítica ao Tratado de Versalhes diz respeito ao pagamento da reconstrução das áreas devastadas na guerra, o que teria condenado a população alemã à miséria e alimentado o seu revanchismo nacionalista.

Vejamos como os pagamentos impactavam a renda do trabalhador alemão.

“É grotescamente equivocado afirmar que esses pagamentos deixaram a Alemanha pobre e condenaram os alemães à fome.” Mises reforça a ideia de que o padrão de vida alemão não sofreria impacto negativo mesmo que pagasse “do próprio bolso e não, como efetivamente fizeram, com dinheiro tomado emprestado no estrangeiro”. Empréstimos, aliás, que não foram honrados. Ou seja, os custos da guerra recaíram na mesma sobre os Aliados.

Os pagamentos das reparações foram interrompidos em 1931 e somaram 10,8 milhões de reichsmarks. A título de comparação, a dívida interna alemã era de 20,5 bilhões. Além disso, os investimentos estrangeiros diretos na Alemanha somaram 5 bilhões durante esse período. Dinheiro não faltava na República de Weimar. “Porém, se os Aliados tivessem insistido no pagamento, teriam prejudicado seriamente o rearmamento alemão.”

Conclusão

As causas que levaram as ideias nazistas ao poder na Alemanha vêm de muito antes do Tratado de Versalhes. Remontam desde ao Pangermanismo do final do século XIX, como bem explica Mises na obra Governo Onipotente. O tratado teve sua parcela de importância na chegada de Hitler ao poder, mas como parte da propaganda  nazista — cujo foco mesmo era a lenda da “facada nas costas”.

A avaliação de que as penas impostas aos alemães eram injustas encontrava eco no estrangeiro. Internamente, os alemães mencionavam o tratado apenas como prova da traição dos judeus, sem a qual a Alemanha teria saído vitoriosa da Grande Guerra. O rancor do povo alemão não é oriundo dos duros artigos do Tratado de Versalhes. O nacionalismo agressivo e militarista alemão foi apenas captado pelo partido nazista, não criado por ele.

Caso os vencedores tivessem aplicado rigorosamente as ideias que nortearam a elaboração do tratado em vez de acreditar na propaganda nazista e reverberar as ideias nacionalistas que eclodiam dentro de suas próprias fronteiras, a Alemanha ficaria impedida de reconstruir sua máquina de guerra. Somente assim as ideias liberais teriam o tempo necessário para crescer e iluminar aquele período obscuro de nossa história.




































PUBLICADAEMhttps://www.institutoliberal.org.br/blog/historia/o-erro-do-tratado-de-versalhes-nao-foi-ser-duro-demais-nao-ser-cumprido/

























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