por Paulo Polzonoff Jr.
As vésperas do Natal foram marcadas por muita reflexão e boas mensagens de amigos, mas também por uma notícia triste, com um quê de revoltante: a morte de uma menina que preferiu tirar a própria vida a ser alvo de uma fofoca. A história piora porque envolve o perfil @choquei, que no Twitter é conhecido por sua intimidade com as lideranças de extrema-esquerda, incluindo de Felipe Neto a Janja, passando por Lula e André Janones.
Sobre os aspectos políticos dessa tragédia, muitos já se manifestaram e tendo a concordar com eles. O governo vai aproveitar o episódio para defender uma regulamentação maior das redes sociais. Aliás, Silvio Almeida, ministro do Oportunismo, já fez isso. E, no país da impunidade, duvido que os fofoqueiros sejam responsabilizados. Afinal, estamos no país onde matar um jornalista rende 12 anos de prisão, enquanto “atentar contra a democracia”, o que quer que isso signifique, rende 17 anos de xilindró.
A respeito da imoralidade desses perfis de fofoca que fazem o trabalho mais sujo de uma guerra cultural extremamente suja, tampouco tenho o que acrescentar. A mim me parece clara e patente a perversidade de uma empreitada que, dizem por aí, rende milhões a serem gastos em tudo o que há de mais fútil e inútil. É algo tão evidentemente diabólico... E se você ainda não percebeu isso, só me cabe lhe dizer: cuidado!
Máquina de moer almas
Resta-me, pois, olhar para aquele que até aqui é o aspecto mais negligenciado da polêmica: a vítima. E neste caso não me refiro apenas à moça de 22 anos cujo nome não convém mencionar. Me refiro a toda uma geração que ainda não entendeu que as redes sociais podem ser divertidas e informativas, mas exigem do usuário certo preparo intelectual, emocional e espiritual. Do contrário, elas se transformam em máquinas de moer gente. De moer almas.
O que incomoda nessa história, para além do ato extremo de se tirar a própria vida, é a trivialidade de tudo. De um lado, o já mencionado perfil de fofocas, com sua ética para lá de discutível. De outro, uma menina de 22 anos. E, no meio disso tudo, o nome de uma celebridade que é uma tragédia em si: o comediante Whindersson Nunes. Resumindo bem resumidamente tudo, a menina foi “acusada” de estar se relacionando com o comediante. Era mentira. O @choquei insistiu. A menina não aguentou a pressão de ser o que não era.
Há no meio desse quiproquó todo uma doença crudelíssima – e sobre esse aspecto não vou falar. Tampouco tenho como objetivo aqui julgar e condenar a menina. Só fico pensando – e este aqui é um espaço de reflexão – na fragilidade espiritual que não é de um indivíduo, e sim de toda uma geração submetida à desesperança própria do niilismo e ao egocentrismo próprio da modernidade. O que podemos fazer para que histórias como essa não se repitam?
Fama e infâmia
E quando falo de a história não se repetir não estou propondo soluções mágicas e inúteis, como a censura às redes sociais ou a extinção e punição dos perfis envolvidos neste caso específico. Até porque a fofoca e a maledicência, dentro ou fora da Internet, sempre existiram e sempre existirão. Não! Estou falando justamente de tornar nossos jovens tão imunes quanto possível a essa maledicência que quase sempre é consequência de um ato voluntário de autoexposição.
A solução me parece tão óbvia quanto impossível – ao menos em larga escala. E tem a ver com a desconstrução da máxima existencialista segundo a qual só existimos na medida em que somos reconhecidos pelos outros. Claro que não! Existimos. Temos valor. Somos dignos. Independentemente do reconhecimento alheio. E se nossos jovens estão sucumbindo à tentação da fama (e por isso se desesperando diante da infâmia) é porque estamos falhando em lhes transmitir essa lição.
Para além do círculo restrito daqueles que amamos e admiramos, de que importam as opiniões que tem a nosso respeito um zé-ruela qualquer que vive de atiçar o que há de pior nas pessoas? Por que alguém haveria de buscar a aprovação ou se desesperar com a desaprovação de covardes que se escondem sob a máscara perversa do anonimato? Nesse caso, o que está em jogo não é o modus operandi do diabo, e sim o quanto nos deixamos influenciar (verbo que não uso aqui à toa) pelos elogios ou críticas dele e de e de seus demônios virtuais.
Paulo Polzonoff Jr., Gazeta do Povo
PUBLICADAEMhttps://rota2014.blogspot.com/2023/12/um-outro-aspecto-do-caso-choquei-o.html
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