Jornalista Andrade Junior

quinta-feira, 19 de setembro de 2024

A proibição do X no Brasil é uma amostra do que estar por vir

 Fraser Myers, do Spiked Revista Oeste



O gigante X, mídia social de propriedade de Elon Musk, foi oficialmente banido no Brasil. Na noite de 29 de agosto, a plataforma não havia cumprido o prazo estabelecido por um juiz do Supremo Tribunal Federal para bloquear uma grande quantidade de conteúdo e nomear um representante legal local para a empresa. Agora a rede social está fora do ar para seus 22 milhões de usuários brasileiros — cerca de um décimo da população. As elites brasileiras odeiam o X exatamente pelo mesmo motivo das elites do resto do mundo democrático — elas culpam a rede social pela disseminação da chamada desinformação, em especial desde que foi comprada por Musk, tendo suas políticas de moderação de conteúdo afrouxadas. 

Assim como a desinformação foi responsabilizada pelo Brexit no Reino Unido e pela eleição de Donald Trump nos EUA, ela é responsabilizada no Brasil pela eleição em 2018 do agitador de direita Jair Bolsonaro — e, em especial, pela invasão do Congresso Nacional por seus apoiadores em 2023, depois de ele não ter conseguido se reeleger (uma espécie de “tributo” ao 6 de janeiro). Basicamente, as elites acreditam que, ao impulsionarem movimentos populistas, as fake news representam uma ameaça direta à sua dominação. 

As ordens de censura do juiz Alexandre de Moraes, que X e Musk se recusaram a cumprir, deixam isso muito claro. Embora Moraes afirme que está apenas tentando combater a desinformação, o discurso de ódio ou o que ele chama de “milícias digitais” (aqueles usuários que promovem conteúdo que supostamente prejudica a democracia ou o Estado de Direito), suas exigências são claramente políticas. Conforme relatado pelo New York Times, o X foi obrigado a banir mais de 140 contas, entre elas de alguns dos comentaristas de direita mais conhecidos do Brasil, e até mesmo de membros eleitos do Congresso. 

A plataforma se recusou a cumprir essas ordens, alegando que são ilegais e inconstitucionais. 

As tensões entre Moraes e X vieram à tona em abril, quando Musk chamou Moraes de “ditador”. Mas os conflitos já estavam se formando nos bastidores, mesmo antes de Musk assumir o controle da rede, à época chamada Twitter, e rebatizá-la como uma plataforma de “liberdade de expressão”. Como foi revelado pelos “Twitter Files”, entre 2020 e 2022 o departamento jurídico do Twitter resistiu repetidas vezes especificamente a pedidos de remoção de conteúdo e de entrega de dados de usuários anônimos ao Estado, observando que muitos desses pedidos eram “ilegais”, além de “políticos”, ao se voltarem abertamente a apoiadores de Bolsonaro. 

O verdadeiro alvo dos censores do governo não são as grandes empresas de tecnologia. São os usuários das mídias sociais, cidadãos comuns, que as elites querem silenciar e controlar. 

As ações de Moraes contra o X não têm precedentes em um país democrático. Banir ou suspender toda uma plataforma de rede social é algo de modo geral inédito fora de regimes despóticos. 

Aliás, ao bloquear o acesso ao X, o Brasil agora se junta a uma lista ignóbil de nações autoritárias, incluindo China, Irã, Rússia e Coreia do Norte, que tomaram medidas semelhantes. 

Pior ainda, a proibição está longe de ser a única medida que o Brasil tomou contra o X. No dia 17 de agosto, Musk fechou os escritórios brasileiros da plataforma, depois que seus funcionários foram ameaçados de prisão. De fato, uma das principais exigências de Moraes é que o X aponte um novo representante legal que possa se responsabilizar no Brasil por quaisquer violações da lei. Mas, se alguém fosse nomeado, é muito provável que seria preso imediatamente

Igualmente sem precedentes é a decisão do Brasil de cobrar multas de qualquer pessoa no país que tente acessar o X por meio de uma rede virtual privada (VPN) 

Quem for pego tuitando no Brasil por meio de uma VPN pode receber multa diária de R$ 50 mil. Isso deixa claro que o verdadeiro alvo dos censores do governo não são as grandes empresas de tecnologia ou seus proprietários bilionários, como Musk ou Mark Zuckerberg. Não, são os usuários das mídias sociais, cidadãos comuns, que as elites querem silenciar e controlar. 

O banimento do X no Brasil no dia 30 e a prisão, no dia 24 de agosto, de Pavel Durov, fundador do Telegram, na França, sugerem que a guerra global contra a liberdade de expressão on-line se intensificou. Enquanto novas leis, como a Online Safety Act, do Reino Unido, e a Digital Services Act, da União Europeia, ameaçam as empresas de tecnologia com pesadas multas se elas não se curvarem à censura dos governos, a proibição do X no Brasil sugere que podemos começar a ver uma abordagem ainda mais agressiva às plataformas dissidentes nos próximos anos. Enquanto os poderosos continuarem acreditando que a liberdade de expressão representa uma ameaça e existencial ao seu controle, os métodos para restringi-la com certeza vão se tornar mais contundentes e brutais. 

O Brasil é o canário na mina de carvão

Fraser Myers é editor-adjunto da Spiked e apresentador do podcast da Spiked. 




Fraser Myers, do Spiked Revista Oeste

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