O sr. Wyllys está choramingando por coisa pouca. Em matéria de character assassination, ele mal sentiu o gostinho de um veneno que há décadas me é servido em doses oceânicas.
Assustado com o número de mensagens falsas altamente comprometedoras que circulam em seu nome na internet, o deputado Jean Wyllys lançou do alto da sua tribuna na Câmara as perguntas desesperadas: “Será que as pessoas perderam todo o senso? Que é que está acontecendo neste país?”
São
perguntas que faço há pelo menos vinte anos. Mas não foi só nisso que
antecedi o sr. Wyllys. Também foi vinte anos atrás que o meu nome passou
a circular como signatário de mensagens nazistas, terroristas,
racistas, anti-semitas, o diabo. A isso veio acrescentar-se um caudal
inesgotável de lendas urbanas que me apresentavam como espião da CIA ou
do Mossad, como beneficiário de verbas do Partido Republicano, como
agente comunista enrustido, como mentor secreto do Opus Dei e dos skinheads e, last not least, como guru de uma perigosa seita gnóstica.
O sr. Wyllys está choramingando por coisa pouca. Em matéria de character assassination, ele mal sentiu o gostinho de um veneno que há décadas me é servido em doses oceânicas. Mas a nossa diferença não é só quantitativa. No caso dele, a mídia solícita e um punhado de ONGs correram para desmentir as mensagens, passando a reputação do deputado por um lava-rápido do qual saiu brilhando com o fulgor beatífico das vítimas inocentes; ao passo que, quando o atingido era eu, até figuras mais conhecidas como os srs. Leandro Konder, Emir Sader e Mário Augusto Jacobskind, à esquerda, ou os srs. Rodrigo Constantino, Anselmo Heydrich e Janer Cristaldo, à direita, se apressaram em legitimar o acervo lendário anônimo, aprimorando-o e acrescentando-lhe novas invencionices de sua própria criação.
A coisa avolumou-se a tal ponto que ultrapassou toda possibilidade de contestação ou revide. Embora o número de pessoas de nível universitário envolvidas nessa operação subisse a vários milhares, caracterizando um fenômeno sociológico de dimensões alarmantes, o sr. Wyllys achou mais escandaloso e mais significativo o fato de que tratamento similar lhe fosse aplicado homeopaticamente, em dose única e diluição infinitesimal.
O sr. Wyllys está choramingando por coisa pouca. Em matéria de character assassination, ele mal sentiu o gostinho de um veneno que há décadas me é servido em doses oceânicas. Mas a nossa diferença não é só quantitativa. No caso dele, a mídia solícita e um punhado de ONGs correram para desmentir as mensagens, passando a reputação do deputado por um lava-rápido do qual saiu brilhando com o fulgor beatífico das vítimas inocentes; ao passo que, quando o atingido era eu, até figuras mais conhecidas como os srs. Leandro Konder, Emir Sader e Mário Augusto Jacobskind, à esquerda, ou os srs. Rodrigo Constantino, Anselmo Heydrich e Janer Cristaldo, à direita, se apressaram em legitimar o acervo lendário anônimo, aprimorando-o e acrescentando-lhe novas invencionices de sua própria criação.
A coisa avolumou-se a tal ponto que ultrapassou toda possibilidade de contestação ou revide. Embora o número de pessoas de nível universitário envolvidas nessa operação subisse a vários milhares, caracterizando um fenômeno sociológico de dimensões alarmantes, o sr. Wyllys achou mais escandaloso e mais significativo o fato de que tratamento similar lhe fosse aplicado homeopaticamente, em dose única e diluição infinitesimal.
Quando
ele pergunta o que há de errado na mente dos brasileiros, deveria
aferir antes de tudo o seu próprio senso das proporções.
De qualquer modo, as perguntas valem por si.
A
vida na sociedade baseia-se na aceitação geral e costumeira de certos
princípios tácitos, que servem de critério de julgamento nos instantes
de confrontação e dúvida. É o que Antonio Gramsci, dando ao termo uma
conotação peculiar, denominava “senso comum”.
O próprio Gramsci reconhecia que o senso comum predominante nas nações ocidentais refletia, grosso modo, a cosmovisão cristã, mesmo em versão laicizada e amputada de quaisquer referências religiosas.
A
demolição desse senso comum tornou-se desde os anos 60 o objetivo
prioritário do combate cultural revolucionário. Mas nem de longe
imaginem que “combate cultural” significa uma luta de idéias, uma
disputa entre eruditos. Não significa nem mesmo propaganda ou
“doutrinação”.
Às
pessoas que me escrevem queixando-se da “doutrinação esquerdista” que
seus filhos recebem nas escolas, venho há anos tentando explicar que os
bons tempos da doutrinação e da propaganda já acabaram, que há décadas o
sistema educacional ameaça a integridade mental das nossas crianças com
algo de bem mais perverso e temível: um conjunto de técnicas de
manipulação comportamental que permitem moldar ou modificar atitudes e
hábitos diretamente, sem passar pela inculcação de idéias e crenças,
isto é, sem qualquer apelo ao pensamento consciente.
Já falei disso no meu livro de 1996, O Jardim das Aflições, e recentemente a Vide Editorial publicou, a conselho meu, a obra-padrão sobre o assunto: Maquiavel Pedagogo ou O Ministério da Reforma Psicológica, de Pascal Bernardin.
A
doutrinação comunista clássica baseava-se nas artes da dialética, da
retórica e da propaganda, e procurava inculcar na mente do público uma
concepção do mundo, da história e da política, o que não era possível
sem mostrá-la como alternativa a alguma concepção concorrente,
alimentando discussões.
As
novas técnicas não têm nada a ver com retórica e propaganda. Baseiam-se
inteiramente nas chamadas “ciências da gestão”: engenharia social,
marketing, gerenciamento, psicologia comportamental, programação
neurolingüística, Storytelling, Social Learning e Reality Building.
Um
dos efeitos mais diretos da aplicação dessas técnicas em escala de
massas é a disseminação epidêmica de um estado crônico de “dissonância
cognitiva”, um quadro mental descrito pioneiramente por Leon Festinger
em 1957. Dissonância cognitiva é conflito entre as crenças e a conduta.
Dissonâncias cognitivas temporárias são normais e até desejáveis no
desenvolvimento humano. Quando o quadro se torna crônico, rompe-se a
unidade da consciência moral e o indivíduo tem de buscar fora dele
mesmo, na aprovação grupal ou na repetição de slogans
ideológicos, um sucedâneo da integridade perdida. Ao espalhar-se entre a
população, a incapacidade de julgar realisticamente a própria conduta
resulta na queda geral do nível de moralidade, assim como na
disseminação concomitante da criminalidade e das condutas destrutivas,
mas isso, segundo os engenheiros sociais, é um preço módico a pagar pela
dissolução do senso comum e pela implantação dos novos modelos de
conduta desejados.
Antes
de posar de vítima da falta de consciência moral dos outros, o sr.
Wyllys deveria perguntar se o próprio movimento que ele representa não
tem utilizado abundantemente essas técnicas para modificar a conduta de
crianças, adolescentes e adultos.
Publicado no Diário do Comércio.
Publicado no Diário do Comércio.
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